quinta-feira, 5 de maio de 2016

Demora de Teori permitiu a Cunha tramar e presidir a sessão do impeachment Comente


Mário Magalhães

Eduardo Cunha, na sessão decisiva de 17 de abril

Recapitulando, já é história:

* Em 16 de dezembro de 2015, o procurador-geral da República pediu ao Supremo Tribunal Federal o afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara e a suspensão do seu mandato de deputado federal. Eis trecho de reportagem publicada naquele dia: “Para Rodrigo Janot, segundo a PGR, Cunha 'vem utilizando o cargo em interesse próprio e ilícito unicamente para evitar que as investigações contra ele continuem e cheguem ao esclarecimento de suas condutas, bem como para reiterar nas práticas delitivas'. Janot diz que Cunha ultrapassou 'todos os limites aceitáveis' de um 'Estado Democrático de Direito' ao usar o cargo em 'interesse próprio' e 'unicamente para evitar que as investigações contra si tenham curso e cheguem ao termo do esclarecimento de suas condutas, bem como para reiterar nas práticas delitivas'. O peemedebista é investigado em três inquéritos sob suspeitas de corrupção, sendo que um deles já virou denúncia ao STF, acusado de receber propina de contrato com a Petrobras. Além disso, acusa a PGR (Procuradoria-Geral da República), ele tem usado seu mandato de deputado e o cargo de presidente 'para constranger e intimidar testemunhas, colaboradores, advogados e agentes públicos' para dificultar a investigação contra si''.

* O “deliquente'', como o qualificou Janot, tornou-se réu no Supremo em 3 de março de 2016, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

* Nesta quarta-feira, 5 de maio, o ministro Teori Zavascki aplicou-lhe um gancho: Cunha está fora da Câmara e sem mandato, ao menos por enquanto.

Qual foi a decisão mais importante da Câmara dos Deputados entre o pedido de Janot em dezembro e a decisão, 142 dias mais tarde, do ministro do STF?

A de dar sinal verde, no sombrio domingo de 17 de abril, para o Senado se pronunciar sobre o impeachment da presidente constitucional.

Eduardo Cunha presidiu aquela sessão.

E foi o artífice indispensável da trama que caminha para a deposição de Dilma Rousseff.

Seu papel se evidencia no depoimento do seu aliado Paulinho da Força, que se prepara para indicar o ministro do Trabalho no iminente governo Michel Temer, o vice correligionário de Cunha.
“O impeachment só tá acontecendo por causa do Eduardo Cunha'', esclareceu Paulinho a amigos.

Nada de revelante ocorreu de 17 de abril para cá. Isto é, as provas essenciais já haviam sido colhidas.

Teori Zavascki deve ter motivos técnicos para ter esperado tanto para se definir num assunto que poderia determinar o destino do Brasil _e determinou, com a virtual administração de Michel Temer, personagem citado em depoimentos da Operação Lava Jato como beneficiário de milhões de reais.

Por que o ministro esperou tanto?

Sua demora, mesmo que não tivesse tal propósito, permitiu a Eduardo Cunha deitar e rolar em sua obsessão de derrubar a governante, até segunda ordem, honesta e honrada.

A condição de capo da Câmara também foi usada em “interesse próprio'' no empenho de Cunha em se vingar do PT, devido à disposição de deputados do partido de apoiarem a cassação do “delinquente'', por quebra de decoro parlamentar.

O despacho de hoje fere o pacto estabelecido no Congresso para salvar Cunha, em troca do endosso do deputado ao golpe de Estado contra a presidente eleita com 54.501.118 votos.

Eduardo Cunha estava nomeando futuro ministro de Temer, como até os colaboradores mais próximos do vice missivista reconhecem.
É hipocrisia proclamar agora que o cartão vermelho (ou amarelo) é triunfo da democracia, mas não ter exigido a saída de Cunha antes da votação sobre o impeachment.

Antes a presença dele era democrática, e menos de um mês depois não é mais?

Não é democrática hoje. E não era em 17 de abril.

Das muitas ilegitimidades da conspiração que derruba Dilma, Cunha é uma das mais evidentes.

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