sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

OLHA O DEMOTUCANO AI DE NOVO

Apêndice político


Phydia de Athayde


Tanto quanto se expõe aos holofotes, microfones e gravadores, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, repete o termo “Estado de Direito”. Virou um vício de linguagem. Na Quarta-Feira de Cinzas, como a encerrar o Carnaval, Mendes voltou a se exibir. Reuniu a imprensa em Brasília para criticar os sem-terra e ameaçar órgãos e funcionários públicos que mantêm convênios com entidades ligadas aos movimentos. “A sociedade tolerou excessivamente esse tipo de ação. Por razões diversas, talvez certo paternalismo, certa compreensão. Mas isso não é compatível com a Constituição”, afirmou. “Quem repassa recursos a entidades que cometem atos ilícitos também está cometendo ilicitude.”

Toda vez que Mendes abre a boca, surge a dúvida: qual “Estado de Direito” defende o presidente do STF? Uma relação harmoniosa entre os poderes, ponto fundamental para a democracia, reside na compreensão de cada um de seu papel. No mundo inteiro, juízes, principalmente chefes de altas cortes, costumam pronunciar-se nos autos de processos. No Brasil, não. Mendes esmerou um estilo que já vinha se consolidando no Supremo: o de julgamentos midiáticos. Na quarta-feira 25, porém, o ministro foi um pouco além. Instilou o Ministério Público e cidadãos a ingressar com ações judiciais contra os sem-terra. E mais: suas declarações foram dadas no momento em que o governador tucano José Serra, postulante à Presidência da República, enfrentava um conflito com trabalhadores rurais. Mas seria demais ver nas declarações de Mendes pretensões eleitorais. Todos sabemos que o ministro apenas segue firme em sua santa cruzada em defesa do “Estado de Direito”.

O pronunciamento de Mendes ocorre no instante em que os movimentos sem-terra sofrem novos revezes.

Na região do Pontal do Paranapanema, no oeste paulista, entre o domingo e a terça-feira de carnaval, cerca de 2 mil militantes de grupos liderados por José Rainha Júnior, ex-integrante e hoje dissidente do MST, invadiram 21 fazendas. Entre os grupos responsáveis pela ação está o Movimento dos Agricultores Sem Terra (Mast), Brasileiros Unidos pela Terra (Uniterra), Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MTST) e de sindicatos ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT).

O objetivo das invasões, segundo Rainha, era protestar contra o descaso do governo Serra com a reforma agrária no Pontal. Em dois dias, no entanto, os sem-terra recuaram e decidiram desocupar as fazendas invadidas e voltar para os acampamentos na beira das estradas da região. O recuo, declarou Rainha, foi “um gesto de boa vontade e humildade”, para que o diálogo com o governo paulista seja retomado. “Não queremos ser intransigentes e emperrar a conversa.”

Havia uma reunião marcada para a quinta-feira 26 entre Rainha e o secretário de Justiça de São Paulo, Luiz Antônio Marrey. O secretário desmarcou e ainda não decidiu se vai recebê-los. “Tínhamos uma reunião marcada e eles agiram de má-fé, fazendo as invasões na véspera. Agora fica difícil”, disse Marrey.

Os ânimos arrefeceram na região, mas o Pontal do Paranapanema permanece sendo um enorme problema, pois a origem dos conflitos está no fato de a região ser pródiga em terras devolutas, ou seja, terras públicas geralmente alvo de grilagem. Parênteses: Mendes nunca manifestou preocupação com a bagunça nos registros de propriedades rurais, que permite todo tipo de fraude.

Rainha rebateu as declarações de Mendes: “Estamos lutando pela dignidade humana e o ministro não pode nos dar tratamento diferenciado ao que deu, por exemplo, a Daniel Dantas. Não se pode deixar a lei sempre a favor dos ricos e condenar os pobres por se valerem de lutas”.

A situação é mais grave em Pernambuco, onde no sábado 21 quatro seguranças foram mortos por integrantes do MST, que alegam ter agido em legítima defesa. O confronto aconteceu em São Joaquim do Monte, no Agreste pernambucano, na fazenda Consulta, ocupada desde 2000.

“Os pistoleiros entraram armados no acampamento Consulta e passaram a agredir um trabalhador, até levá-lo ao chão. Um deles chegou a sacar uma arma para atirar, e nesse momento os acampados reagiram”, divulgou em nota o MST.

As vítimas são João Arnaldo da Silva, José Wedson da Silva, Rafael Erasmo da Silva e Wagner Luiz da Silva. O sem-terra ferido é Romero Severino da Silva. Ele é procurado pela polícia e está foragido. Aluciano Ferreira dos Santos, um dos líderes da invasão, e Paulo Alves Cursino, que tem 62 anos, foram presos. Com eles, não foram encontradas armas.

Cerca de 80 famílias permanecem na fazenda vizinha, Jabuticaba, também ocupada. Segundo o MST, correm risco de sofrer represálias por parte de outros pistoleiros da região. O movimento pede a defesa da vida das famílias acampadas e a desapropriação das duas fazendas por serem improdutivas e não cumprirem sua função social.

“Nenhum movimento tem o direito de matar pessoas. Quem cometeu o crime tem de responder por ele”, declarou o governador pernambucano, Eduardo Campos (PSB), após dizer que não criminaliza o MST. Ele buscou relativizar e defender que o comportamento do poder público é igualitário. “O governo não tolera violência nem de um lado, da parte de fazendeiros sobre os trabalhadores, nem do outro.”

O movimento não abre mão de sua estratégia de invadir terras. “Ocupações são importantes ferramentas na luta pela terra, por isso o MST sempre as utilizou para lutar pela reforma agrária. Desse modo, o MST continuará realizando ocupações de terra, independentemente de calendários”, reafirma na nota à imprensa.


No Rio Grande do Sul, o governo Yeda Crusius e o Ministério Público Estadual cumprem uma agenda que arrancaria elogios de Mendes. Em meados de fevereiro, o governo estadual ordenou o fechamento de sete escolas itinerantes do MST que tinham convênio com o governo. A medida foi tomada por determinação do Ministério Público Estadual.

O projeto de educação começou em novembro de 1996 para atender o alto número de filhos de colonos acampados no estado. As unidades de ensino funcionam ao ar livre, em galpões ou em estruturas de lona e eram mantidas por repasses mensais de 15 mil reais da Secretaria de Ensino ao Instituto Preservar, que mantinha treze professores e dez cozinheiras. Desde novembro do ano passado, o repasse de recursos do governo estadual foi suspenso.

O MST considera a medida autoritária e persecutória, pois a decisão não ouviu os pais dos alunos para rebater as acusações feitas pela Procuradoria.

A secretaria informou não haver irregularidade na operação das escolas. Mas isso não convenceu o procurador Gilberto Thums. Ele argumenta que as escolas passam conteúdo inadequado. “Fazem lavagem cerebral para passar teorias marxistas. É uma maldade”, acredita(CartaCapital).

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