A etapa do julgamento do mensalão mais aguardada pelos inimigos do PT, do
ex-presidente Lula e, sobretudo, de José Dirceu chegou na última sexta-feira. A
leitura da acusação contra os réus pelo Procurador Geral da República, Roberto
Gurgel, no Plenário do Supremo Tribunal Federal,
porém, não trouxe novidades e, para especialistas, foi decepcionante.
O caráter político-partidário da denúncia do PGR traduziu-se por frases de
efeito em que foram acusados “o governo Lula” e “o PT”. Falou-se em quadrilha,
falou-se em provas “inquestionáveis”, mas a leitura fria da acusação revela,
apenas, inferências e suposições baseadas em exercício de uma lógica canhestra
de que seria “verossímil” a culpa de Dirceu.
Gurgel citou fatos que são de amplo conhecimento público desde a eclosão do
escândalo. Novidade que é boa, prova que é boa, nadica de nada.
A descrição de quanto e de quem sacou dinheiro
no Banco Rural, apesar de apresentada como novidade, está na acusação do MPF
desde o início. A ligação cronológica de alguns saques com votações no
Congresso, é escassa. Na maioria dos casos de saques não houve coincidência com
votações e, nesses casos, Gurgel diz que “os mensaleiros romperam o acordo”.
Mas o mais grave na atuação da Procuradoria é a tentativa de condenar Dirceu
sem provas materiais de qualquer espécie e, o que é pior, admitindo essa falta
de provas. Em lugar do que não dispõe – e agora vem a parte mais absurda desse
processo kafkiano –, Gurgel usa depoimentos de réus do inquérito que se tornaram
inimigos políticos de Dirceu e que têm interesse em sua condenação.
Sobre as provas que sustentam a acusação contra Dirceu, Gurgel declarou que
“Não há como negar que, em regra, o autor intelectual nos chamados crimes
organizados age entre quatro paredes, em conversas restritas” porque “O autor
intelectual, quase sempre, não fala ao telefone, não envia mensagens
eletrônicas, não assina documentos, não movimenta dinheiro por suas contas”
É nesse ponto que Gurgel tenta encaixar um absurdo jurídico, o uso de
testemunhas suspeitas como “prova” da autoria do crime. Assevera que a prova que
tem “Não é extraída de documentos ou de perícias, mas essencialmente da prova
testemunhal, que tem, é claro, o mesmo valor probante das demais provas”.
Epa! Como assim? Qualquer testemunho tem “o mesmo valor probante” que provas
técnicas e materiais? Ainda durante a tarde de sexta-feira passada o Blog
consultou jurista que prefere não se expor nesse caso e o que ouviu dele foi o
seguinte: “Prova unicamente testemunhal só tem peso quando é produzida por
testemunha acima de qualquer suspeita”.
Se assim for, a denúncia de Gurgel é inepta. Ao afirmar que a prova que
instrui os autos da AP 470 é contundente quanto à atuação de José Dirceu como
líder do grupo criminoso, o PGR ressaltou que Marcos Valério “confirmou que José
Dirceu sabia das operações” e usa acusações dele contra Dirceu. Ou seja, Valério
mente em tudo. Menos sobre Dirceu…
Além de Valério, a acusação citou Roberto Jefferson e seu correligionário de
partido Emerson Palmieri, ex-presidente e ex-primeiro-secretário do PTB, e
Valdemar da Costa Neto, que, à época, presidia o Partido Liberal (PL).
Não é preciso dizer a ninguém que essas “testemunhas” não têm credibilidade
alguma, mas têm, sim, interesses pessoais no desfecho do processo. E por mais
que o partidarizado Gurgel queira transformar testemunhos suspeitos em “provas”,
em uma Corte como o STF não se imagina que acusações sem credibilidade serão
levadas em conta.
Claro que a mídia carnavalizou as frases de efeito e insultantes proferidas
por Gurgel contra um partido político inteiro, mas já se nota que não houve
maior entusiasmo com o desempenho
da acusação sobretudo no que diz respeito a José Dirceu. Esperava-se que
surgisse alguma carta na manga, mas não surgiu.
O que a acusação propõe é um julgamento político do PT, do governo Lula, do
próprio ex-presidente e de Dirceu, mas esse julgamento já ocorreu e os alvos
foram absolvidos. O julgamento político dessas instituições e pessoas ocorreu
nas eleições de 2006 e pesquisa Sensus divulgada no mesmo dia da leitura da
acusação de Gurgel referendou o veredicto.
Se as eleições de 2014 fossem hoje, o ex-presidente Lula, de acordo com o
instituto Sensus, seria eleito com nada mais, nada menos do que 70% dos votos.
Além da popularidade de Lula, a do governo Dilma Rousseff disparou ao mesmo
tempo em que a mídia passou a ressuscitar o mensalão – pesquisa e eclosão do
mensalão no noticiário ocorreram simultaneamente.
No STF, porém, não cabem julgamentos políticos. Sob as “provas” que
apresentou Gurgel ao menos contra José Dirceu, a condenação é impossível. Contra
os outros réus mais eminentes ainda há alguma materialidade a ser discutida, mas
contra o ex-ministro-chefe da Casa Civil não existe absolutamente nada além de
suposições e declarações suspeitas.
Na semana que entra, começa no STF o que a população jamais conheceu por ação
– ou inação – da mídia: a exposição da versão dos acusados. No caso da denúncia
contra Dirceu, sua defesa tem como fazer picadinho da peça de Gurgel. Com
efeito, o momento mais favorável aos acusadores já ocorreu e, apesar do clima
criado pela mídia, foi um fiasco.
Eduardo Guimarães, Blog da Cidadania
Eduardo Guimarães, Blog da Cidadania
3 comentários:
A atuação de Gurgel na denuncia do "mensalão" é tão hilarante que lembra o populacho se mijando de rir da acusação contra Thomas Morus no tribunal Inglês, enquanto este se defendia da acusacoes de traição ao Henrique VIII por não ter referendado o divorcio do rei da sua 1ª mulher para casar-se com Ana Bolena. Pura fumaca.
Que seja feita justiça,que os julgadores julguem com serenidade e não politicamente.
Esperemos que o STF não condene ninguém sem provas, pois se isso acontecer podera abalar a democracia.
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