quinta-feira, 10 de setembro de 2015

O convite de Vossa Excelência

Tive a súbita honra de receber, nesta manhã, em minha residência, um jovem e simpático oficial de Justiça convidando-me para uma audiência na 7ª Vara da Justiça Criminal de Pernambuco, com o Excelentíssimo Senhor Governador do Estado, o Sr. Paulo Henrique Saraiva Câmara. O lacônico e singelo documento, assinado por um servidor da Justiça chamado Elisan da Silva Francisco, não menciona o assunto. Apenas marca a hora, o dia e o lugar do encontro. E uma advertência: "Em se tratando da parte, o não comparecimento da mesma implica ma presunção de culpa perante os fatos contra ela alegados (art.343,ss1o e 2o do CPC).

Deve ser um privilégio do cargo (não só a celeridade do rito de inculpação), mas o poder de convocar uma pessoa a "prestar depoimento pessoal", sob assunto não mencionado, sob pena da presunção confessada dos fatos contra si alegados. Que fatos? Que denúncias? Que crimes? - Onde fica a presunção de inocência? O devido processo legal? O direito do contraditório....quando o litigante é o governador do Estado? Por quê Vossa Excelência não teve a gentileza de declinar as razões de tão honroso convite? - Teria sido, por acaso, pela publicação no blog do Jamildo de um pedido de explicação sobre as denúncias da Polícia Federal de superfaturamento e favorecimento a uma empresa construtora, por ocasião da contratação das obras da Arena Pernambuco, na operação Fair Play? Gostaria de dizer que não fui denunciado pela PF nessa operação. Não tenho ligações com a Construtora Odebrecht, não fui beneficiado pelo favoritismo da "concorrência". Não sou servidor público estadual e nem tenho negócios com o Estado. SOU PROFESSOR TITULAR DA UFPE, e não moro na Várzea.

Na breve convivência com a "entourage" do ex-governador, seja nas reuniões de Boa Viagem, seja em sua mansão do Sítio dos Pintos, ou na Pousada de Olinda, não tive o prazer de conhecer o digno mandatário. Tive sim com o prefeito Geraldo Júlio, na Assembleia Legislativa. Para mim, é frustrante ser convidado por ele, sem saber exatamente de que se trata. Candidamente, o portador do convite perguntou se era proibido fazer crítica às autoridades públicas em nosso Estado ou se o Estado tinha dono. Pura inocência, a dele!

Um mandatário popular ( prefeito, governador, presidente) recebe uma autorização pelo voto para tomar decisões políticas e administrativas, respeitando os comandos constitucionais e as demais leis do país e do estado. Ele, portanto, deve satisfação aos seus representados. Não pode prometer uma coisa e fazer outra. Ou seja, um auditor de contas, transformado em secretário da Fazenda e eleito governador, não pode simplesmente alegar o desconhecimento de fatos graves, como o "rombo" de R$ bilhões nas contas estaduais, atender às exigências de pagamento da Arena Pernambuco (R$ 40 milhões) e dizer que não tem dinheiro para a educação, a saúde, a segurança pública, o esgotamento sanitário, o poder judiciário etc. E colocar a culpa no governo federal, no ajuste fiscal, na lei de responsabilidade fiscal, na crise mundial ou seja lá no que for.

É como se praticasse um estelionato eleitoral para com os eleitores, aproveitando a comoção pública pela morte do seu patrono político. Como dizia o outro, quem não tem competência, não se estabelece. O que não dá é para o povo de Pernambuco aguentar as consequências desse descalabro administrativo, pela eleição de um gestor que pressupunha um chefe ou um comandante que desapareceu. E agora José? Para onde?

Aqueles que confiaram o seu voto e mesmo os que não confiaram o seu ao atual governador do Estado têm todo o direito de saber o que aconteceu com as contas públicas de Pernambuco e qual a relação da política e dos políticos pernambucanos com as denúncias publicizadas com a delação premiada dos réus da Operação Lava Jato, da construção da Refinaria Abreu e Lima e, agora, da Arena Pernambuco.

É sobre esses assuntos que o governador que conversar?


Michel Zaidan
Cientista político da UFPE

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