domingo, 4 de novembro de 2012

As teorias-avós da política

 

Os “especialistas” em política que vicejam pela mídia tradicional, os mesmos que andaram errando redondamente em suas previsões relativas às últimas eleições, querem agora ditar suas “verdades” na análise dos resultados do pleito. É risível perceber as contradições desses exames, os malabarísticos esforços que fazem para levar os incautos receptores às conclusões que lhes interessam, fieis aos “princípios” daqueles para os quais trabalham.


Se você se dedicar com atenção à leitura dos “grandes jornais” (jornais grandes) do país, perceberá claramente esse malabarismo. Para ficar em apenas um exemplo, a eleição de Fernando Haddad para a prefeitura paulista tornou-se um campo fértil para tendenciosas elucubrações. Justifica-se o resultado a partir da rejeição do prefeito Kassab, do temor de futura renúncia do candidato Serra, da falta de opções para o eleitor paulistano, da busca do novo, até do tempo chuvoso, e rejeita-se o peso da influência de Lula no processo, argumentando que, em outras cidades, o ex-presidente não conseguiu emplacar o seu candidato. Há aí, toda uma falácia nos argumentos porque, ao analisar os resultados dessas outras praças, os mesmos “especialistas” falam em derrotas de Lula... Então, a conclusão a que nos querem levar é a seguinte: onde os candidatos de Lula venceram foram a frustração política ou os ventos da renovação os responsáveis pelos resultados, mas onde eles perderam foi uma significativa derrota do Partido dos Trabalhadores...


Para encobrir a estrondosa derrota de seu candidato na capital de São Paulo, que tem o maior colégio eleitoral do país e o terceiro orçamento nacional , os órgãos midiáticos hegemônicos enaltecem outras eleições municipais , pinçadas a dedo. E, nitidamente, tentam alavancar o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, guindando-o à condição de grande nome político emergente, como se ele já não estivesse no cenário político nacional nos últimos anos, sempre de braços dados com o Lula e a Dilma, participando o seu partido (PSB) como um dos mais constantes e efetivos componentes da chamada “base do Governo”. A partir do crescimento do PSB, em termos quantitativos, nas últimas eleições, a mídia conservadora já começa a cortejar o governador, repercutindo de forma enfática sua aproximação com Aécio Neves, a atual cereja do bolo tucano.

   

Uma das teses levantadas nessa análise refere-se à renovação. O país estaria renovando seus quadros políticos, oxigenando a política com novos nomes, em repúdio ao panorama tradicional. Aqui, é preciso cuidado para tratar com o termo “renovação”. Caso se esteja falando de pessoas, ela existe e é natural que exista, na política como em todos os setores. O inexorável passar do tempo responde por ela. Mas importante mesmo seria se essa renovação estivesse se dando no plano das ideias. Será que está?

 

Significativamente, há uma inflação de “netos” na política brasileira, que responde a essa questão. Estão aí Aécio, o próprio Eduardo Campos, ACM Neto, Brizola Neto, Rui Palmeira, para mencionar apenas alguns participantes do último pleito. São nomes novos, inegavelmente. Mas e suas ideias?

 

Aécio Neves é um político tão em cima do muro quanto esteve seu avô. É claro que Tancredo Neves teve um papel importante na redemocratização do país, o que lhe garante lugar cativo no painel de nossa política. Nem por isso, no entanto, podemos esquecer que o que caracterizava as ações de Tancredo era a sua “mineirice”, que lhe permitia trafegar em muitos segmentos políticos do país, às vezes de formulações opostas. Aécio vai pelo mesmo caminho.

 

Eduardo Campos é neto de Miguel Arraes, e dele sucessor na política pernambucana. Como presidente do PSB, partido de esquerda, e tendo DNA de um histórico combatente pelo povo, não parece que vá alinhar-se, como espera a direita, a um projeto direitista. De qualquer forma, se o fizesse, nada traria de novo para a política nacional, repleta de adesistas e vira-casacas...

 

ACM Neto é um jovem velho, pelas ideias do avô que cultiva e repete. Representa, como aquele, uma dinastia de políticos baianos que durante anos fizeram da terra de Castro Alves um feudo político familiar, inclusive com o apoio à e da ditadura. E sempre à direita, ideologicamente. A missão de ACM Neto é não deixar essa direita (DEM) morrer. As famílias nordestinas políticas, que vão passando o poder de pai para filho – ainda que com interrupções ocasionais - são, aliás, uma constância, em um modelo do tipo coronelista . O tucano Rui Palmeira é outro neto, nas Alagoas. Seu avô, de mesmo nome, e seu pai Guilherme, são agora seguidos por ele, em um filme que já vimos em muitos rincões nacionais.

 

Leonel Brizola Neto defende, em outro canto desse ringue político, as ideias do avô, principalmente no campo da educação, apologista que é da criação e disseminação de CIEPs pelo país. São ideias meritórias, mas não se pode dizer propriamente que estejam cercadas de novidade.

Sem preocupações nem funções de analista político, mas vendo a coisa do ponto de vista de um cidadão comum, não percebo a tal renovação tão propalada. Nem sei o que seria, no momento, “renovar”... Afinal, a luta continua, o velho na política continua sendo o pensamento retrógrado e conservador das elites, e o novo é que tenta incorporar novos atores – as massas populares – ao cenário político. Porque, como já disse Mario de Andrade, “ninguém pode se libertar duma só vez das teorias-avós que bebeu”...

 

Ah! Ia esquecendo que a neta de Salvador Allende foi eleita no cargo de prefeito de uma província do Chile, provavelmente iniciando uma carreira política. É o rejuvenescimento de velhas teorias.

 

Rodolpho Motta LimaAdvogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.Direto da Redação

 
 
 

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