No carnaval, o folião pode sair às ruas fantasiado do que lhe der na telha.
No carnaval, tudo parece ser permitido, tolerado.
Nem tudo.
É comum fantasiar-se de herói. Algumas criaturas saem às ruas fantasiadas de Batman, outras de “menino prodígio”, Homem-Aranha, Mulher-Maravilha, Capitão América etc. Travestir-se de herói parece ser a fantasia preferida por muitos. Mas outros se fantasiam de... Irmãos Metralha! É também muito comum os homens se fantasiarem de mulher.
Tem fantasia para todos os gostos.
No carnaval, repito, tá tudo liberado – ou quase tudo.
No carnaval, muitos se revelam. Como se diz, no popular, “soltam a franga” ou “saem do armário”.
Mas isso, dito assim dessa maneira, “soltam a franga”, “saem do armário”, é coisa menor, rasteira, grosseira: manifestação de puro preconceito dos enrustidos e falso-moralistas de plantão.
Mas... Já é carnaval, cidade! Acorda pra ver!
Felicidade! Folia! Éter! Transformismo! Transformação!
No carnaval, mocinho vira bandido; bandido, mocinho; virtuoso, pecador; pudica, despudorada; democrata, golpista; petista, “petralha”; tucano, “tucanalha”. Ouve-se ao fundo a “Marchinha do Impeachment” – Azevedo, “o batuta”, com a baqueta de maestro ou a varinha de condão em punho, à frente. Quem seguirá esse cordão de sujos?
Mas a fantasia de Reinaldo Azevedo é outra, que (re)conhecemos de outros carnavais. Já até anda um tanto fora de tom, gasta, desbotada, puída. Mas dizem ser “a última moda”: mistificação e malhação do PT e dos petistas.
Exagerado, como um Clóvis Bornay redivivo, Azevedo desfila, com trejeitos e espalhafato mais próprios de um porta-estandarte, por força de hábito e do ofício, seu antipetismo em plena sexta-feira de carnaval.
Em seu último artigo publicado na “Folha” – poderia ser na “Veja” ou no “Estadão” ou mesmo em “O Globo” –, “Tio Rei”, como lhe chamam os súditos que comungam da mesma “fé” e frequentam a “igrejinha” onde faz, diariamente, sua “pregação” plena em preconceitos, “verdades”, vilanias e moralismos, ou simplesmente “Rei”, solta frangas, cobras e lagartos, por assim dizer, e rasga, novamente, mais uma vez, de novo, a sua fantasia antipetista em pleno carnaval – como se fora, não se sabe ao certo o personagem, um crente ensandecido ou um carnavalesco “montado” para desfilar e “arrasar” na folia .
Ex-petista, trata-se de um “convertido”. E “convertidos”, como se sabe, são “chatos”, quase “antipáticos”, tendem ao paroxismo, ao exagero, na busca da redenção. Tal e qual ex-fumante, ex-garota de programa, ex-alcoólatra etc. Como o deputado Pastor Sargento Isidório, meu conterrâneo, que se diz “ex-homossexual”; “ex-criminoso”; “ex-traficante”; ex-“tudo de ruim”(na visão preconceituosa dele, claro). Hoje, tudo de bom!
Reinaldo, arrastando os frangalhos da sua fantasia, carrega e desfralda sua “bandeira” nesse seu último artigo. Observe os termos e expressões empregados: “maçã na boca”, “rodeada de cerejas” (notou a “encarnação pecaminosa”?), “trocas indecorosas”, “gozando”, “encantamento”... Notou agora a “encarnação pecaminosa”? Não notou certa erotização tresloucada, fora de lugar? Vai mais além: “estimular, excitar, que se sente instigado”. Como se nota, deixou de fato o tédio de lado e caiu na folia da carne. Para um conservador... Meia palavra basta. Meia palavra, bosta.
Basta! Bosta!
No “carnaval” dos dias e nos dias de carnaval, tudo é permitido. Mas...
O artigo é mero, para variar, pretexto para descer a lenha no PT e em alguns membros do partido.
Azevedo foi meu vizinho em Higienópolis. Encontrei-me com ele, por algumas vezes, na modorra dos dias, em meio ao nosso ordinário cotidiano de homens comuns: no supermercado, na farmácia, na loja de vinhos etc. Sempre na companhia de sua esposa e suas duas filhas. Nunca fomos apresentados, mas, educados que somos, nos tratamos sempre com respeito, cordialidade e protocolares cumprimentos e saudações: “bom dia!”, “boa tarde!”, “boa noite!”.
Pareceu-me, portanto, um homem comum – nem mocinho nem bandido. Desses que, para além das aparências, da boa ou má fama, das maquiagens midiáticas e fantasias, levam uma vida ordinária, sem nada de extraordinário. Como todos nós, aliás. Para além das máscaras, caricaturas e folias de carnaval. Para além do baile de máscaras de todos os dias, das “fofocas” da política, da “espetacularização” e hipocrisia do debate.
Azevedo, quem diria, para além da fama de um suposto “Macunaíma de Higienópolis”, de “vilão” de direita, de “coxinha” sem nenhum caráter ou escrúpulo, de “rola-bosta” é apenas um pequeno-burguês em sua vida ordinária. Para além da fama de mau-caráter, de ser o antagonista que desrespeita e destrata seus contendores, ali, no mundo real, “de verdade”, despido de suas armas e fantasias, pareceu-me, sobretudo, um bom pai de família, temente a Deus – e a certos homens, por suposto. Homens a quem deve respeito, admiração, mesuras e, provavelmente, subserviência.
Não me parece que Reinaldo Azevedo leve mesmo assim tão a sério essa sua fantasia – deste e de outros carnavais.
O personagem parece, em verdade, se, para variar, não me engano, não propriamente um Clóvis Bornay, com todo seu brilho de purpurinas e exagero, mas, talvez, um Pedro de Lara. Uma espécie de animador de auditório. Parece, bom aluno que foi, ter prestado especial atenção naquela aula magna do velho guerreiro na qual dizia: “Quem não se comunica, se trumbica”. Para muito além das concordâncias, próclises, ênclises e mesóclises – ressalte-se.
É, reconheçamos, nos dias de indigência moral e intelectual que vivemos, um dos destacados esgrimistas da palavra, e das ideias (conservadoras), no debate político. Decerto que os canalhas que dominam a política hoje constrangem e envergonham, sobremaneira, analistas políticos, a torto e a direito; quero dizer, à esquerda e à direita. Porém, por vezes, também ele, tropeça e se debate em seus próprios vícios, recalques e arrogância; em sua própria vaidade.
Demonstra – e, cabotino, quase sempre se gaba dos próprios méritos – ter sido, no colégio, um aluno nota 10 (dez!) em Português, fera em gramática – dizem, só tirava entre nove e dez, em provas de análise sintática, ortografia, pontuação, concordância nominal e verbal etc. Ou seja: era um bom menino e um bom aluno, o chamado “CDF”. Já adulto, deve ter cabulado as aulas de Linguística.
Provavelmente, em decorrência dessa falta, quase sempre, apesar de se confessar um bom cristão, se apraz em utilizar-se do conhecimento e do domínio da norma culta para ridicularizar e humilhar as pessoas. Distante dos umbrais das igrejas, Azevedo parece não ter compaixão.
Enquanto louva e exagera suas qualidades e méritos próprios, desanca, desqualifica, ofende aquele que pensa diferente ou, simplesmente, que vê o mundo com outras lentes – como se sabe, há muita miopia, astigmatismo ou “vista cansada” nos olhos que se voltam para a paisagem que nos circunda.
Como diria um companheiro de poesia da década de 1970: “Se o mundo não vai bem aos seus olhos/ transforme o mundo/ ou use lentes/Óticas Olho-vivo agradecem a preferência”. Cito de memória.
Viva o carnaval!
Viva a embriaguez dos sentidos!
Viva a folia!
Lula Miranda
Poeta, cronista e economista. Publica artigos em veículos da chamada imprensa alternativa, tais como Carta Maior, Caros Amigos, Observatório da Imprensa e Fazendo Média
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