segunda-feira, 18 de julho de 2011

Olívio Dutra: “A importância do PT está em não se acomodar”



Bigode, a marca registrada do ex-governador gaúcho l Foto: Ramiro Furquim/Sul21
Nubia Silveira
A fala mansa, o bigode farto, o vocabulário marcado por termos típicos do gaúcho do interior, a serenidade ao expor os pontos de vista fazem de Olívio Dutra o tipo inesquecível de qualquer um que já tenha convivido com ele, nem que seja por apenas alguns instantes. Líder estudantil, sindical e político, o ex-governador gaúcho (1º de janeiro de 1999 a 31 de dezembro de 2002) se diz, antes de tudo, um bancário. Fez concurso para contínuo e depois para escriturário no Banco do Estado do Rio Grande do Sul – Banrisul, onde trabalhou até se aposentar. Há 41 anos trocou a cidade de São Luiz Gonzaga, onde estudou e começou a trabalhar, e o distrito de Bossoroca, onde nasceu, por Porto Alegre. Uma troca forçada pelas autoridades, depois de um desentendimento com o prefeito. Desde aquela época vive no mesmo apartamento de dois quartos, na Zona Norte de Porto Alegre, que comprou de um colega bancário.
Olívio presidiu a União São Luizense de Estudentes e o Sindicato de Bancários de Porto Alegre. Foi prefeito da capital gaúcha, governador de Estado, deputado constituinte e ministro do governo Lula. Nenhum cargo conseguiu mudar seus hábitos. Anda de ônibus pela cidade, atende o celular, sempre bem-disposto, e, aos domingos, quando não chove e está em Porto Alegre, pedala por mais de duas horas, no percurso Zona Norte-Centro-Bom Fim- Zona Norte. Apesar dos boatos, diz que não vai se candidatar ao Senado. Está comprometido com os movimentos sociais. Viaja pelo interior do Estado, segundo ele, não para fazer campanha, mas para falar sobre “a construção partidária”.

Nunca participou de qualquer partido político, antes de ajudar a fundar o PT. Mas, reconhece que tinha simpatias pelo Partidão, ao qual pertencia um tio, irmão de sua mãe. Para Olívio, a importância do PT está em “não se acomodar, não passar de um partido de transformação a um partido da acomodação”. É pelo que ele vem lutando há 30 anos.
Com seu jeito simples e gestos que fortalecem as falas, não se nega a fazer críticas. Elogia os governos do petista e amigo Luiz Inácio Lula da Silva, com quem dividiu o apartamento no tempo da Constituinte, mas reconhece: “a estrutura fundamental do Estado brasileiro não foi mexida”. Outro ponto em que, afirma, o país pouco evoluiu foi na questão da reforma agrária. “Nós, na Constituinte, não conseguimos retirar do texto da Constituição uma espécie de aura sagrada da propriedade”, lembra.
Antes de comemorar os 70 anos, com uma grande festa, realizada no dia 11 de junho, ele deu uma longa entrevista (duas horas e meia de conversa) ao Sul21, da qual participaram os repórteres da casa – Milton Ribeiro, Rachel Duarte e Igor Natusch – e os convidados Antônio Oliveira e Poti Silveira Campos.
Milton — O senhor se formou em Letras. Por quê? Depois, virou bancário. Vamos começar com as Letras.

Olívio Dutra –
Não, eu fui bancário antes de qualquer coisa.

Milton — Antes?

 

Olívio —
Claro. Fui bancário por 35 anos, funcionário concursado do Banco do Estado do Rio Grande. E, aliás, entrei por concurso na função de contínuo do Banco, lá em São Luiz Gonzaga. Só depois de três anos, com concurso interno, feito em Santa Maria, junto com outros, passei a ser escriturário. Então, vim me formar em Letras — licenciatura de Língua Portuguesa e Inglesa, Língua e Literatura — aqui na UFRGS, em 1975. Então, fui mais um trabalhador que estudava do que um estudante que trabalhava. A prioridade era o meu trabalho, o meu emprego, né. Porque cheguei aqui com a Judite grávida da Laura e nós tínhamos o Espártaco com um ano de idade.
Milton — Espártaco.


Olívio –

É. O Espártaco, meu filho, com um ano de idade. E a Judite grávida da Laura. Eu (era) bancário, com nove anos já de profissão bancária, funcionário do Banco, quando cheguei aqui, em 1970, em Porto Alegre. Então…
Milton — Então o senhor…


Olívio –

Mas deixa eu ver como é que eu respondo, como é a questão, porque eu sou formado em ciências ocultas e letras apagadas…
(risos)

Olívio —
Tem um pouquinho de história mais antiga: o meu pai era um carpinteiro lá em São Luiz Gonzaga quando eu nasci. Nasci em Bossoroca, em 1941. Naquela época, Bossoroca era terceiro distrito de São Luiz Gonzaga. E eu não nasci na vila da Bossoroca, eu nasci no fundão da Bossoroca, onde meus familiares eram agregados no fundo dos campos dos fazendeiros lá no rincão chamado Rincão Feio. Nesse local é que eu nasci, já o segundo filho de uma família de sem terras agregados no fundo de campo. Minha mãe na lida de casa. Nunca foi trabalhar na fazenda. Agora, os irmãos da minha mãe eram peões de fazenda. O meu pai era aramador, ou alambrador, como queira. Para nós, era aramador. Era aquele trabalhador que fazia as cercas, estendia os arames, fazia todas aquelas amarrações. Claro, é no mato. Também ajudava a escolher as árvores, fazia o corte adequado, conhecia madeira e árvores como a unha.


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