domingo, 12 de outubro de 2014

Michel Zaidan Filho: O sentimento de náusea do mundo político pernambucano

É isso aí.


Quando Miguel Arraes de Alencar tomou posse, pela terceira vez, do Governo de Pernambuco, ele citou uma conhecida frase de Carlos Drummond de Andrade que dizia: "tenho duas mãos e o sentimento do mundo". Se foi mais do que uma mera frase de efeito, significaria que o velho líder do PSB queria dizer que, embora despojado de riqueza e poder, era portador do sentimento fundo das iniquidades sociais e que trabalharia para combatê-las, no exercício do seu último mandato. Infelizmente não pode fazê-lo, em função da política de "terra arrasada" praticada contra ele pelo governo do PSDB e do PFL (leia-se Fernando Henrique Cardoso e Jarbas Vasconcelos). Negaram-lhe até a antecipação de receita da privatização da CELPE, com que ele poderia pagar a folha dos servidores do Estado, no fim do seu melancólico mandato.

 É, portanto, com um sentimento de náusea que se pode contemplar o espetáculo degradante em que se tornou o mundinho político de Pernambuco, reduzido aos interesses de uma família (mãe, nora, filho, irmão, primo, cunhada etc.) Foi nisso que se transformou o calvário da prisão e do exílio do velho Arraes: na formação de mais uma oligarquia familiar, que certamente pensa que o estado é seu e pode ser rateado ou distribuído entre os parentes, os amigos e apaniguados. Alguns, muito novos, aliados de vésperas ou de conveniência. É nisso que se transformou o "leão do norte". Um mero botim para satisfação da ambição e a cupidez de uma minoria, atrelada -na última hora -à carruagem do vencedor.

 E as denúncias só se acumulam. Quando vamos desengavetar os processos sobre as licitações fraudulentas, que tratam de propinas aos políticos do PSB e PSDB, entre nós? Quando será apurado a denúncia do propinoduto da Petrobrás e o superfaturamento da Refinaria Abreu e Lima? - E os grampos da Polícia Federal, que surpreenderam as ligações promíscuas entre empresas e políticos do PSB. E o avião fantasma de Eduardo Campos? - E a doação post-mortem do ex-governador à irmã Marina Silva? E o favorecimento do candidato vencedor a empresários que intermediaram a compra da aeronave? - Nada vai ser apurado? Vai tudo para debaixo do tapete, como aconteceu com os escândalos do longo governo do FHC?

 Se nada for feito para apurar as denúncias e esclarecer a opinião pública, temos de convir que o processo eleitoral e seus resultados estão sob suspeita. A vitória eleitoral está longe de ser um indulto ou anistia para os crimes cometidos durante a campanha política. Pelo contrário: essa vitória será contestada, a cada minuto, pelas perguntas, dúvidas, incertezas, silêncio em relação aos indícios apresentados, desde o início, do processo eleitoral.Nem a morte, nem a vitória representam a porta larga dos cortesões ao paraíso, por mais atraentes que sejam as burras de dinheiro do erário público, os cargos, as demissões, o tráfego de influência, o nepotismo, o troca-troca de favores e apoios recebidos etc.

 Se o Estado for mais do que um mero mercado persa, um balcão de negócios ao arrepio da lei e do controle da sociedade, é preciso agir: dá um basta a este festim alimentado pela memória de um morto, mas a serviço dos vivos, bem vivos - que sobreviveram para contar o dinheiro, as benesses, as vantagens auferidas pela necrofilia política praticada pelos amigos e correligionários.

 Os nossos ancestrais indígenas comiam a carne de seus adversários mortos (o banquete totêmico) numa espécie de homenagem à força, a sabedoria e a coragem dos inimigos. Mas esse canibalismo político atual, visa exclusivamente o botim, as vantagens, o lucro. Não a grandeza, despojamento, vocação de serviço, carisma, dom ou seja lá o que for. Apenas interesses. Só interesses. 


Quanto tempo mais, estaremos dispostos a suportar esse triste espetáculo?

Fonte:Blog do Jolugue

Um comentário:

Unknown disse...

Concordo. É exatamente o que penso e me dá um imenso nojo e grande tristeza. Um bando de abutres que tem como único objetivo seus próprios interesses. Estão se achando donos de Pernambuco.