Cautelosamente, os jornais brasileiros começam a interpretar o quadro mais amplo das pesquisas de intenção de voto, colocando em perspectiva alguns fatos que foram vinculados recentemente às escolhas do eleitorado.
Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa
Manifesta-se na imprensa uma necessidade de entender por que razão a vantagem da presidente Dilma Rousseff sobre seus principais adversários se mantém praticamente incólume, contrariando as expectativas criadas pela maioria dos analistas a cada rodada de consultas.
A pergunta por trás desse esforço é a seguinte: como é que ela continua na liderança, com grande potencial para vencer no primeiro turno, se quase tudo que se noticiou ao longo dos últimos meses deveria ter induzido a uma queda na sua aprovação?
Uma das respostas vem junto com a própria pergunta: quanto mais se fala de um candidato, mais conhecido ele se torna. Se o cidadão não enxergar uma grande diferença entre eles, e se a situação geral não produz um desejo massivo e radical de mudanças, a tendência é que o nome mais conhecido acabe se consolidando na mente dos eleitores.
Ainda que predomine nos principais jornais do país um viés negativo na abordagem dos assuntos mais relevantes sempre que se referem ao governo de Dilma Rousseff, é preciso considerar, ao mesmo tempo, que os tradicionais mediadores da comunicação social se tornam menos influentes quanto mais cresce o uso das mídias digitais. É legítimo considerar, portanto, que a mensagem centralizada das mídias tradicionais tem se tornado marginal no amplo sistema de informações da sociedade hipermediada.
Uma análise interessante sobre o assunto foi produzida pelo colunista José Roberto de Toledo, publicada na edição de segunda-feira (28/7) do Estado de S.Paulo. Ele observa que um terço dos eleitores vivem em domicílios beneficiados por algum programa social do governo federal, mas a escolha da presidente pelas famílias que não recebem nenhuma bolsa ou auxílio é quase igual, em termos proporcionais, o que o faz concluir que o apoio a Dilma Rousseff vem de uma aprovação geral à política social por parte da população como um todo.
Jornalismo e bobagens
Por outro lado, pode-se acrescentar à análise do colunista outras visões sobre o noticiário e seu esperado efeito nas escolhas dos eleitores. Por exemplo, se formos considerar a versão pessimista que a imprensa vem apresentando sobre a situação econômica do país, teremos que confrontar esse viés com a percepção da sociedade sobre sua própria circunstância e relativizar a influência da imprensa.
Os indicadores de confiança e otimismo mostrados pelas pesquisas não confirmam a expectativa criada pelos jornais – o que indica, claramente, que a maioria da população discorda da visão homogênea da imprensa. Não é difícil constatar que esse viés do jornalismo brasileiro não se constrói com um olhar amplo sobre a economia como um todo: o noticiário econômico da imprensa nacional se faz com a perspectiva de uma minoria, exatamente o mesmo público visado pelo desastrado comentário divulgado recentemente por analistas do banco Santander.
O comunicado oficial do banco espanhol, condicionando lucros futuros de investidores a uma eventual queda das intenções de voto na presidente Dilma Rousseff, representa um microcosmo do ideário que predomina na imprensa.
Os jornais genéricos não escrevem para a sociedade, mas para um pequeno conjunto de investidores, de renda mais alta mas não necessariamente vinculados a atividades produtivas. As editorias de economia e negócios do Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo e o Globo destoam, escancaradamente, daquilo que apresentam os diários especializados, como o Valor Econômico e o DCI, que costumam abordar as questões econômicas de maneira mais ampla e equilibrada.
Observe-se, por exemplo, a reportagem publicada no sábado (26) pelo Estado, com título destacado ao lado da manchete: “Petrobras amplia gastos em publicidade em meio a crise”. A reportagem não resiste a um questionamento básico: praticamente todas as grandes empresas concentraram os investimentos publicitários no primeiro semestre, por causa da Copa do Mundo. A Petrobras tem mais razões para isso, porque sua publicidade fica limitada durante o período eleitoral.
Bobagens como essa explicam, em parte, por que o noticiário negativo não afeta a grande massa de eleitores.
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