Eu estava sem saber o que escrever nesta quarta-feira, ainda de ressaca das eleições do último domingo.
Estava como na canção de Zeca Baleiro
“Mais sem graça/
Que a top model magrela/
Na passarela/
Eu tava só/
Sozinho!/
Mais solitário/
Que um paulistano/
Que um canastrão/
Na hora que cai o pano/
Tava mais bobo/
Que banda de rock/
Que um palhaço/
Do circo Vostok...”
“Mais sem graça/
Que a top model magrela/
Na passarela/
Eu tava só/
Sozinho!/
Mais solitário/
Que um paulistano/
Que um canastrão/
Na hora que cai o pano/
Tava mais bobo/
Que banda de rock/
Que um palhaço/
Do circo Vostok...”
O sentimento interno era de quarta-feira cinzenta, embora o sol no jardim, no céu azul, fizesse e faça um absurdo contraste entre a paisagem física e o que vem dentro do peito. Com tanto canto de pássaro, com tantos sininhos que passam a anunciar sorvete, pra quê sofrer, ou como lembrava Vinícius, “pra quê sofrer / Se há sempre um novo amor / Em cada novo amanhecer”? Nem precisava dizer, mas sou obrigado, porque ao escrever tenho que ser claro, mais límpido e vivo que o sol agora na rua: estava triste, sem explicação ou norte para o comportamento eleitoral de parte dos jovens no último domingo. Chateado, para dizer o mínimo, porque esperava uma votação majoritária, eloquente, expressiva, para a candidata Dilma.
Para quem já foi professor de jovens, e de muitos deles ou quase todos de área de risco, porque todo jovem sempre está em área de risco, material ou de angústia... Se me entendem, para quem tem filhos na idade dos 20, ou que acompanha os conflitos a ponto de explosão dos filhos de amigos que não adotaram a tática da conformação... Se me entendem, foi como uma traição dentro de casa, dentro do coração, para um bem muito precioso, tão ou mais importante que a vida. O dado objetivo, exterior, de cumprimento de dever eleitoral, cheio de pesquisas e números não nos atinge. Mas as pessoas em quem mais acreditamos, os que vêm depois de nós neste barco e jornada, sim.
Eu não quero ver você cuspindo ódio /
Eu não quero ver você fumando ópio, pra sarar a dor /
Eu não quero ver você chorar veneno...”
Zeca Baleiro nos vem porque no domingo o ouvimos muito, quase como uma premonição do que viria. “O melhor futuro este hoje escuro”, ouvíamos, apesar da onda do mar a bater no arrecife, no sol da tardinha. Já na jovem caixa do supermercado, já nas notícias dos filhos nas salas de aula, vinham notícias de que Dilma não era majoritária. Por quê? Quando chegaram os resultados finais, para nosso espanto descobrimos que jovens classe média, jovens evangélicos, outros jovens, pegaram outro rumo. Por quê? Onde foi que erramos?
Então me chega um telegrama, na forma de email, do professor Otaciel Oliveira: “É preciso ter morado em Água Fria, saber o que foi o golpe de 64 e quem o patrocinou, e ler coisas que puxam pelo raciocínio. A juventude atual tem a leitura como um passatempo". Isso mudou o meu dia, assunto e texto, porque exatamente ontem recebi a notícia de que Ivan, um grande amigo de infância, havia falecido, louco, gordo e sem memória. O espaço não dá para contar a sua tragédia, mas uma breve informação sobre ele podem ver aqui Clique aqui
Recebi a notícia e fiquei sem espaço, calado até há pouco, até este minuto, porque não havia ambiente entre os jovens meus filhos, entre os jovens filhos dos meus amigos, para esta breve tragédia, de um jovem como eles destruído pelo golpe militar, no primeiro de abril de 1964. “Naqueles anos, um rapaz de futuro era um rapaz que gostava de ler, de perguntar, de argumentar. De futuro também era Ivanovitch. Dos seis filhos de seu Joaquim ele era o mais brilhante: gostava de matemática, de química, de física, de política, de filosofia, de romance, lia como um animal que tem fome de letras. E sempre a sorrir...”. Agora, com a mensagem do professor Otaciel, fiz o link, entre o que fomos e o que vemos, e por isso me reconcilio com Ivan e com o presente.
Eu não sabia até antes destas linhas o que dizer, o que queria dizer, o que ia dizer. Mas agora já não estou mais bobo que palhaço do circo Vostok. Porque digo enfim: não permitam, jovens, a volta daqueles tempos de ódio, de destruição, tão bem representados na candidatura Serra. Não permitam, não permitiremos.
Agora posso me levantar em paz, porque, como canta Zeca Baleiro, fazendo uma citação de Dolores Duran e Jobim:
Me dê a mão vamos sair/ Pra ver o sol!”
Urariano Motta, Direto da Redação
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