quinta-feira, 21 de junho de 2012

Últimas considerações sobre o caso Erundina

 
A CPI do Cachoeira voltou a produzir notícias interessantes: algumas positivas, como a intenção do Ministério da Justiça de rastrear bens do esquema Cachoeira no exterior; outras negativas, como a última chicana judicial, entre dois magistrados de Goiás, que pode resultar em cancelamento de toda investigação. A Polícia tem provas de que houve vazamento da operação, e suspeita do juiz Leão Aparecido Alves, que tem ligações com um dos sócios da máfia. Este juiz, por sua vez, entrou com representação contra o colega responsável pela operação Monte Carlos, para saber se foi investigado, o que poderia resultar em anulação de todo o inquérito. Como não quero me preocupar à tôa, prefiro não acreditar que o protesto de um juiz suspeito de corrupção possa atrapalhar o combate a uma das máfias mais sinistras que já acossaram o Estado brasileiro.

Mas a polêmica aliança entre Maluf e PT ainda está quente. É assunto do editorial da Folha de hoje, de colunas da Cantanhede e Janio de Freitas (esta a primeira a criticar Erundina); no Estadão, continuou o assunto principal na coluna da Dora Kramer; no Globo, Merval Pereira usa o tema para falar de aloprados e mensalão.

Então falemos – espero que pela última vez – deste imbróglio. Tenho acompanhado com atenção os desdobramentos deste caso junto à blogosfera. Um post do Nassif, criticando Erundina, gerou mais de 500 comentários, quase todos acalorados. Li quase tudo, para analisar o caso à luz não apenas das estratégias políticas de Lula, mas considerando também as reações dos internautas.
As conclusões a que cheguei, em relação à estratégia política do PT, são as seguintes:
  1. Lula apostou alto. Não é possível que ele não imaginasse a reação da militância de seu próprio partido. Foi uma estratégia eleitoral, maquiavélica e pragmática. Aliás, não faz sentido jogar toda responsabilidade sobre Lula. O encontro com Maluf teve a presença do presidente do PT, Rui Falcão e do candidato a prefeito, Fernando Haddad. Todo mundo apostou alto.
  2. Pode ter havido o objetivo de produzir um factóide político de grande impacto midiático. Se houve, foi bem sucedido. Se não houve esta intenção, foi uma consequência positiva. A máxima “falem mal mas falem de mim” é uma das mais antigas da política brasileira.
  3. O alto custo político para o PT de exibir para o mundo uma imagem tão forte como a foto de Haddad, Lula e Maluf demonstra que o partido está realmente interessado em ganhar as eleições em São Paulo. Disputar com José Serra não é brincadeira. O tucano joga com armas pesadas, como se viu na eleição contra Dilma. A campanha deverá, portanto, trazer ainda muitas polêmicas e baixarias.
  4. O PT possivelmente vai usar a privataria tucana contra Serra. Não teria sentido Haddad cometer a valentia eleitoral de aparecer abraçado a Maluf e acovardar-se na hora de denunciar os documentados crimes de Serra no processo de privatização.
  5. As eleições municipais deste ano estão sendo encaradas como extremamente estratégicas para o PT nacional. Há o entendimento que é melhor pagar agora o preço das alianças constrangedoras do que fazê-lo em 2014. Na campanha de reeleição de Dilma, PP e PSB ver-se-ão em dívida com o PT, e não poderão fazer cobranças abusivas. É melhor constranger Haddad agora do que Dilma em 2014.
Quanto à Erundina, meu entendimento sobre sua postura é o seguinte:
    1. Sua atitude pode ter sido eticamente irrepreensível, mas foi uma dupla traição política ao PSB e ao PT. Seu partido, o PSB, tem se caracterizado por um aliancismo ultrapragmático. Foi aliado até poucas semanas atrás do governo Alckmin, e Erundina não se desfiliou de sua legenda por ocasião da brutal desocupação de Pinheirinho, nem dos ataques truculentos e sem planejamento à cracolândia.
    2. Erundina não deveria ter aceitado o papel de vice de Haddad, sabendo que entraria numa campanha pesadíssima, e que o PP seria aliado do PT. Tendo aceitado, não deveria ter recuado. Recebeu críticas? Ok, deveria ter feito o necessário e sempre difícil enfrentamento político.
    3. Na primeira entrevista que deu à grande mídia, após aceitar a vaga de vice, Erundina fez uma crítica leviana e mesquinha ao “slogan” da campanha de Haddad, dizendo que falar em “novo” era preconceito contra terceira idade. Não era o caso, evidentemente. Novo é um conceito que não tem relação necessária com a faixa etária. Pode-se ser um velho de oitenta anos e ter um espírito jovial. De qualquer forma, não cabe ao vice fazer críticas à campanha de seu próprio candidato através da imprensa. Ou seja, Erundina já vinha roendo a corda desde que embarcou na aliança com Haddad. Provavelmente por motivos pessoais, ressentimentos antigos.
    4. A incoerência de Erundina foi levantada pela blogosfera política que trouxe à nossa lembrança a campanha municipal de 2004, quando a candidata aceitou como vice o conservador Michel Temer, do PMDB, e fez pose para fotos ao lado de Quércia, um nome tão sujo e tão ligado ao conservadorismo paulistano quanto o de Maluf.
Ora, Erundina foi ministra de Itamar Franco, após aceitar um convite sem prévia discussão com seu próprio partido. O governo Itamar Franco teve o mérito de criar o Plano Real e estabilizar a economia brasileira, mas também deu início ao gigantesco desmantelamento do Estado, com o programa de privatizações. Era um governo sustentado fundamentalmente pela direita – e Erundina estava lá.
A conclusão, portanto, é que Erundina é mais um daqueles quadros com boas intenções, uma pessoa proba, ética. Ao mesmo tempo, uma pessoa intransigente e ressentida. É a antípoda de Lula, um político que o povo e o mundo inteiro aprendeu a amar e respeitar por conta justamente de seu pragmatismo em favor dos mais pobres, sua determinação de não se portar jamais com intolerância política e jamais prejudicar as chances de levar forças populares ao poder por conta de pinimbas com figuras do passado.
Algumas considerações sobre Maluf:
  • É um ex-mafioso, um bandidão decadente da política nacional. Não apita mais nada. Mas tem a palavra final sobre o apoio do PP à Haddad e os minutos diários que esta aliança representa.
  • Diante da maior fragilidade de Haddad, que é a falta de conhecimento do eleitorado sobre sua figura, o tempo de TV será fundamental.
  • Não se pode comparar Maluf a Demóstenes Torres. Maluf é passado, um parlamentar apagado e sem influência a nível nacional. Demóstenes é presente, e figurava nas cabeças de uma poderosa máfia política.
Enfim, trata-se de case político interessante, mas vindo de Lula não chega a surpreender. O ex-presidente, desde que assumiu o figurino de Lulinha paz e amor, caracterizou-se pela quase infinita tolerância com seus (ex) adversários, desde que o objetivo fosse fazer o bem aos mais pobres; ninguém pode negar que Lula efetivamente melhorou a situação destes. E para fazer algum bem aos mais pobres, é preciso conquistar o poder. O povo humilde não tem os pruridos éticos de classe média viciada em Facebook e Twitter. Ele não está nem aí para o fato de Lula e Haddad visitarem a casa de Maluf. O povo quer uma vida melhor, ponto. O julgamento da história à foto de Lula, portanto, virá na forma de votos e, em caso de vitória, na avaliação objetiva da administração petista. Se trouxer alívio à dura vida dos pobres paulistanos e significar mais um prego no caixão da direita brasileira (que se perder na capital paulista, corre o risco também de perder o governo do estado), a breve tertúlia com Maluf pode ter valido a pena.

3 comentários:

Anônimo disse...

O Lula deu uma dica do que ele esperava deste apoio, quando perguntado sobre a polêmica gerada, falou que é muito bom, pois dá visibilidade ao Hadad, ruim seria se não estivessem falando nada. Simples, sem gastar nada, o Hadad está tendo "propaganda" antecipada sem ferir a legislação. Vamos aguardar a próxima pesquisa.
walsil

Fábio disse...

REPITO: "POLÍTICA" NÃO É PARA AMADORES: Vejo o seguinte. Em se tratando de uma democracia pobre de valores e de instituições fortes, sem isenção ao nosso STF pelas demonstrações dadas em julgar os corruptos e corruptores do nosso país..., sem me ater nos fatos. É perfeitamente compreensível a estratégia de roubar do adversário, parte da merda que dá o gáz metano para a cozinha do adversário, como o PT o fez ao subtrair o tempo que o esterco do PP daria para iluminar o Serra no horário polítio.Daí a luta ensandecida das agremiações pela bosta "rica" que representa no momento o PP do PM. Portanto. Deixa a Erundina de lado e vamos a luta para eleger o Haddad.

Antanho disse...

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Um ponto muito perigoso é o o jogo sujo do Serra... já tivemos ampla demonstração disto no segundo turno de 2010.
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Ele tem ferramentas de ataque ao carater dos adversários, criação de polêmicas em assuntos religiosos, aborto, homossexualismos, etc... Isto sem falar num "dossiê contra êle ou familia" no inicio da campanha e mais no fim da campanha a "agressão" durante uma passeata ou similar.
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Uma possibilidade é que o Maluf faça este mesmo jogo sujo contra o Serra, divulgando o que sabe... o Maluf apoiou o Serra em outras eleições, deve saber muito... isto além do dia a dia dos bastidores da politica da cidade...
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Será lobo comendo lobo..
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