Caríssimos sulvinteumenses, cá estamos, ainda do lado de cá da Páscoa, essa
linda celebração em que a cristandade festeja a morte, o sofrimento e os coelhos
ovíparos.
Passio, no entanto, em latim romano, do tipo que crucificava igualmente
ladrões de galinha e salvadores da humanidade, é sofrimento e remete para a
pancadaria com que Jesus foi brindado antes da crucificação. Como isso virou ovo
de chocolate é um milagre melhor explicado pela Ferrero Rocher, caros leitores.
Tão longe a minha teologia não chega.
E quem anda apanhando feito Cristo em encenação da Paixão é o nosso bravo
praticamente ex-senador Demóstenes Torres, o probo.
Demóstenes navegava a onda da moralidade e isso costuma acabar mal, caros
leitores. A onda da moralidade é soprada por ventos dos mais variados, e nosso
bravo senador se viu capturado por um redemoinho ali no meio do caminho, como
diria Guimarães Rosa bem nessa hora.
Há dois anos o senador e eu trocamos sopapos vocabulares. Eu escrevi uma
coluna intitulada “Demóstenes, o errado”, que magoou nosso nobre senador. E,
agora que os ânimos de 2010 esfriaram, pode-se dizer que ele tinha motivos para
mágoa, uma vez que eu disse que ele era senador da categoria Incitatus. Culto,
muito culto, nosso senador pelo bravo estado do Goiás se sentiu maltratado e
respondeu com uma coluna feita por ele mesmo, ou um assessor, quem quer que
tivesse mais afinidade com acentuação, sei lá.
Na época, nosso debate foi um tanto mais conceitual. Demóstenes, o certo,
para mim, era o Demóstenes aquele lá da Grécia Antiga, que nasceu uns três mil
anos atrás. O grande orador que dominou a gagueira e botou pra ver no gogó,
conquistando o mundo antigo pela elegância das idéias muito bem apresentadas.
Nosso bravo goiano, Demóstenes, o errado, achava que era o cara na tribuna.
Levando-se em conta o bravo senado brasileiro, ele até pode ter tido motivos pra
se achar o outro Demóstenes. Mas não era.
No nosso imbróglio, por exemplo, eu escrevi que ele tinha dito que a
escravidão não tinha sido assim tãaaaao horrível, e que as mulheres negras até
mesmo curtiam sexo com os sinhozinho, como teria dito Gilberto Freyre.
Ele ficou muito indignado com o que eu disse e então disse que ele não tinha
dito isso quando falou o que falou. Que ele, na verdade, tinha dito outra
coisa.
Não tinha. Quando falou o que falou ele disse exatamente o que eu disse que
ele disse.
Mau orador, por não ser lá tão bom de idéias, nosso bravo Demóstenes usou
essas idéias confusas e equivocadas para ir contra a política de cotas raciais
nas universidades.
O irônico, é que ele não precisava ter dito a besteira que disse quando falou
o que falou, porque não é necessário provar que a escravidão não foi assim tão
horrível, e de que, portanto, ela não precisa assim de tantas compensações, para
ir contra a política de cotas. Basta dizer que a política de cotas é racista, e,
portanto, inconstitucional. Pronto. Eu vejo isso ocorrer com alguma frequência,
caros leitores. Assim como o nosso Guga dizia que ao vencer Roland Garros tinha
subitamente ficado bonito, há muitos que, por entrarem no senado passam a se
achar inteligentes. Acontece
Demóstenes virou senador pelo Goiás e pronto, virou orador brilhante, na
opinião imparcial dele mesmo. Algo como o que acontece com o nosso bravo Onyx,
por estranha coincidência, também do PFL, como o Demóstenes.
E, o que também vemos acontecer, é o insucesso subir à cabeça. Em breve, os
nossos bravos oradores começam a se acreditar invulneráveis, tais quais o colega
Hércules, igualmente um herói grego.
Como diz a Emília, nos Doze Trabalhos de Hércules, basta vulnerar, que eles
deixam de ser invulneráveis. Emília recitava um encantamento, jogava pó de
pirlimpimpim e, pronto, vulnerava a quem quer que fosse.
Mais ou menos o que ocorreu com o nosso Demóstenes, que foi duramente
vulnerado, pela Polícia Federal, com alguma colaboração, se Brasília é
Brasília.
O que se vê é mais uma vestal com o manto manchado de Omo Total nenhum tirar,
e o tal DEM tendo que explicar que esse foi apenas um desvio de caminho, e que
eles são sim os defensores da moral e das boas práticas políticas, mesmo que sem
um exemplozinho que seja de que isso possa ser minimamente verdadeiro.
Demóstenes maltratou gente demais, por se achar invulnerável. Agora,
vulnerado, está descobrindo com quantos paus se faz uma odisséia. Não é o
primeiro, não será o último. Se encantou consigo mesmo, qual outro ser da
mitologia grega, Narciso. E o seu final, e para isso servem os mitos, foi mais
ou menos o mesmo.
De alguma coisa esses gregos, especialmente os antigos, entendiam. Eles
entendiam, e isso é certo, de Demóstenes. Agora, nós também entendemos.No Sul21
Um comentário:
olha que capa bem trabalhada
http://www.ocafezinho.com/2012/04/03/veja-se-aliaria-a-bin-laden/
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