segunda-feira, 11 de abril de 2011

Tarso Genro: Rio Grande do Sul está em “desarranjo estrutural”


Com o Rio Grande do Sul, a Agência Brasil inaugurou neste domingo (10) uma série de entrevistas com os principais governadores do país. O objetivo é mostrar os desafios de cada governo nesse início de gestão. Com quase 11 milhões de habitantes, o Rio Grande do Sul tem uma economia forte, baseada no agronegócio e na indústria. Também ostenta bons índices de desenvolvimento humano, mas, como a maioria dos estados, enfrenta problemas na área de infraestrutura.


Nos primeiros dias de governo, Tarso Genro tenta colocar as contas em dia. Cálculos apontam que o déficit do estado pode chegar a R$ 500 milhões só este ano. Para responder a isso, o governador busca o crescimento econômico, a redução das despesas públicas e a reorganização da Previdência pública estadual. Tarso, que foi ministro da Educação, da Justiça e de Articulação no governo Lula, implanta no estado iniciativas originadas na esfera federal, como o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e o Programa de Segurança Pública com Cidadania.

Agência Brasil: Qual foi a situação econômica que o senhor encontrou ao assumir o governo do estado, e quais foram as primeiras medidas tomadas?

Tarso Genro: A situação financeira do estado é de desarranjo estrutural, não se trata de uma mera crise conjuntural. É um processo que vem há mais de 30 anos. E isso obriga os governantes a trabalharem com déficit. Esse déficit percorreu o governo do estado durante um largo período, e continuará percorrendo.

Agência Brasil: O quer pode ser feito para sanar esse déficit?

TG: A nossa resposta para isso é o crescimento da economia do estado, investimentos fortes para promover o crescimento, melhorar a arrecadação, tecnicamente qualificar o processo arrecadatório, modernizá-lo, racionalizar as despesas públicas de maneira adequada. E com isso obter espaço fiscal, inclusive para contrair empréstimos internacionais, como já estamos fazendo. O estado tem uma situação de desarranjo completo, mas não é um estado ingovernável. Quando nos candidatamos, sabíamos que essa era a situação, por isso estamos preparados para enfrentá-la.

Agência Brasil: Qual é o tamanho desse déficit?

TG: O déficit para este ano está previsto em torno de R$ 400 milhões a R$ 500 milhões. Nós temos os depósitos judiciais que são usados para cobrir o déficit, mas se paga juros para isso. Então lançamos mão de empréstimos que estão à disposição para momentos de emergência. Não estamos prometendo nenhum tipo de medida violenta ou fantasiosa para solucionar as questões de estado. Mas, de qualquer forma, as grandes questões programáticas e mudanças de modelo de desenvolvimento estão sendo encaminhadas de maneira adequada.

Agência Brasil: Alguma promessa de campanha está sendo comprometida ou adiada por causa da realidade financeira?

TG: Nós, na verdade, não fizemos promessas de campanha, mas fizemos uma proposta de um programa de governo, com metas determinadas. E tudo aquilo que nós prometemos já está sendo encaminhado: investimentos em infraestrutura, com esses empréstimos internacionais; a redução da carga tributária das micro e pequenas empresas, que já encaminhamos; o perdão da dívida de agricultores devedores do Banrisul, que estava infernizando a vida de mais de 40 mil famílias do estado; a reorganização administrativa do estado com vistas a ter uma agência de desenvolvimento e potencializar investimentos no estado; o início do cumprimento do piso constitucional dos professores, nós já estamos fazendo proposta ao Cpers [Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul] de reduzir a diferença do piso regional para o nacional de 66% para 51% . Então, nada do que prometemos deixou de ser encaminhado. Agora, com três meses de governo, essas são medidas preliminares e preparatórias, mas são medidas de fundo que vão permitir o cumprimento do nosso programa.

Agência Brasil: Os cortes orçamentários anunciados pelo governo federal recentemente afetaram o orçamento do estado?

TG: Certamente afetam, porque tem emendas que entram nesses cortes, mas não existe nenhum impacto significativo em relação ao Rio Grande do Sul.

Agência Brasil: Qual o objetivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social que foi criado no estado?

TG: É o mesmo objetivo do Conselhão Nacional, que eu montei na época do governo do presidente Lula. Transferimos a experiência para o estado, e o conselhão aqui tem a mesma finalidade: produzir políticas públicas negociadas. As políticas públicas que podem ser acordadas, elas são implementadas através de um acordo político no conselho, que define prioridades que o governo vai desenvolver de acordo com o seu programa. Dois exemplos: estamos com grupos de trabalho do conselhão instalados que vão orientar a questão da qualidade do ensino e a reforma do sistema de pedágios do estado. São questões que têm que ser negociadas socialmente, que só adquirem força política vinculante, só empolgam realmente a sociedade e a própria administração pública, se em torno delas se produz algum tipo de consenso para que essas políticas sejam viabilizadas.

Agência Brasil: O que pode mudar no sistema de pedágios?

TG: O sistema de polos é um sistema hostil que veda o direito de ir e vir, criando circunstâncias muito agressivas no entorno das cidades. O sistema pode se transformar em ponto a ponto, com coordenação comunitária, ou utilizar a metodologia do governo federal para os pedágios, que reduziu bastante os custos. Aqui, os custos são altos e os pedágios praticamente cercam as cidades. As concessões se extinguem em 2013. Nós mudaremos o sistema de concessões, não extinguiremos as concessões, elas deixarão de existir e faremos licitações dentro do novo sistema.

Agência Brasil: O que precisa mudar na Previdência do estado?

TG: Temos que viabilizar a Previdência pública do estado e fazer uma negociação com os servidores e com a sociedade. Nossa Previdência hoje só vive graças às complementações do Tesouro Nacional. Portanto, temos que reorganizar a Previdência, em um acordo com os servidores para favorecer os próprios servidores que, em última análise, são os destinatários dessas políticas de seguridade de Previdência Social, que envolvem milhares de servidores públicos.

Agência Brasil: O senhor também está apoiando a redução da aposentadoria para ex-governadores?


TG: Estamos trabalhando a questão do teto, da moralização das ajudas aos ex-governadores. Eles não têm culpa de receberem, mas de fato existe um abuso originário da legislação. Isso faz com que os governadores recebam uma pensão que se soma às suas aposentadorias, a valores de mandatos, a conselhos em que eles atuam e até ao que eles recebem da iniciativa privada. Então, fica um valor que seria pago para dar tranquilidade na vida do governador como aposentado, para que ele não precise depender de favores privados para viver, se torna um privilégio que soa muito mal ao Poder Executivo. Nós estamos propondo que haja uma ajuda modesta para o governador, perante o que são os salários do estado, e que essa ajuda seja paga a quem não tem outra fonte de renda, seja ela pública ou privada.

Agência Brasil: Quais são os principais problemas na área da segurança pública do estado?


TG: A situação da segurança pública no estado é deficiente. Aqui não se implementou de maneira ordenada o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, o Pronasci, como ocorreu no Rio de Janeiro. Então, estamos implementando aqui o Proesci, que é o Programa Estadual de Segurança Pública com Cidadania, que é uma contraface do Pronasci. Essa implementação vai se desdobrar ainda este semestre, já temos as zonas prioritárias para que isso seja implantado, com policiamento comunitário, mulheres da paz, programas sociais para jovens, viodeomonitoramento em determinadas regiões, qualificação da polícia por meio do policiamento comunitário, esses programas que foram originários do Ministério da Justiça, inclusive na época em que eu fui ministro, e que, com a orientação do presidente Lula, nós instituímos um programa por meio de lei federal.

Agência Brasil: Recentemente, o estado sofreu as consequências das chuvas no Sul e, todos os anos também sofre com a estiagem. Existe alguma previsão de aumento de recursos para a Defesa Civil?


TG: Nós temos uma defesa civil muito boa, estivemos em cima do laço nos acontecimentos climáticos que tivemos no estado e temos condições de dar uma resposta imediata a qualquer tipo de catástrofe que seja deste porte que o estado possa enfrentar. Atualmente estamos fazendo um programa de ajuda para municípios que forem atingidos, inclusive com ajuda do próprio governo federal.

Agência Brasil: O fato de o senhor ser do mesmo partido do governo federal, e já ter ocupado diversos ministérios no governo Lula, ajuda no relacionamento com o governo Dilma e na captação de recursos para o estado?

TG: O Rio Grande do Sul estava de costas para a União. Agora, nós estamos de bem com o governo federal, não se trata de nenhum tipo de compadrismo. É uma relação federativa onde o estado e a União, juntamente com os municípios, atuam de forma articulada, sistemática, para desenvolver determinadas políticas públicas que são de importância para todos, e isso antes não ocorria. Isso realmente foi uma mudança muito grande aqui no estado, que é muito sentida pela população.


Fonte: Agência Brasil

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