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Introdutor de um estilo novo de entrevista coletiva - nas quais não costuma anunciar quase nunca nenhuma medida, nenhuma política, nenhuma ação de governo - ontem o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo concedeu uma de suas entrevistas-padrão, após a inauguração solene de uma Delegacia Especial da Polícia Federal no Aeroporto Internacional de São Paulo.
Depois do evento, com a entonação grave dos grandes tribunos, o olhar aguçado de quem enxerga na frente, despejou sua frase predileta: “A PF é republicana”. A outra frase predileta é: “as leis foram feitas para serem cumpridas”.
Na hora, ninguém cuidou de perguntar ao Ministro a troco de quê as declarações, algum fato novo?
Soube-se do fato novo em seguida: naquele momento, sem mandato judicial, sem se identificar, policiais da PF invadiram o avião de campanha de um candidato a governador do Maranhão pelo PMDB.
Os jornais online noticiaram simultaneamente a operação e as declarações cívicas de Cardozo:
“Pouco importa se as pessoas que cometem ilícitos são amigos ou inimigos dos que governam. Pouco importa se aquela pessoa que descumpre a lei tem um poder econômico ou tem poder político, ou se é um simples operário. A polícia republicana tem essa dimensão. É um órgão de Estado. Um governo que respeita uma polícia de Estado se limita a estabelecer diretrizes e não interfere no seu cotidiano.”
Pouco depois o vice-presidente da República Michel Temer, prócer do PMDB – e jurista – denunciou o que considerou uma arbitrariedade e Cardozo foi obrigado a sair das obviedades solenes para os fatos concretos.
Convoca-se então uma reunião de emergência no Palácio do Planalto e todos saem correndo atrás do prejuízo. Provavelmente a Presidente só foi informada da operação após o grito de Temer.
Após a reunião, o Ministro-Chefe da Casa Civil Aloizio Mercadante foi acionado para acalmar Temer, não o Ministro da Justiça. A missão de Cardozo foi levantar o abuso junto à PF republicana. Finalmente, Dilma exigiu uma atitude de Cardozo.
Um Ministro da Justiça com senioridade imediatamente convocaria o delegado-geral da PF para, pessoalmente, fazer-lhe um relato do ocorrido e das medidas a serem tomadas. Limitou-se a enviar um ofício solicitando “investigação rigorosa”.
Como esse ofício será tratado? Com absoluto desdém, como qualquer requisição de Cardozo à PF. Repito, com conhecimento de causa: com absoluto desdém.
Haverá alguma apuração apenas se a própria Dilma entrar na história.
Segundo a cobertura do evento de inauguração, “Cardozo dedicou quase todo o tempo a enaltecer a atuação da PF”. Essa apologia à PF não tem reciprocidade. A PF, da cúpula à base, trata Cardozo com absoluto desprezo.
O “republicanismo” de Cardozo não se funda em convicções jurídicas apenas, mas em precaução. Elogios são a maneira que encontrou para um pacto de não-agressão com a PF que lhe permita exercitar sua atividade predileta: a inércia. Tipo “eu não incomodo vocês em nada, elogiarei sempre que possível; em troca não me venham cobrar nada, especialmente trabalho”.
Depois do período áureo da PF, sob a orientação de Ministros como Márcio Thomaz Bastos e Tarso Genro, a força foi completamente abandonada na gestão Cardozo. Esfacelou-se em disputas internas, não arbitradas pelo Ministro, na falta de recursos, na ausência de qualquer política balizadora.
Não é a única falha do Ministro. Cardozo abandonou completamente a questão indígena, em uma falta de ação irresponsável junto a áreas conflagradas; nada se sabe da Política Nacional de Segurança Pública. Houve algum avanço na Copa do Mundo, de integração com as polícias estaduais, porque o modelo de trabalho aplicado exigiu o envolvimento de todos e fugiu da sua liderança.
Sua rotina diária consiste em chegar no Ministério às 11 horas, sair para almoço às 12:30, voltar perto das 16:00 e, em geral, se retirar antes das 18 horas. No Ministério, são comuns processos parados por falta de assinatura, políticas paralisadas, quando batem na sua mesa, reuniões desmarcadas, sempre que tratam de temas sensíveis, nomeacoey adiadas, porque ele se esqueceu de algum detalhe.
Não se sabe o que leva Dilma a mantê-lo no cargo; ou o que o leva a não sair. Seus quatro anos no Ministério são uma demonstração da falta de sensibilidade do governo para questões de Estado e desprezo pelos temas relevantes da alçada da Justiça, mas que aparentemente não sensibilizam a presidente.
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