sexta-feira, 16 de março de 2012

Discurso eleitoral e prática de governo


É preciso denunciar sempre a hipocrisia tucana e cobrar coerência entre seus discursos e suas práticas. A movimentação das últimas semanas serviu para derrubar a máscara de Serra
Nem foi dada a largada ainda para a disputa eleitoral deste ano e já podemos identificar as primeiras contradições entre o discurso de campanha e as práticas de governo. Refiro-me ao lugar comum que viraram as recentes manifestações do ex-governador de São Paulo e provável candidato do PSDB à Prefeitura da capital, José Serra, que sempre se refere às composições dos governos do PT como “loteamento de cargos políticos”.


A movimentação das últimas semanas no campo tucano, contudo, serviu para derrubar a máscara de Serra. Levantamento do jornal O Estado de S.Paulo, a partir do portal oficial De Olho nas Contas, detalha “quem é quem” nos conselhos de administração das oito empresas da Prefeitura de São Paulo. São elas: CET, Cohab, Prodam, SPObras, SPP, SPTrans, SPTuris e SPUrbanismo.


Ficamos sabendo que essas empresas se tornaram o destino de inúmeros políticos e aliados do prefeito Gilberto Kassab (PSD), afilhado político de Serra, que recebem jetons de R$ 6.000 por participar de uma reunião mensal. Segundo o jornal, “pelo menos 60% dos 57 conselheiros são filiados ou têm ligação com algum partido”. Ao todo, os jetons custam R$ 2,3 milhões anuais aos cofres do município de São Paulo.


Há ainda um elemento marcante: a maioria das siglas contempladas com indicações para os conselhos dessas empresas está da base de apoio de Kassab —ou, então, são legendas que têm sido procuradas pelo prefeito para integrar a aliança em torno da candidatura Serra.


Entre os conselheiros paulistanos, constam ex-secretários de Serra na Prefeitura e ex-assessores dele no Ministério da Saúde. Mas o que parece mais grave é a escolha de nomes de outros Estados nos quais o prefeito de São Paulo e fundador do PSD costura suas alianças —talvez o maior exemplo seja o deputado federal Roberto Freire (PPS-SP), que foi indicado para ser conselheiro da SPTuris e da SPTrans quando ainda residia em Pernambuco, seu Estado natal. O mesmo acontece com Raul Jungmann, candidato derrotado ao Senado por Pernambuco na eleição de 2010.


Ou seja, o discurso de loteamento político que Serra gosta de usar contra o PT é apenas peça de campanha eleitoral, pois a realidade dos governos nos quais tem participação é oposta ao sentido de suas críticas.


Essa contradição é alimentada ainda pela disputa entre Kassab e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), que promovem um verdadeiro “um concurso de vices”. Kassab chegou a sinalizar a exoneração de cinco secretários municipais para colocar os cargos à disposição de Serra.


É preciso denunciar sempre a hipocrisia tucana e cobrar coerência entre seus discursos e suas práticas. Há muito chão pela frente até a eleição do novo prefeito de São Paulo. Mas a campanha será o momento ideal para desmascarar essas —e outras!— contradições tucanas.


José Dirceu, 66, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

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