Pelo momento em que acontecem, as
denúncias oferecidas ontem pelo procurador-geral, Rodrigo Janot, ao STF
contra 33 pessoas têm alguns objetivos claros e outros ainda
enigmáticos.
O acordo de delação premiada do
senador Delcídio do Amaral, base principal das denúncias, foi firmado
com a Procuradoria Geral da República pouco antes de ele deixar a
prisão, em 19 de fevereiro, lá se vão mais de dois meses. O procurador
teve tempo para examinar a peça. Esperou até ontem, mas não pôde esperar
mais uma semana para oferecer as denúncias. Seu relógio forçou a
coincidência com os dias cruciais que antecedem a votação da abertura do
processo de impeachment. Com o pedido para investigar Dilma, não
divulgado pelo STF, ele jogou a pá de cal que faltava ao processo.
A sorte dela já estava selada, dirão
alguns. Já havia votos para autorizar o início do julgamento,
determinando o afastamento. É certo, mas com a denúncia Janot ofereceu
algo como uma legitimação ao processo que, dentro e fora do Brasil, é
tido como um golpe parlamentar. Golpe com rito e tudo, transmitido ao
vivo. O senador Cristovam não honra sua inteligência quando pergunta,
como fez ontem, como o impeachment pode ser golpe se tudo está sendo
feito às claras. Golpe não acontece só com baionetas ou no escurinho das
cavernas, senador. Acontece quando se tem a força e ela é usada para
abater o adversário mesmo que seja preciso atropelar a Constituição. E a
força, no caso, é a soma dos votos reunidos contra Dilma. Primeiro na
Câmara e agora no Senado.
Voltando à denúncia de Janot, até as
criancinhas entenderam que Aécio Neves entrou na lista para justificar
as pancadas no PT e no PMDB, e mesmo a inclusão de Lula na lista dos que
deseja investigar. Se condenado, Lula estará inelegível para 2018.
Assim, Janot terá concluído a tarefa do Congresso de dar cabo do ciclo
de governos petistas.
O que ninguém entendeu foi a
alegação de que, contra Temer, os indícios colhidos na delação de
Delcídio foram “insuficientes” para denunciá-lo. Mas está entendido que,
se Janot poupou Temer agora, poupado estará para sempre. Depois que
assumir a Presidência, por força de dispositivo constitucional, não
poderá ser investigado por atos anteriores ao mandato. Isso inclusive
valeu para Dilma em relação a ocorrências do primeiro governo dela.
Ainda assim, as denúncias atingem
duramente o futuro governo Temer. Se ele levar a cabo a disposição para
nomear investigados, começará trombando com o udenismo das ruas. Ou é
seletivo o moralismo do MPL, o Vem Prá Rua e estes outros movimentos
anti-PT? Com toda a cúpula do PMDB atingida, noves fora Cunha, os que
gritavam “fora PT” vão dizer “fora PMDB” ou isso não importa?
Segundo Janot, o Brasil vinha sendo
governado por uma organização criminosa que tinha um braço petista e um
peemedebista, e este último dividido entre PMDB da Câmara e PMDB do
Senado. Isso era sabido por Deus e o mundo. Agora o braço peemedebista
vai continuar governando e o Brasil vai achar que tudo mudou? A rajada
de Janot contra o PMDB talvez esteja na origem da vacilação que o PSDB
sofreu nas últimas horas em relação à participação no governo Temer. Vão
entrar para um balaio de denunciados. Mas, como diz velho ditado, quem
anda com porcos come farelo.
Em suma, o governo Temer pode até
produzir alguns milagres, como preconiza o PSDB em seu documento
programático. Mas dificilmente vai pôr fim às trepidações políticas
provocadas pela Lava Jato e à inexorável deslegitimação do sistema
político-partidário.
Nenhum comentário:
Postar um comentário