Mário Magalhães
Recapitulando, já é história:
*
Em 16 de dezembro de 2015, o procurador-geral da República pediu ao
Supremo Tribunal Federal o afastamento de Eduardo Cunha da presidência
da Câmara e a suspensão do seu mandato de deputado federal. Eis trecho
de reportagem publicada naquele dia:
“Para Rodrigo Janot, segundo a PGR, Cunha 'vem utilizando o cargo em
interesse próprio e ilícito unicamente para evitar que as investigações
contra ele continuem e cheguem ao esclarecimento de suas condutas, bem
como para reiterar nas práticas delitivas'. Janot diz que Cunha
ultrapassou 'todos os limites aceitáveis' de um 'Estado Democrático de
Direito' ao usar o cargo em 'interesse próprio' e 'unicamente para
evitar que as investigações contra si tenham curso e cheguem ao termo do
esclarecimento de suas condutas, bem como para reiterar nas práticas
delitivas'. O peemedebista é investigado em três inquéritos sob
suspeitas de corrupção, sendo que um deles já virou denúncia ao STF,
acusado de receber propina de contrato com a Petrobras. Além disso,
acusa a PGR (Procuradoria-Geral da República), ele tem usado seu mandato
de deputado e o cargo de presidente 'para constranger e intimidar
testemunhas, colaboradores, advogados e agentes públicos' para
dificultar a investigação contra si''.
* O “deliquente'', como o
qualificou Janot, tornou-se réu no Supremo em 3 de março de 2016,
acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
* Nesta
quarta-feira, 5 de maio, o ministro Teori Zavascki aplicou-lhe um
gancho: Cunha está fora da Câmara e sem mandato, ao menos por enquanto.
Qual
foi a decisão mais importante da Câmara dos Deputados entre o pedido de
Janot em dezembro e a decisão, 142 dias mais tarde, do ministro do STF?
A
de dar sinal verde, no sombrio domingo de 17 de abril, para o Senado se
pronunciar sobre o impeachment da presidente constitucional.
Eduardo Cunha presidiu aquela sessão.
E foi o artífice indispensável da trama que caminha para a deposição de Dilma Rousseff.
Seu
papel se evidencia no depoimento do seu aliado Paulinho da Força, que
se prepara para indicar o ministro do Trabalho no iminente governo
Michel Temer, o vice correligionário de Cunha.
“O impeachment só tá acontecendo por causa do Eduardo Cunha'', esclareceu Paulinho a amigos.
Nada de revelante ocorreu de 17 de abril para cá. Isto é, as provas essenciais já haviam sido colhidas.
Teori
Zavascki deve ter motivos técnicos para ter esperado tanto para se
definir num assunto que poderia determinar o destino do Brasil _e
determinou, com a virtual administração de Michel Temer, personagem
citado em depoimentos da Operação Lava Jato como beneficiário de milhões
de reais.
Por que o ministro esperou tanto?
Sua demora,
mesmo que não tivesse tal propósito, permitiu a Eduardo Cunha deitar e
rolar em sua obsessão de derrubar a governante, até segunda ordem,
honesta e honrada.
A condição de capo da Câmara também foi usada
em “interesse próprio'' no empenho de Cunha em se vingar do PT, devido à
disposição de deputados do partido de apoiarem a cassação do
“delinquente'', por quebra de decoro parlamentar.
O despacho de
hoje fere o pacto estabelecido no Congresso para salvar Cunha, em troca
do endosso do deputado ao golpe de Estado contra a presidente eleita com
54.501.118 votos.
Eduardo Cunha estava nomeando futuro ministro de Temer, como até os colaboradores mais próximos do vice missivista reconhecem.
É
hipocrisia proclamar agora que o cartão vermelho (ou amarelo) é triunfo
da democracia, mas não ter exigido a saída de Cunha antes da votação
sobre o impeachment.
Antes a presença dele era democrática, e menos de um mês depois não é mais?
Não é democrática hoje. E não era em 17 de abril.
Das muitas ilegitimidades da conspiração que derruba Dilma, Cunha é uma das mais evidentes.
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