sexta-feira, 27 de abril de 2012

Opinião pública, o que é?

Pergunto aos meus reflexivos botões qual seria no Brasil o significado de opinião pública. Logo garantem que não se chama Merval Pereira, ou Dora Kramer, ou Miriam Leitão. Etc. etc. São inúmeros os jornalistas nativos que falam em nome dela, a qual, no entanto, não deixa de ser misteriosa entidade, ou nem tão misteriosa, segundo os botões.


A questão se reveste de extraordinária complexidade. Até que ponto é pública a opinião de quem lê os editorialões, ou confia nas elucubrações de Veja? Digo, algo representativo do pensamento médio da nação em peso? Ocorre-me recordar Edmar Bacha, quando definia o País -como Belíndia, pouco de Bélgica, muito de Índia. À época, houve quem louvasse a inteligência do economista. Ao revisitá-la hoje, sinto a definição equivocada.



Os nossos privilegiados não se parecem com a maioria dos cidadãos belgas. A Bélgica vale-se da presença de uma burguesia autêntica, culta e naturalmente refinada. Trata-se de tetranetos da Revolução Francesa. Só para ser entendido pelos frequentadores do Shopping Cidade Jardim em São Paulo: não costumam levar garrafas de vinho célebre aos restaurantes, acondicionadas em bolsas de couro relampejante, para ter certeza de uma noite feliz. Até ontem, antes do jantar encharcavam-se em uísque.



Em contrapartida, a minoria indiana, sabe das coisas e leu os livros. Já a maioria, só se parece com a nossa apenas em certos índices de pobreza, relativa ou absoluta. No mais, é infelicitada por conflitos, até hoje insanáveis, étnicos e religiosos. Nada de Bélgica, tampouco de Índia. Nem por isso, a diferença, ainda brutal, existe entre brasileiros ricos e pobres, embora desde o governo Lula tenha aumentado o número de remediados.



O Brasil figura entre os primeiros na classificação da má distribuição de renda, pecha mundial. Na semana passada, CartaCapital publicou ampla reportagem de capa sobre vários índices do nosso atraso, a mostrar que crescimento não é desenvolvimento. De fato, o Brasil sempre teve largas condições de ser um paraíso terrestre, como vaticinava Americo Vespucci, e não foi porque faltou o comando de quem quisesse e soubesse chegar lá. Sobrou espaço para os predadores, ou seja, aqueles que, como dizia Raymundo Faoro, querem “um país de 20 milhões de habitantes e uma democracia sem povo”.


A opinião pública que os Mervais, Doras e Mirians da vida acreditam personificar, é no máximo, na melhor das hipóteses para eles, a dos seus leitores. Há outra, necessariamente, daqueles que não se abeberam a essas fontes, e muitos sequer têm acesso à escrita. Votam, contudo, e são convocados pelas pesquisas de opinião. À pressão midiática, que ignoram por completo, preferem optar por Lula e Dilma Rousseff. Temos de levar a sério esta específica e majoritária opinião pública claramente expressa e, em termos práticos, mais determinante que a outra.



A opinião pública que a mídia nativa pretende personificar já condenou o chamado mensalão e decidiu os destinos da CPI do Cachoeira. A opinião pública da maioria está noutra. O resultado do confronto há de ser procurado nas pesquisas e nas eleições, é o que soletram meus botões. Eles são exigentes e me forçam a um exame de consciência. Por que as circunstâncias me levam à referência frequente a mídia nativa? Acontece que a mídia é, sim, personificação da minoria. Aquela do deixa como está para ver como fica.


A mesma que conspirou contra Getúlio democraticamente eleito e contra a eleição de Juscelino. Ou que apoiou Jânio Quadros em 1960, tentou evitar Jango Goulart depois da renúncia e enfim implorou o golpe perpetrado pelos gendarmes fardados em 1964, e o golpe dentro do golpe em 1968. A mesma que desrespeitou o anseio popular por eleições diretas em 1984 e engendrou uma dita redemocratização, de todo patética, em 1985, e hoje ainda dá uma de galo no papel impresso e no vídeo. Será que a rapaziada se dá conta do que está a acontecer de verdade?


A mídia nativa, é fácil demonstrar, na sua certeza de representar a opinião pública do País todo pratica aquilo que definiria como jornalismo onírico. Neste mister, o Estadão de quinta 26 supera-se. Estampa na primeira página que a presidenta Dilma mente ao afirmar, ao cabo de um longo encontro com Lula em Brasília, a ausência de diferenças entre ela e seu mentor. A presidenta responde obviamente a uma pergunta e diz: “Não há diferenças entre nós e nunca haverá”. Então por que perguntam se estão certos de que seu sonho é a própria verdade? Mino Carta

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