terça-feira, 19 de novembro de 2013

Direita e esquerda se evidenciam



Em alguns momentos da história cotidiana, a sociedade se coloca em dúvida sobre a existência de partidos políticos ou de posições ideológicas de direita e de esquerda. A polarização deixou de ser evidente, porque superamos os períodos mais duros do terror, quando abrir a boca significava o risco de morte, de tortura, de prisões arbitrárias, do rapto de filhos, do desaparecimento de pais, de amigos, de companheiros de luta. A democratização do mundo e do Brasil, da nossa América Latina massacrada pelos governos militares, tornou as coligações partidárias possíveis e até necessárias para se chegar ao estado de direito desejado por todos. A conquista da democratização trouxe o debate público para as ruas e a chance de se escolher, por meio do voto, o projeto político que queremos para o País, para os estados, para as nossas cidades. A democratização trouxe um relacionamento, digamos, diplomático para a política – e a aparente falta de enfrentamento às vezes faz pensar que esquerda e direita são coisas do passado.
São apenas aparências. Os momentos que vivemos com as prisões dos condenados pelo STF trazem luz sobre a identidade de partidos e de líderes. Não significa dizer que assistimos a uma luta do bem contra o mal. É claro que líderes e pessoas comuns não podem ser distintas entre anjos e demônios. Todos são seres humanos, suscetíveis a erros e com a divina chance do acerto e da evolução. Mas não há dúvida que momentos como os que estamos vivendo agora deixam claras as ideologias.
Marilena Chauí nos esclarece o que significa ideologia: é o conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (ideias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam o que a sociedade deve pensar, o que deve valorizar e como deve valorizar, o que deve sentir e como deve sentir, o que deve fazer e como deve fazer. São portanto as representações, normas, regras, com a função de dar uma explicação racional para as diferenças sociais, políticas e culturais, sem jamais atribuir tais diferenças às desigualdades sociais ou às diferenças de classes e de interesses dos poderosos.
E a nossa filósofa nos faz questionar: os vencedores – os poderosos – são os únicos sujeitos da história. Não apenas por aniquilar os vencidos com a própria morte, com um cala a boca pela baixa autoestima, pelo medo, pela tortura ou pela ameaça às suas famílias, mas também por aniquilar a sua memória, contando-lhes outras versões da história. Marilena Chauí nos questiona, por exemplo, "por que a escola ensina que a abolição foi um feito da Princesa Isabel?" E os índios? Qual a história contada sobre eles? E os operários? Aprendemos na escola que a história é feita por "grandes homens". Em contraposição com os pequenos, que não precisam nem ter opinião e devem apenas trabalhar para fazer a fortuna e aumentar o poder dos grandes.
A ideologia não é coisa do passado. Está presente e se evidencia em momentos como o que vivemos agora. É afirmada e repetida insistentemente pela televisão – porque à mídia interessa que se continue contando a história dos grandes. Interessa que se eleja o neoliberalismo como salvação do planeta. Aos grandes, interessa o lucro. O neoliberalismo nada mais é do que o poder do mercado. Lógico, o poder do grande mercado.
O que se vê hoje na televisão não é a tentativa de se fazer justiça e se combater a corrupção – senão as condenações (tão rápidas que contradizem a própria concepção que o povo brasileiro tem de sua Justiça) não se limitariam unicamente ao PT. Essa única observação já é suficiente para se desconfiar de que tem algo errado nesse julgamento. O que se vê na televisão não é o julgamento desse ou daquele político, mas a evidência de um conflito ideológico. A briga não é contra José Dirceu ou Genoíno, mas contra o projeto de sociedade que eles representam. A briga é da ideologia de direita contra a ideologia de esquerda. A briga é contra o projeto político do Partido dos Trabalhadores. Pensemos no que isso significa:
Acabamos de assistir as comemorações dos dez anos do programa Bolsa Família. E o preconceito ideológico que essa pequeníssima distribuição de renda provoca nas classes dominantes. As mudanças sociais derivadas desse, que é o maior programa de distribuição de renda do mundo, foram exaustivamente debatidas nesses dias de comemoração. Para conseguir essas mudanças sociais o investimento anual do governo é de R$ 24 bilhões, o equivalente a 0,46% da economia nacional. E, por haver distribuição de renda, o Bolsa Família é muitas vezes criticado. Assim como são criticadas as cotas raciais.
Mas alguém criticou a presidenta Dilma por querer agilidade no repasse de R$ 136 bilhões para financiamento do Plano Agrícola e Pecuário 2013/2014? Disponibilizar dinheiro para os ricos não suscita questionamentos. Não se cogitam perguntas. Nunca. É uma questão ideológica. Há um discurso mudo nisso, que diz que o povo não tem que questionar o que para as classes dominantes é inquestionável.
A mesma coisa se repete nas prisões que vemos agora na televisão. Por que só o PT? Por que não foram para as manchetes as relações entre bancos e privatizações de empresas públicas com a compra de votos de parlamentares para a aprovação da reeleição do presidente Fernando Henrique? Os questionamentos sobre o assunto foram abafados e – como diria a filósofa Marilena Chauí – essa memória foi apagada. Por que esse tipo de assunto não interessa à imprensa e a certos ministros do STF? É óbvio que o espetáculo tem patrocinador. O que está em jogo não é a moralização do País, mas a disputa pelo poder. Já que os ideólogos de direita não conseguem atingir seus objetivos com argumentos desfavoráveis ao projeto político do PT – que tirou 50 milhões de beneficiários da Bolsa Família da extrema pobreza e que traz esse dinheiro aplicado de volta ao PIB porque ele provoca a circulação de economias locais.
Nunca o País teve governos tão comprometidos com o fim da desigualdade – lembrou a presidenta Dilma na semana em que se comemorou os dez anos do Bolsa Família. Ela lembrou ainda da oferta de 800 mil vagas de capacitação pelo Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) Brasil Sem Miséria. Nunca tantas crianças de famílias pobres puderam mostrar o seu valor e ter esperanças de mudar de vida, de serem doutores, de se libertarem da opressão das classes dominantes. Não, a opressão não é coisa do passado.
As fotos que estão circulando nas redes sociais que mostram Lula, Dilma, Dirceu e Genuíno algemados pela ditadura merecem reflexão muito séria se queremos mudar o País. Essas imagens simbolizam as perseguições contra os que ousaram pensar em um Brasil como o que hoje está sendo construído pelo PT e por todos os brasileiros que tem coragem de fazer a revolução diária que o Brasil precisa.
As imagens que vemos hoje na televisão, de prisões injustas – sem direito de defesa como estão sendo essas prisões determinadas pelo STF, sem provas e sem defesa – essas imagens revelam que as perseguições continuam. Revelam que, mesmo sem Guerra Fria, continuam também evidentes as diferenças entre ideologias de direita e de esquerda.
Mas os perseguidos não estão sozinhos. Manifestações de brasileiros, no País e no mundo, se somam nas redes sociais e em veículos de imprensa alternativa que se comprometem a divulgar o que está acontecendo de fato. Em Brasília, rapidamente militantes e líderes do PT e partidos aliados se mobilizaram para demonstrar aos companheiros que eles não estão sozinhos. E para enfatizar à população que as prisões são injustas e que eles são prisioneiros políticos, tanto quanto foram na ditadura, pelas mesmas razões pelas quais já passaram antes pelas masmorras do regime.
Faço parte desta mobilização que se faz agora, e que neste dia esteve à espera daqueles que são vítimas desse arbítrio. Esperamos eles hoje em Brasília e estaremos em vigília a partir deste momento. Não somos apenas nós do PT que estamos conscientes do que está acontecendo. Cidadãos oferecem solidariedade, demonstram carinho e disposição em não deixar que se esmoreçam os propósitos de continuarmos a missão de transformação desta sociedade, que viveu tantos anos sob o jugo de autoridades que corromperam os mais essenciais direitos humanos. O dia de hoje é histórico para todos nós. Para todos os que não admitimos mais a continuidade da fome, da miséria, da falta do conhecimento que leva o povo à subordinação que o condena desde 1500. Nunca antes na história desse País vivemos as expectativas que vivemos hoje para o povo brasileiro. O Partido dos Trabalhadores mudou o rumo da política neste País. E continua o seu projeto político de transformação. Repito aqui os nossos refrões eternos: A luta continua. O povo unido jamais será vencido. Os amores na mente, as flores no chão. A certeza na frente, a história na mão.

Roberto Policarpo

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