quarta-feira, 31 de março de 2010

O mistério da morte de Jango


Mauricio Dias

Em depoimento capital, Almino Afonso ilumina uma passagem da nossa história que os donos do poder preferem ignorar

A passagem do 46º aniversário do golpe militar de 31 de março de 1964 é um bom motivo para lembrar o bloqueio à memória de João Goulart, deposto da Presidência naquela ocasião. Essa obstrução provoca uma pergunta ainda sem resposta certa quase 34 anos depois: Jango, como era chamado o ex-presidente brasileiro, morreu no exílio, em dezembro de 1976, de causas naturais ou foi assassinado?

Sobre o golpe há uma vasta bibliografia. Mas ainda é baixa a produção sobre a história da repressão política marcada pela tortura e morte de opositores nos porões da ditadura. Compare a situação brasileira com a dos vizinhos para constatar a desalentadora condição nacional. Ao silêncio de autoridades junta-se a indiferença da sociedade. É a soma da cumplicidade com o medo.

A causa da morte do presidente Goulart está protegida por esse conluio circunstancial. Lentamente surgem mais e mais evidências de que a morte de Jango foi um crime arquitetado pelas ditaduras do Cone Sul. No Brasil, o general Ernesto Geisel estava no poder. Não é por um acaso que a Lei da Anistia, retrato de uma conciliação entre políticos e chefes militares, não consegue ser revisada. A história brasileira é repleta de lacunas guarnecidas por pactos iguais a esse.

A família de Jango recebeu recentemente alguns milhares de reais da Comissão de Anistia. Mas Jango não foi anistiado. A volta dele ao Brasil foi tolerada porque a ditadura só deixou o ex-presidente retornar depois de morto.

Depoimento de Almino Affonso, ex-ministro do Trabalho no governo João Goulart ao boletim Câmara Aberta Sindical, ilumina um pouco mais uma história mantida sob penumbra. Passagens capitais do depoimento.

"Quando eu decidi voltar ao Brasil, em agosto de 1976, o presidente João Goulart mandou o secretário particular dele, Cláudio Braga, almoçar ou jantar comigo e dizer que ele, Jango, estava com problemas para voltar ao Brasil subitamente (...) Ele dizia: eu vou à Europa, à França (...). De lá vou a Roma e visito o papa. De Roma vou a Washington e visito o senador Kennedy. Daí eu vou para o Brasil e subitamente chego ao Rio de Janeiro. Perguntava Jango no bilhete: "É um plano razoável, um plano sensato, o que tu achas?"

Prossegue Almino: "Falei, na conversa com Cláudio, ‘eu no lugar do presidente faria. Porque não vejo o que poderá haver de pior em relação à chegada dele. Prenderem, torturarem, agora, passados tantos anos, matarem? Seria um escândalo mundial de tal ordem que os militares não ousariam. Eu faria este plano!’ Acho que aquilo que o presidente mandou me dizer, para uma consulta generosa comigo, ele teria feito a outras pessoas. Então, isso vazou. Tendo vazado, chegou ao conhecimento dos militares que resolveram tratar de interceptá-lo. Hoje admito, não com provas provadas, mas com muitas razões lógicas: Jango foi assassinado".

Por falha de memória ou, eventualmente, por natural desconhecimento, o ex-ministro de Goulart não faz referência a uma curiosa nota de advertência publicada na primeira página do jornal O Globo, naquela ocasião. O texto de, aproximadamente, dez linhas alertava que, se o ex-presidente pisasse em solo brasileiro, seria preso.

Um recado da ditadura, transmitido pelo empresário Roberto Marinho, certamente a pedido do então ministro da Justiça Armando Falcão, que tinha estreita relação com o dono do jornal. CartaCapital

Um comentário:

Giovani de Morais e Silva disse...

Gilvan, vi recentemente um documentário sobre Jango, onde um ex-agente do SNI dizia que envenenou Jango. Quando o corpo veio para o Brasil, não foi permitido pelos militares a autópsia. Atitude suspeita, não?