Demóstenes Torrres é um exemplo concreto da degradação política que se abate sobre o Brasil. De ex-arauto da moralidade, o senador goiano está envolvido até a raiz dos cabelos com Carlos Cachoeira de Lama, um meliante que age nos bastidores do poder.
Cara de pau, como as pessoas de sua espécie, Torres aparece no Senado como se nada tivesse acontecido. Provavelmente espera contar com a solidariedade de setores parlamentares que temem o "eu sou você amanhã".
O que está acontecendo agora remete ao campo das discussões sobre o tipo de política que ainda se faz no Brasil com a prevalência do fisiologismo deslavado. Os financiadores de campanhas milionárias não pregam prego sem estopa e cobram os gastos.
Já foi sugerido aos parlamentares repetir o esquema das camisas dos clubes de futebol. Usariam nos seus ternos os logotipos das empresas que bancaram suas campanhas.
Para evitar poluição visual, até porque há políticos contemplados por inúmeras empresas, os logotipos se limitariam a três e seriam escolhidos os principais doadores. Já imaginaram o Governador Sergio Cabral e o Prefeito Eduardo Paes? O primeiro teria na lapela o logo da Delta e de alguma empresa do amigo Eike Batista e assim sucessivamente.
Vem aí mais uma campanha eleitoral, desta feita municipal. É preciso estar atento para a movimentação relacionada com as doações de campanha. Ou será que alguém imagina serem as empresas altruistas ao fazerem as doações com o objetivo de aprimorar o processo democrático?
"Diga-me quem te banca que direi qual é a tua". Este seria um slogan interessante e ajudaria o eleitor a escolher melhor os parlamentares que terão mandato de quatro anos.
Se os formadores de opinião se detivessem a analisar com mais rigor tais questões, o poder dos cachoeiras de lama automaticamente se reduziriam. De nada adianta o cidadão contribuinte apenas se indignar com os aprontos dos políticos se não se aprofunda o tema e se vá até as últimas consequências no desvendamento das mutretas.
Se não se fizer isso, o país continuará sai ano entra ano a assistir "espetáculos" como os atuais e anteriores. Combater a corrupção ao velho estilo moralista da famigerada UDN não leva a nada. Ajuda até encobrir o principal.
Quando houve o golpe de 1 de abril de 1964 falava-se em mar de lama que seria combatido. As coisas até pioraram no tempo da ditadura, mas os brasileiros não eram informados a respeito porque os próprios golpistas censuravam.
Com o passar do tempo os digitos da corrupção foram se ampliando, mas não se combateu a histórica corrupção do capital financeiro, das empreiteiras etc. E se nada for feito nesse campo tudo continuará como antes.
Resta saber se a mais recente CPI mista sobre o tal Cachoeira vai mesmo ao âmago da questão ou ficará restrita aos refletores e câmaras de televisão.
Em matéria de desespero, a mídia de mercado segue batendo recordes. Desta feita, o noticiário sobre o ato soberano da Presidenta Cristina Kirchner nacionalizando as ações da Repsol se superou.
E vale destacar que ao falar aos argentinos Cristina Kirchner fez questão de deixar claro que apresentou o projeto visando a recuperação da soberania. Ela acrescentou que o modelo escolhido para o futuro da YPF “não é o da estatização”, mas sim “o da recuperação da soberania e do controle dos hidrocarbonetos”.
Os jornalôes e telejornalões unanimimente condenam Kirchner, mas de um modo geral omitiram as alegações apresentadas pelo governo argentino para tomar a decisão que tomou.
Além de não cumprir o que estava estabelecido em contrato em termos de investimentos, a Repsol provocou danos ao meio ambiente na região de Mendoza e Patagônia, conforme denunciam o governo argentino e os ecologistas .
Apesar disso, a Repsol ainda quer o pagamento de 10 bilhões de dólares em indenização. O governo espanhol de Mariano Rajoy faz ameaças ao estilo do periodo colonial de mais de 200 anos atrás. Só falta agora Rajoy enviar as canhoneiras.
Aceitar passivamente as ameaças ao estilo colonial é também uma forma de fazer vista grossa à corrupção. Ou será que quando uma empresa não cumpre contrato firmado com o Estado e nada é feito em resposta, não é também uma forma de corrupção?
Em suma: o que teria acontecido em 1994 quando o então Presidente Carlos Menem privatizou a Yacimientos Petroliferos Fuiscales (YPF)? Alegavam os privatistas que o setor entraria na modernidade. Dezoito anos depois, Cristina Kirchner, que então como parlamentar caiu no conto votando a favor da privatização, está comprovando que a medida não trouxe benefícios à nação argentina.
rio Augusto JakobskindÉ correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE .Direto da Redação.
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