segunda-feira, 15 de setembro de 2008

O PAÍS DA IMPUNIDADE

Segunda, 15 de setembro de 2008,

Juiz: "Não há Estado policial. Vivemos impunidade"

A Operação Satiagraha, da Polícia Federal, teve um dos seus rasgos mais profundos no poder Judiciário. A começar pela soltura do banqueiro Daniel Dantas, bancada pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes, as investigações abriram crises sucessivas entre magistrados e ministros.

Com a revelação de grampos contra Mendes, o debate jurídico passou a questionar os limites do uso de interceptações telefônicas para desbaratar organizações criminosas. Ânimos acirrados, os juízes se organizam na contra-corrente, destacando a importância dos grampos legais no combate a quadrilhas complexas.

O juiz federal Sérgio Fernando Moro, da vara especializada no combate à lavagem de dinheiro, em Curitiba, integra o coro dos que questionam a existência de um "Estado policial" no Brasil (tese fermentada após as prisões de Daniel Dantas, do especulador Naji Nahas e do ex-prefeito Celso Pitta). Para ele, a Operação Satiagraha foi a "gota d'água" no processo de intimidação dos juízes brasileiros.

- Nós ainda somos o país da impunidade mais do que qualquer outra coisa. Nesse contexto de grande impunidade, especialmente em relação à criminalidade grave e ao crime complexo, organizado, de colarinho branco, me parece assim sem base empírica afirmações no sentido de que vivemos num Estado policialesco - diz Moro, em entrevista a Terra Magazine.

O magistrado destaca a importância de interceptações legais e não desaprova a criação de uma central de registro de escutas no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), mas vê riscos para o sigilo de investigações.

- A única preocupação é o que vai se fazer com isso depois. Se o CNJ ou as corregedorias vão ter a sensibilidade necessária pra identificar quando é uma situação de abuso ou uma situação de uso normal do instrumento.

Confira a íntegra da entrevista.

Terra Magazine - Como o senhor situa o que chama de intimidação dos magistrados?
Sérgio Fernando Moro - Acho que houve um avanço de uns dez anos pra cá, em relação ao combate à impunidade. Houve uma melhora, ainda distante da situação satisfatória. No momento, parece que nós vemos um contexto de reação a essa melhora. Por conta de certas afirmações, muitas vezes se depreende uma intimidação contra os juízes.

Isso se inicia com as investigações da Operação Satiagraha?
Eu acho que aí talvez tenho sido uma gota d´água, quando isso acabou surgindo de uma maneira mais forte. Não apontaria esse como o único motivo de ter surgido esse contexto.

Mas o senhor receia restrições a processos investigatórios já estabelecidos?
O que a gente tem hoje é uma criminalidade complexa, dependemos de métodos de investigações especiais - dentre eles, as interceptações telefônicas. Muitas vezes a interceptação, como é no Brasil e no mundo inteiro, tem que ser de longa duração. Agora já se fala em restringir isso em restrições no Congresso, por 30 ou 60 dias. Aí, sinceramente, é melhor revogar o instrumento de uma vez. Melhor do que ter uma figura decorativa, dizendo que tem, mas que na prática você não pode usar, porque o prazo é extremamente curto.

Como senhor avalia a criação da central de escutas no CNJ (Conselho Nacional de Justiça)? É válido ou entra nesse contexto de intimidação?
Olha, fazendo justiça ao CNJ, a resolução que saiu se limitou, num primeiro momento, a colher os dados estatísticos, os números de interceptações decretadas. Quanto a isso, acho que não existe nenhum problema. Nenhum juiz tem nada a esconder quanto ao número de interceptações que ele decreta ou o número de terminais interceptados. A única preocupação é o que vai se fazer com isso depois. Se o CNJ ou as corregedorias vão ter a sensibilidade necessária pra identificar quando é uma situação de abuso ou uma situação de uso normal do instrumento.

Há uma confusão, nesse debate, entre escutas legais e ilegais?
Houve esse episódio que envolve a escuta ilegal do ministro Gilmar Mendes, e registro aqui minha solidariedade ao ministro, é uma coisa realmente grave, mas isso não serve de argumento nenhum com relação ao exercício legítimo e legal desse instrumento de investigação.

A percepção de que está se formando um "Estado policial" vem do fato de o combate ao crime ter subido de patamar?
Diria o seguinte: existe uma falta de tratamento crítico de várias afirmações. Há pouco tempo, revistas e jornais diziam que a gente vivia no país da impunidade. Por outro lado, agora dizem que estamos vivendo num Estado policial. Me sinto uma pessoa que dormiu 20 anos e acordou num país totalmente diferente.
Mudou assim estatisticamente ou empiricamente?
Nada. Nós ainda somos o país da impunidade mais do que qualquer outra coisa. Nesse contexto de grande impunidade, especialmente em relação à criminalidade grave e ao crime complexo, organizado, de colarinho branco, me parece assim sem base empírica afirmações no sentido de que vivemos num Estado policialesco. Claro, você pega um caso lamentável de abuso, seja de um particular ou de uma autoridade pública, que merece repressão, que esse abuso seja coibido. Mas daí a chegar em afirmações de que estamos num Estado totalitário, nazista, ou que as autoridades são fascistas, existe uma distância muito grande.

O que acha da criação de varas especiais para coibir abusos de autoridades? Está correto?
Causa um certa preocupação o fato de que foi encaminhado um projeto de lei pra modificar o crime de abuso de autoridade. Esse projeto contém tipos penais, crimes bastante abrangentes. Coisas assim: constitui crime qualquer ato atentatório ao princípio da razoável duração do processo. O que isso significa? Que vai ser crime um juiz não poder despachar um processo? Então, isso é preocupante. Em si, não teria nada contra varas de abuso de autoridade. Mas dentro desse contexto de aparente perseguição, de intimidação, eu acho temerário.

Terra Magazine.



Concordo com o magistrado.



De há muito tempo o brasileiro já vinha sentido essa sensação de impunidade, isso se acentuou depois da libertação do trambiqueiro Daniel Dantas.A soltura deste bandido foi um coice no estômago da sociedade brasileira.




Agora liberou geral. Todo tipo de crime é permitido, desde que, por óbvio, cometido por bandido rico.



Ninguém acredita mais no Poder Judiciário, principalmente no STF.

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