A OAB força decisão sobre o cumprimento do parecer da Corte Interamericana relativo à Lei da Anistia
O Brasil terá de apresentar um relatório sobre a decisão da Corte Interamericana em dezembro.
Recentemente, o governo brasileiro, alinhado com o governo dos Estados Unidos, apoiou a apuração da violação dos direitos humanos no Irã. Essa decisão, chancelada pela ONU, deixa o País sem condições legais de recusar obediência às decisões daquela corte de Justiça em relação às violações aos direitos humanos ocorridas na ditadura.
Ao dar o voto de desempate no caso da Lei da Ficha Limpa, o ministro Luiz Fux já tinha sobre a mesa a petição da Ordem dos Advogados do Brasil, assinada pelo advogado Fábio Konder Comparato, datada de 21 de março, na qual é solicitada ao Supremo Tribunal Federal uma definição expressa quanto ao dever de o Brasil cumprir ou não a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos quanto ao parecer sobre a Lei da Anistia.
Fux tornou-se o relator dos embargos em torno dessa lei em razão de ser herdeiro dos processos do ministro Eros Grau.
Na prática, apoiado em argumentos jurídicos, Comparato encurralou o STF. O Estado brasileiro, no exercício de sua soberania internacional, aderiu à Convenção Americana de Direitos Humanos em 1992. Em 1998, aceitou a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O STF terá condições de desconhecer isso?
Caso isso ocorra, em razão de histórica tradição de indisciplina nesse campo, esse aprazível país tropical vai se tornar um Estado fora da lei no plano internacional.
Quem pensa que a referência é brincadeira deve ter-se esquecido que, no século XIX, em 1845 precisamente, para forçar o fim da escravidão, a Inglaterra, mesmo que movida para a modernidade por interesses econômicos, decidiu, com o poder arbitrário de grande potência que era, proibir o tráfico entre a África e a América. O Brasil ficou cinco anos ludibriando a decisão. Enfim, em 1850, promulgou a Lei Eusébio de Queiroz, que proibia o tráfico negreiro.
Agora, no século XXI, exatamente em novembro de 2010, sob a proteção de decisões democráticas apoiadas nas convenções internacionais, a Corte Interamericana, julgando o caso da Guerrilha do Araguaia, decidiu por unanimidade pela “incompatibilidade das anistias, relativas a graves violações de direitos humanos, com o Direito Internacional”. Ou seja, a Lei da Anistia, aprovada em 1979, “afetou o dever internacional do Estado de investigar e punir (…) ao impedir que os familiares das vítimas”, naquele caso, “fossem ouvidos por um juiz”.
Mas não foi só isso. Nesse caso, o prontuário do Brasil, guardadas as diferenças, é tão sujo quanto o do traficante Fernandinho Beira-Mar. Ou, talvez, ainda mais sujo.
O Brasil violou “o direito à proteção judicial” adotado pela Convenção de 1992 e, ainda, descumpriu a obrigação de adequar seu direito interno, consagrado no artigo 2 da Convenção, conforme aponta a petição da OAB.
A conclusão é destacada na petição: a Lei de Anistia, que impede a investigação de graves violações de direitos humanos, carece de efeitos jurídicos e, em consequência, não pode continuar a representar um obstáculo para isso ou mesmo “para a identificação e punição dos responsáveis”.
O Brasil terá de apresentar um relatório sobre a decisão da Corte Interamericana em dezembro.
Recentemente, o governo brasileiro, alinhado com o governo dos Estados Unidos, apoiou a apuração da violação dos direitos humanos no Irã. Essa decisão, chancelada pela ONU, deixa o País sem condições legais de recusar obediência às decisões daquela corte de Justiça em relação às violações aos direitos humanos ocorridas na ditadura.
Nesse tabuleiro, teria Dilma executado o movimento certo no momento exato ao apoiar a apuração internacional da violações ocorridas no Irã?
Mauricio Dias
Maurício Dias é jornalista, editor especial e colunista da edição impressa de CartaCapital. A versão completa de sua coluna é publicada semanalmente.
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