segunda-feira, 28 de março de 2011

Política externa brasileira sem ruptura

No mínimo, podem-se classificar como apressadas as interpretações veiculadas por grande parte da imprensa brasileira de que a política externa do governo Dilma Rousseff se diferencia significativamente da praticada durante o governo Luis Inácio Lula da Silva. No máximo, pode-se afirmar que tais avaliações são tendenciosas, pois não se apóiam em evidências significativas.
 
Pronunciar-se claramente contra as penas de apedrejamento de mulheres no Iran, como fez a presidenta brasileira em entrevista ao NYT, ou votar favoravelmente à instalação de um comissariado para investigar as violações dos direitos humanos naquele mesmo país não comprovam rompimento com posicionamentos anteriormente assumidos oficialmente pelo Brasil ou pessoalmente por seu antigo presidente da República. Ainda que Lula possa tenha minimizado a greve de fome de presos políticos cubanos, o que é lamentável, não houve um único momento em que ele ou o seu governo tenham se posicionado favoravelmente às violações dos Direitos Humanos em qualquer país do mundo ou feito vistas grossas a elas.
 
Ter recebido o iraniano Mahmoud Ahmadinejad, como o fez o presidente da república anterior, não contraria a possibilidade de a atual presidenta da República receber Barack Obama, presidente dos EUA, como o fez Dilma. Ambos os recepcionados são governantes máximos de seus países e, nesta condição, foram recebidos com honras de Estado pelos governantes máximos brasileiros.
 
Não representou movimento de rompimento com os EUA a tentativa brasileira de intermediação de um acordo que permitisse a vistoria internacional às instalações nucleares iraniana, ousada durante o governo Lula com o conhecimento e até o incentivo do governo norte-americano. Não representa adesão ou alinhamento brasileiro às posições norte-americanas o fato de Obama ter autorizado o ataque à Líbia durante o intervalo de sua audiência com Dilma.

A crítica, explícita e contundente, à política econômica e ao protecionismo comercial norte-americano, manifestada por Dilma em seu discurso de boas-vindas a Obama, é reforço da posição brasileira de ampliação de mercados para seus produtos e de defesa de seu mercado interno. O voto brasileiro de abstenção na resolução da ONU, que autorizou a criação da Zona de Exclusão Aérea na Líbia e possibilitou os ataques desencadeados àquele país, é coerente com o posicionamento histórico brasileiro, de não intervenção internacional nas disputas internas nos diferentes países.

Ambas as posições são coerentes com a posição ocupada pelo Brasil, e fortalecida nos anos recentes, de liderança das nações do Sul frente às políticas dominadoras dos países do Norte. Nada justifica, portanto, a afirmação de que o governo Dilma Rousseff esteja realizando uma ruptura com a política externa do governo anterior. Sem dúvida que ajustes, mudanças e até mesmo alterações significativas na política externa brasileira poderão ocorrer num futuro próximo. Não há evidências, entretanto, que eles estejam em curso no momento presente.Editorial Sul21

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