sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Debate: Plínio aparece, Dilma se supera e Serra vê trunfo escapar


O primeiro debate entre os candidatos às eleições presidenciais de 2010, ocorrido na noite desta quinta-feira (5) na TV Bandeirantes, confirmou um prognóstico feito pelo presidente Lula: o de que a oposição perderia seu último trunfo ao apostar num desempenho ruim da candidata petista Dilma Rousseff. Ao contrário do que previam a oposição e setores da mídia, Dilma, apesar do nervosismo típico de estreante, foi bem, e, assim, ajudou a desmontar mais uma lenda criada pelos oposicionistas.

Antes da campanha começar, os adversários da ex-ministra espalhavam, sobretudo em blogs na internet, que Serra iria “estralhaçar” Dilma nos debates. Definitivamente, o tucano não chegou nem perto desse objetivo.

Baixa audiência

O debate da Band é o primeiro de uma série de quatro eventos do mesmo gênero que devem ocorrer na TV aberta. Os outros três debates do primeiro turno devem ser os da RedeTV (12 de setembro), Record (28 de agosto) e Globo (30 de agosto).

Concorrendo com a semifinal da Copa Libertadores, o debate da Bandeirantes patinou na audiência. Durante as mais de duas horas de transmissão do confronto entre os candidatos, a emissora alcançou, no máximo, 5,5 pontos de audiência, empatando em quarto lugar com a Rede TV!. Na média, a audiência do debate ficou bem abaixo disso: 1,8 a 1,9 pontos. A Globo, que transmitiu o jogo entre São Paulo e Inter teve uma média de 36,9 pontos. A média da Record foi de 7,4, segundo levantamento Ibope. Os números consolidados devem ser divulgados na manhã de hoje.

O debate foi mediado pelo jornalista Ricardo Boechat. No total, 210 jornalistas compareceram para cobrir o evento, que também foi transmitido ao vivo pela Rádio Bandeirantes e teve cobertura online em vários portais e redes sociais.

Acompanharam os presidenciáveis no primeiro debate: Indio da Costa (DEM), candidato a vice na chapa de José Serra, Michel Temer (PMDB), vice de Dilma Rousseff, Guilherme Leal (PV), vice de Marina Silva, José Eduardo Dutra, presidente nacional do PT, Sérgio Guerra, presidente do PSDB; a primeira-dama Marisa Letícia, esposa do presidente Lula; os candidatos paulistas Geraldo Alckmin, Aloísio Mercadante, Aloysio Nunes, Orestes Quércia, Netinho de Paula, Marta Suplicy, e o prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, entre outros.

Oportunidade perdida para Serra

Serra entrou no debate com a missão de vencer e comprovar que sua "experiência" faria a diferença. Mas não deu muito certo. Pelo contrário, o tucano mostrou-se perdido em vários momentos, fugiu de polêmicas, não teve coragem de repetir os ataques à sua principal adversária como vinha fazendo dias antes e mostrou menos “conteúdo” do que seus aliados esperavam. A comprovação de que as coisas não foram muito felizes para a oposição pode ser medida pela reação do marqueteiro de Serra, Luiz Gonzalez, que saiu dos estúdios da Band com cara de poucos amigos.

Por mais que seus apoiadores entupam a internet com “avaliações” que tentam desqualificar a oratória de Dilma e enaltecer o “preparo” de Serra, foi o tucano quem protagonizou mais momentos constrangedores durante o debate. Por duas vezes, Serra teve que pedir que repetissem a pergunta para ele, pois não estava prestando atenção. Ficou circulando de um lado para outro (as câmeras não mostraram, mas na internet a informação foi muito enfatizada), esqueceu o que estava dizendo em dois momentos e ao elencar três órgãos do corpo humano que representariam os temas educação, saúde e segurança, escolheu o “intestino” para representar um deles.

Tanto Dilma quanto Serra extrapolaram no tempo de algumas respostas e tiveram o áudio de seus microfones cortados.

Treinamentos melhoraram desempenho de Dilma

Elegante, com uma blusa branca rendada, Dilma chegou sorridente aos estúdios da Band e saiu um pouco apreensiva, mas revelando confiança no próprio desempenho.

A candidata petista entrou no primeiro debate eleitoral de sua vida sem o compromisso de “vencer” o confronto. O comando da campanha esperava dela, apenas, que não cometesse erros graves. E ela cumpriu este objetivo. Não brilhou, como gostariam alguns de seus apoiadores. Atrapalhou-se em algumas respostas, mas certamente saiu do debate maior do que entrou.

Dilma dedicou-se, nos últimos dias, a se preparar para o evento. Revisou informações e números do governo, teve aulas de oratória e, com isso, conseguiu superar sua conhecida dificuldade de falar em público. Quem já teve a oportunidade de ver a performance sofrível de Dilma em eventos públicos pré-campanha sabe que no debate desta quinta-feira a ex-ministra se superou e melhorou bastante. Apesar do nervosismo visível, não deixou pergunta sem resposta, apresentou dados concretos, foi feliz na defesa das conquistas do governo Lula e na demonstração de que continuará sua obra. Transmitiu confiança na determinação de combater a pobreza e fomentar o progresso do Brasil. E, o mais importante, soube explorar bandeiras e temas que são do interesse da maioria dos brasileiros como emprego, direitos sociais, Luz para Todos, defesa do SUS, agricultura familiar.

Nas declarações finais, Dilma fez um discurso bem construído, enfático e levemente emocional, como recomendam os especialistas em marketing político. Lembrou de mencionar o protagonismo das mulheres na política e enalteceu as mudanças promovidas pelo governo Lula.

Plínio acende, Marina apaga

Os outros participantes do debate, Plínio de Arruda Sampaio (PSOL) e Marina Silva (PV) cumpriram o papel que parece estar destinado a eles nestas eleições: o de coadjuvantes numa disputa plebiscitária entre o campo progressista representado por Dilma e pelo atual governo e o campo da direita, representado por Serra e pela aliança demo-tucana que governou o país durante os dois mandatos de FHC.

Sem ter nada a perder, o candidato do PSOL soltou-se. Logo no início, questionou o isolamento que a mídia promove contra os candidatos de pequenos partidos. Com uma postura despojada e tiradas irônicas, Plínio conseguiu aparecer, agradou ao público jovem que acompanhava o debate pela internet e seu nome acabou alçado ao Trending Topics do Twitter. Plínio foi responsável pelos poucos momentos divertidos do debate, como quando chamou Marina de “ecocapitalista” e José Serra de “hipocondríaco”. Mas se o despojamento trazido por Plínio neste primeiro debate soou como novidade e trouxe alguma graça ao tom morno do encontro, não se pode garantir que nos próximos debates, esta postura continuará agradando. Ela não será mais novidade e se exagerar no tom seu comportamento pode acabar sendo interpretado como grosseiro e arrogante, traços de personalidade que os eleitores rejeitam fortemente. Seja como for, o radicalismo de sua plataforma de governo deve barrar qualquer chance do candidato do PSOL deslanchar nas pesquisas ou mesmo alcançar o patamar conquistado por Heloisa Helena em 2006.

Marina Silva, por sua vez, manteve uma postura acanhada, conciliadora demais –tentando agradar governo e oposição-- o que não permitiu que ela se destacasse no debate. Em alguns momentos, a candidata do PV serviu apenas de ponte para uma tabelinha amistosa com Dilma e Serra e, para surpresa de muitos, Marina acabou travando embate mais ríspido com Plínio, do PSOL, partido que, no início da corrida eleitoral cogitou apoiar a senadora acriana.

Utilizando um discurso muito protocolar, cansativo, e abordando temas de pouco interesse geral, a ex-ministra do Meio Ambiente não empolgou e caso mantenha essa toada será muito difícil para ela alcançar o objetivo de se transformar numa “terceira via” competitiva nestas eleições.

Grandes temas ficaram de fora

A primeira pergunta feita aos candidatos envolvia temas sugeridos pelos eleitores através da internet e versava sobre educação, saúde e segurança. Acabaram sendo os temas principais de todo o debate. Outros pontos agregados a estes e que ganharam algum destaque foram emprego, desenvolvimento industrial e reforma agrária.

“Foi um debate morno que versou sobre temas corriqueiros. As regras engessadas não favoreciam a luta de ideias. Parecia um debate de candidatos a prefeitos. As grandes questões nacionais não apareceram, não houve polêmicas sobre as questões de fundo da sociedade brasileira, não ficaram nitidamente demarcadas as ideais-força da campanha”, opinou José Reinaldo Carvalho, secretário nacional de Comunicação do PCdoB, após o debate.

SUS x mutirões / APAE x professores / Latifúndio x agricultura familiar

O que mais se aproximou de uma grande polêmica durante o debate foi a discussão travada entre Serra e Dilma a respeito da saúde. Enquanto Dilma reafirmou diversas vezes que irá fortalecer o SUS –bandeira primordial do movimento de Saúde—Serra ficou insistindo na questão dos mutirões de saúde.

O tucano também insistiu bastante no suposto abandono das Apaes pelo governo federal, um tema de interesse restrito. Dilma rebateu o argumento do tucano e ao falar de educação deu ênfase à necessidade de investir nos professores, abrangendo um público bem mais amplo.

A petista também conseguiu encostar o adversário na parede ao tratar da geração de empregos. Mas Dilma perdeu uma ótima oportunidade de desancar Serra quando surgiram no debate os temas privatizações e o legado de FHC. Neste quesito, Serra conseguiu tirar uma casquinha dolorida da campanha adversária ao lembrar que o petista Antonio Palocci, quando foi ministro da Fazenda, “não se cansava de elogiar a política econômica do governo Fernando Henrique”.

Por outro lado, o tucano se embananou ao responder sobre indústria naval e o programa Luz para Todos. Dilma incluiu estes dois assuntos no debate numa tentativa de arrancar de Serra a admissão de que o governo Lula avançou nestes temas. E conseguiu.

Dilma também conseguiu responder bem ao candidato do PSOL e a Serra quando enfatizou a importância da agricultura familiar ao abordar o tema da reforma agrária. Mas, por outro lado, não foi muito feliz ao responder as acusações de Serra sobre aparelhamento do governo e crise nos Correios. A petista poderia, neste momento, ter sido mais objetiva, mais incisiva e mostrar a hipocrisia dos tucanos que nunca deixaram de aparelhar as estruturas governamentais que administraram, além de terem sucateado empresas estratégicas para depois privatizá-las.

Nesta sexta-feira (6), haverá ampla repercussão do debate, com cada opinante tentando puxar a sardinha pro lado de seu candidato. Mas numa avaliação todos terão que concordar: Dilma revelou que não é o poste que a mídia e a oposição pintavam e Serra perdeu a oportunidade de se mostrar como “o mais preparado”.

Além disso, a partir de agora, cai por terra a acusação recorrente de que a candidata de Lula foge do debate. Dilma não fugiu deste, saiu maior do que entrou no primeiro confronto e espera-se que nos próximos debates os temas de maior relevância e polêmica deixem claro para os brasileiros quem é a representante do avanço e quem representa o atraso.

Da redação Vermelho, Cláudio Gonzalez

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