Wálter Fanganiello Maierovitch
Titular da cadeira de História Contemporânea da Universidade de Palermo, Salvatore Lupo acaba de lançar a obra Quando la Mafia Trovò l´America. A pesquisa historiográfica sobre esse encontro, descoberta dos EUA, englobou arco temporal de 1888 a 2008.
Sobre métodos mafiosos empregados, comparações com o Brasil são inevitáveis. Essas seculares práticas também se enraizaram por aqui. A Máfia, como os José Sarney, Renan Calheiros, Arthur Virgílio, Jader Barbalho, para ficar naqueles mais notórios, atua como parasita. Ou seja, suga o Estado para obter vantagens que não atendem ao interesse público. Quando necessário, ocorrem deliberações secretas.
Em Nova York, ao passar a chamar a Máfia sículo-americana de Cosa Nostra, o superboss Lucky Luciano acabou traído pelo subconsciente. Na verdade, não se tratava, como asseverou em célebre reunião de “negócios”, de transformar a organização num reduto privê. A meta era o Estado virar coisa deles (cosa di loro), com políticos, magistrados, policiais e agentes da autoridade sendo cooptados, subornados e desfrutados: existia até a “bancada” da Cosa Nostra no Parlamento e na Justiça.
No Brasil, o Legislativo Federal transformou-se numa cosa para poucos privilegiados. E os parasitas de colarinho-branco brilham nas conquistas de verbas orçamentárias, privatizações, terceirizações, concessões, parcerias, acessos a fundos de pensão e quejandos. Totò Riina, então chefe dos chefes da Máfia, ficaria orgulhoso em saber como os métodos da sua secular societas criminis difundiram-se pelo Brasil. Talvez até montasse um instituto de ensino a distância, em Brasília, em terreno doado oficialmente e com grana para a construção de uma sede a fundo perdido, para especializar os picciotti di mafie com exame de cases atraentes. A propósito, Daniel Dantas poderia voltar a lecionar e trocar experiências com os alunos.
O movimento social italiano de contraste à criminalidade organizada data de mais de um século, como ensina Umberto Santino na obra Storia del Movimento Antimafia. E logrou-se descobrir a sólida correlação entre Máfia e política partidária.
O exemplo mais contundente foi o de Giulio Andreotti, sete vezes primeiro-ministro e definitivamente condenado por ter se associado à Máfia: beneficiou-se da prescrição. No ano passado, o ex-governador da Sicília Totò Cuffaro renunciou depois de condenado por favorecer a Máfia em concorrências públicas. Quanto ao europarlamentar Salvo Lima, braço direito de Andreotti, na Sicília, a própria Máfia resolveu aplicar a pena de morte. Ele foi considerado um paraculo, ou seja, pessoa que só pensa nela em termos de vantagens.
Nesta semana, o premier Silvio Berlusconi teve o nome mencionado em um processo da Máfia, em que figura como réu o senador siciliano Marcello Dell´Utri. Condenado, Dell´Utri, que fundou com o amigo Berlusconi o movimento político Forza Italia, recorreu da sentença de nove anos de reclusão por ser mafioso. Os juízes da Corte de Apelação decidiram ouvir a testemunha chamada Massimo, filho do falecido capo-mafia Vito Ciancimino, que foi prefeito de Palermo.
Quando ainda era prefeito e foi recolhido ao cárcere Ucciardone de Palermo, Ciancimino recebeu uma carta de Bernardo Provenzano, que dividia com Totò Riina o governo da Máfia. Para repasse a Ciancimino, a carta foi entregue a Massimo por Pino Lipari, à época “ministro das finanças” da Máfia e, hoje, colaborador da Justiça.
Aos juízes da Corte de Apelação, disse Massimo tratar-se de carta a avisar sobre próximos sequestrados e execução do filho de um político, em represália por traição à Máfia. Massimo recebeu a informação do pai de que o político era Silvio Berlusconi. Graças à interferência de Ciancimino, a ordem de Provenzano restou revogada: a carta será periciada na próxima semana.
Como se percebe, os políticos passam por maus momentos também fora do Brasil. Nos EUA, a indignação do momento refere-se ao ex-vice-presidente Dick Cheney, executor da política de terrorismo de Estado durante o governo Bush. Cheney proibiu a Agência Central de Inteligência (CIA) de comunicar ao Congresso, segundo determinava a lei, o projeto governamental voltado a secretamente matar e torturar terroristas.
Para Cheney, como bem sabem Sarney e Calheiros, as investigações sempre acabam dilatadas. Por exemplo, pode-se apurar, também, o desaparecimento de 190 mil fuzis destinados, pelo governo Bush, às novas forças do Iraque. Em 2004, a empresa KRB, pertencente ao Grupo Halliburton, de Dick Cheney, deixou de entregar ao governo do Iraque as armas pagas pelo governo americano, dadas como desaparecidas. Frise-se: a empresa de Cheney recebeu pela compra, comprometeu-se com o envio e não devolveu o numerário pela falta de entrega no destino. Sabe-se, apenas, que os fuzis não foram enviados para exposição no Convento das Mercês, sob patrocínio da Petrobras.
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