quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O PT, a imprecisão das pesquisas e as incertezas das eleições



Fernando Cartaxo Arruda, Sociólogo ( fcartaxoarruda@gmail.com)

O instrumento da pesquisa eleitoral tem uma trajetória errante na história recente das campanhas eleitorais. Nem sempre revelam a real vontade do eleitor e sofrem acusações até mesmo de serem manipuladas para induzir as escolhas eleitorais. Há mesmo quem afirme que alguns institutos são influenciados por negociações financeiras para maquiar resultados. É certo que o fenômeno das viradas eleitorais tem deixado suas marcas em diversas disputas políticas, que são atribuídas ao calor dos últimos momentos das competições. Ou seja, os resultados das urnas, em muitas ocasiões, não correspondem aos números divulgados pelas pretensas ciências estatísticas da captação da intenção de votos.

A credibilidade de alguns institutos de pesquisa foi gravemente ferida por espelhar uma realidade distinta da verdade obtida das urnas. As eleições em Fortaleza demonstram um histórico rico e diversificado de candidatos consagrados em pesquisas, que dormiram eleitos e acordaram derrotados. As lembranças mais marcantes desses disparates foram as surpreendentes vitórias de Maria Luiza Fontenele e Luizianne Lins nas disputas pela Prefeitura de Fortaleza, não verificadas e previstas nas pesquisas. Muitos outros exemplos existem espalhados por todo o país. O eterno e maquiavélico desencontro das pesquisas com a vontade do eleitor, sendo o caso do Lula o mais emblemático.

As recentes pesquisas eleitorais do Datafolha e do Ibope sobre as intenções de votos na disputa pela Prefeitura de Fortaleza, realizadas nas mesmas circunstâncias e datas, revelam realidades distintas e projetam diferentes rumos e perspectivas na competição entre os candidatos à Prefeitura de Fortaleza. Nesse caso, não há dúvida que de uma mesma realidade observada, com pretensos critérios técnicos e científicos semelhantes, sejam colhidas variáveis tão diferenciadas e contraditórias. É o caso de assegurar a existência, em um dos institutos, de fraude ou erro na metodologia da pesquisa ou manipulação dos dados coletados. O caso emblemático é o do Datafolha, nas eleições para a Prefeitura de Fortaleza em 2004, turvando o processo de ascensão de Luizianne Lins, colocando-a sempre em quarto lugar, até mesmo na pesquisa que antecedeu a eleição. O resultado final foi a chegada de Luizianne Lins no segundo turno e sua vitória eleitoral sobre o candidato Moroni. Claro que em outras circunstâncias o próprio Ibope foi serviçal de interesses da mescla do interesse político com a gana do poder econômico. Não há inocente onde a moeda capitalista domina todos os mercados, inclusive o da cidadania, que virou moeda de troca. O movimento das ruas, o entusiasmo popular e a vontade política de transformar, vencem até mesmo a matemática eleitoral. A história é prenha de acontecimentos que desfazem desejos produzidos pela manipulação dos laboratórios, da força que busca conter os desejos. O que há de concreto é a pulsão do sonho, o reconhecimento do prazer e a vontade de realizar. Essa é a força libertária. Na política e na vida, tudo funciona com a reciprocidade. Ainda bem que existe o chão de realidade para se prosseguir, que o engano das ilusões tende a perecer na estrada da vida.

Daí que se algo há de impreciso não são só os humores do eleitor, mas os institutos de pesquisa em suas numerologias. E o mais grave é que se revestem com lastro da ciência para pautar o debate, influenciar o eleitor e interferir nas estratégias políticas e eleitorais. É o caso da manipulação danosa, a serviço de interesses políticos inconfessáveis, buscando substituir a vontade legitima e democrática do eleitor.

A principal discrepância entre a pesquisa do Datafolha e Ibope se refere ao desempenho do candidato Elmano Freitas (PT), que nas contas do Datafolha sofreu uma estagnação no processo de ascensão, figurando em terceiro lugar nas pesquisas e já sob ameaça do candidato Heitor Férrer (PDT). A pesquisa do Ibope revela o candidato do PT em uma situação bem distinta, numa escalada de ascensão consistente, de cinco pontos percentuais, saltando de 14 para 19%, único a crescer acima da média de variação da margem de erro, dentre os principais candidatos potenciais que disputarão o segundo turno. Ultrapassa o candidato Roberto Claudio (PSB), que teve um crescimento discreto de dois pontos percentuais (de 16 para 18%); e na verdade avança rumo ao líder da pesquisa, Moroni Torgan (DEM), que vem apresentando um declínio nas intenções de voto, agora de forma menos acentuada (iniciou com 32 e agora tem 23%).

 Outra diferença constatada é a da candidatura do Heitor Férrer que tem uma ascensão significativa de quatro pontos percentuais na pesquisa Datafolha, atingindo um patamar constatado em pesquisa anterior pelo Ibope, variando entre os institutos entre 13 e 14% nas intenções de voto. O candidato Renato Roseno é outro sobrevivente diante do poderio das máquinas eleitorais, tanto das estruturas de poder que detém a maior parte dos espaços nas propagandas eleitorais como do financiamento privado que tornam parceiros o capital financeiro e da construção civil, que pouco a pouco vem acabando os espaços verdes da cidade e impondo a sua lógica de lucros nos escassos espaços da cidade de Fortaleza.

É bom e saudável para a democracia que o PSOL e o PDT tenham espaços e afrontem a hegemonia do poder econômico e das novas pretensões de dinastia de domínio do poder político. Uma analise criteriosa sobre a evolução política do Ceará deve compreender que a rendição dos espaços de representação deve preservar a diversidade e a capacidade do controle sobre a escravidão da política ao poder econômico. O próprio PT deve estabelecer novas relações políticas após a decadente aliança com o PSB dos Ferreiras Gomes, pois o artificialismo que perdurou dessa aliança foi um atraso para a evolução da democracia no Ceará.

Uma figura histórica dos movimentos sociais como o senador Inácio Arruda deve ser preservada dessa hecatombe eleitoral, onde prevalece o poder econômico e espaços das grandes estruturas partidárias. A sua postura política merece o reconhecimento de quem observa o processo histórico e democrático das grandes lutas que libertaram o Ceará das dominações dos poderes conservadores e de direita, mesmo que ainda resistentes. O PC do B foi um partido pioneiro na luta popular, nasceu de legitimas batalhas contra a elite tacanha e dominante, que nunca olhou os direitos sociais das classes sociais mais sofridas e exploradas.

O reformismo ilustrado do PSB é uma pretensão atrasada para a política do Ceará. Querem a renovação sem o envolvimento real com as forças populares, sem o diálogo democrático e sem seiva participativa. Essa coisa dos iluminados que buscam ofuscar a legitimidade do poder social, pois imaginam que detém a ciência e a razão para transformar a sociedade. É pura tradição lusitana retrógada, dourada pelo saber do esclarecimento. Nem mesmo o conhecimento do movimento da Reforma Sanitária, movimento político e humanístico da universalização do direito à saúde, parecem dominar. Uma ilusão de poder que não preza a sabedoria popular, muito focados na criatividade inócua e perdulária de uma elite que se sente acima do bem e do mal.

Mas cabe ainda ressaltar que o modelo de gestão da administração Luizianne Lins foi delimitado e não expansivo. O grupo de poder que comandou a gestão nem sempre teve a capacidade de ampliar as ideias sociais que borbulhavam, as vontades de fazer que aconteciam por forças naturais e de disposição humana. Houve, é verdade, um enclausuramento dos espaços de poder, dominados por vezes por personagens que gozavam mais da simpatia da prefeita do que dos interesses sociais prevalecentes e necessários. O candidato Elmano Freitas para se fazer com identidade e preservar sua experiência no orçamento participativo deve anunciar mudanças seminais no processo de gestão e nas escolhas dos gestores. Sem essa liberdade de escolha e sem a disposição de edificar sua marca, corre sérios riscos de enfrentar um segundo turno com danos de origem que hoje minam de forma crítica a administração do PT. É preciso ter a coragem de ousar e fazer diferente, sem o estreitamento de ser um ser serviçal da máquina tradicional e muitas vezes inoperante das correntes do PT. O governo não pode ser uma distribuição de cargos para os grupos que compõem a estabilidade do partido, nem uma compensação sem critérios de aliados sem valor e competência administrativa. A sociedade espera que seja realizado um processo eficaz e agregador das diversas forças vivas que atuam e pensam o cotidiano da cidade. A cultura, que é uma tragédia tanto no estado como no município, deve ser repensada, pois o mundo contemporâneo que vivemos exige uma seriedade e competência em todas as etapas de diagnosticar e formular soluções coletivas. Esse é exemplo simples para tudo que exija planejamento e participação social. A democracia participativa e a gestão compartilhada devem ser o foco do novo e a semente da transformação.

A pesquisa eleitoral demonstra a fragilidade da democracia brasileira. Ela tenta subordinar o pensamento, a vontade do eleitor e as próprias alternativas de realizar uma campanha. E outra coisa que se deve se livrar é a imposição desses falsos marqueteiros, que pensam dominar a ciência da conquista do poder, pois se resumem ao lucro fácil e a lábia de querer direcionar as formas de pensar e agir. O Ceará, em especial a cidade de Fortaleza, tem o antídoto para os artificialismos e as magias dos vendedores de batata. A política tem pele e sensibilidade, sangue e entusiasmo e gosta do amor do que é verdadeiro e exala em sua flor a democracia, a liberdade e os direitos.

 

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