segunda-feira, 3 de maio de 2010

'Time' não lê a mídia nativa


Incrível: a revista americana escolhe como um dos 100 mais o alvo preferido dos nossos jornalistas


O partido da mídia nativa quer o confronto direto entre Serra e Dilma em lugar do plebiscito entre o passado fernandista e o presente lulista. Não prima porém pela coerência. De fato, volta e meia aí está a alvejar o presidente, monoglota centralizador a beirar o ridículo, autor de memoráveis gols-contra em política exterior, além de padrinho de uma candidata guerrilheira que pretende se fazer passar por Norma Benguel.

Às vezes me pergunto o que levaria boa parte dos nossos jornalistas, alguns deles experientes, a se engajarem na porfia, não como profissionais e sim como participantes. Militantes. Combatentes. Acreditam no que escrevem e falam? Ou se empenham para agradar ao patrão, que eventualmente chamam de colega? Ou tudo resultaria de um aprendizado, longo ou curto a depender do envolvido, que lhes anula o espírito crítico e os escraviza a opiniões e sentimentos alheios?

Parece-me, até, que se forma, no decorrer do processo, uma espiral viciosa, pela qual o jornalista cria sua verdade sem preocupar-se com o factual e convence o leitor da chamada (sublinho, chamada) classe média. O prosélito repete o lido, ou ouvido, à exaustão, até torná-lo frase feita, e a bola volta enfim ao profissional, graniticamente convencido, ele próprio, pelo milagre da transformação da opinião em fato.

Prefiro imaginar a explicação acima do que a má-fé de muitos companheiros de profissão. Não me iludo, está claro, em relação à postura dos barões midiáticos. É da tradição que eles se unam diante do risco comum. Mesmo que risco não seja. Lula cuidou de confirmar a sua Carta aos Brasileiros, e se, no seu governo, a qualidade de vida das classes D e E melhorou, queixas não se justificam por parte das demais. Sobretudo da A.

Quem sabe os nossos capitalistas ainda não tenham entendido o exato sentido do capitalismo. Resta a crítica feroz e incansável à política exterior, a qual carrega um defeito irreparável aos olhos dos senhores: marca sua independência ao se afastar dos ditames de Washington. Mas que fazer? Se dependesse dos editorialistas, e do governo de FHC, a Petrobras já estaria nas mãos da Shell, ou da Esso.

Neste momento a mídia encanta-se com a irritação de Ciro Gomes, frustrado em seus propósitos de candidato. Este capítulo poderia ser chamado “A Floresta dos Enganos”, em homenagem a Gil Vicente. Que Ciro esteja agastado é compreensível, e o enredo começa com a desastrada tentativa de José Dirceu para levá-lo à desistência, nem se sabe a que título e com quais poderes.

Vale lembrar, contudo, uma ou outra passagem de uma entrevista de Ciro Gomes, publicada por CartaCapital na edição de 10 de fevereiro passado. “Lula é um presidente extraordinário.” “Fernando Henrique (...) se avacalhou (...) virou o que houve de pior na vida pública brasileira.” “O atual governador de São Paulo é um elemento central do projeto FHC.” “Essa mídia que nós temos é um problema porque, na verdade, ela é um partido político.” Pois é, agora a mídia-partido esquece o que Ciro já disse.

Não cabe relevar ninguém. Ao perceber o uso que o jornalismo pátrio faria dos seus pronunciamentos atuais, o ex-governador do Ceará melhor agiria se ficasse quieto por ser impensável seu alinhamento com o lado de lá. Nem por isso, é evidente que a presença de Ciro no páreo prejudicaria a candidatura de Dilma Rousseff. Talvez a fortalecesse em um segundo turno.

Resta o registro de uma situação espantosa: na redação da revista Time não há quem leia editoriais, colunas, artigos, reportagens editorializadas da nossa imprensa. Caso contrário, o famoso news-magazine não apontaria o presidente Lula como uma das mais influentes lideranças em 2010. Nemo propheta in patria diziam os romanos antigos, ninguém é profeta na sua terra. Lula não é para os donos da mídia e seus sabujos, é porém para 80% dos brasileiros.

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