domingo, 21 de setembro de 2008

UMA ÓTIMA IDÉIA


Governo joga com o tempo para definir o pré-sal

Estratégia é fortalecer a Petrobrás, num primeiro momento, e depois entrar em campo com nova estatal

Sérgio Gobetti

O governo quer ganhar tempo e se preparar melhor para enfrentar os desafios que vieram à tona com a perspectiva de exploração do pré-sal. Só agora o governo começa a ter uma avaliação mais realista quanto aos impactos sobre a macroeconomia, as finanças públicas e a geopolítica comercial do País. Apesar de os discursos do presidente Lula exibirem euforia com as descobertas, nos bastidores, os técnicos revelam uma crescente preocupação com os obstáculos a superar para usar de forma adequada esse "bilhete premiado"."Há um problema de timing fundamental. Se apressarmos, podemos perder oportunidades.
As escolhas de investimento devem ser repensadas e tudo isso demanda tempo", diz o economista Antônio Barros de Castro, assessor da presidência do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social ( BNDES).Embora Castro se refira à política industrial e aos efeitos macroeconômicos indesejáveis que atingem economias petrolíferas, como as pressões cambiais e inflacionárias, o mesmo tipo de raciocínio se aplica a outras políticas. A definição do marco regulatório e do ritmo das futuras concessões de campos petrolíferos depende, por exemplo, da capacidade do governo de manter sob seu controle direto ou da Petrobrás a maior parte das reservas, como pretende Lula.
Se novas licitações de blocos em mar fossem abertas agora, os técnicos acreditam que haveria um grande risco de a Petrobrás perder a hegemonia operacional que detém hoje na exploração, superior a 80%. "As multinacionais estão altamente capitalizadas e, para disputar com elas, a Petrobrás teria de atrasar outros investimentos", afirma o senador Aloizio Mercadante (PT-SP).Por outro lado, se o governo decidisse aplicar de imediato o modelo norueguês, em que o Estado é sócio direto das empresas privadas nas plataformas, também precisaria investir um capital que não dispõe hoje. Por isso, entre as alternativas analisadas pela comissão interministerial, ganha corpo a idéia de adotar uma estratégia mista, e "em dois tempos".
UM SONHO?
Em um primeiro momento, o governo atuaria para tonificar a musculatura financeira da Petrobrás, capitalizando a empresa e concedendo-lhe o direito de explorar as áreas não licitadas no espaço entre os blocos de Tupi, Iara, Guará e Carioquinha, na Bacia de Santos. Em troca, o governo receberia mais dividendos da estatal e recolheria mais tributos, o que o capacitaria, numa segunda fase, a assumir o papel de investidor nos campos do pré-sal, em parceria com a própria Petrobrás e outras multinacionais.Em tese, o governo não precisa abandonar o regime de concessões para executar esse plano. Na Noruega, por exemplo, a concessão ao setor privado coexiste com a participação direta do Estado como sócio nas plataformas, por meio de uma empresa administradora, a Petoro. As concessões são feitas apenas depois de o governo definir qual fatia manterá sob seu controle direto.
Para fazer isso no Brasil, entretanto, a Lei do Petróleo precisa ser modificada, pois ela não prevê essa alternativa.A maior dificuldade para colocar a estratégia completa em ação tem a ver com a primeira parte do plano: a capitalização da Petrobrás. Como dar ao governo mais ações na empresa em troca de um valor hipotético das reservas ainda inexploradas? O governo não tem hoje dimensão de quanto petróleo existe nos campos licitados e muito menos ainda na área não licitada, o que exigirá vários anos de teste.Técnicos consultados pelo Estado consideram a operação de "troca-troca" entre governo e Petrobrás impraticável pelas regras atuais da Bolsa de Valores. "Isso não é uma operação factível, mas um sonho", diz o executivo Ivan Simões Filho, diretor do Instituto Brasileiro do Petróleo e representante da British Petroleum (BP) no Brasil. "Capitalizar envolve aspectos de governança corporativa. Uma capitalização que não seja em dinheiro ou bens tangíveis não é factível."
RITMO DE PERFURAÇÃO
No campo da política industrial, o grande desafio que o governo tem pela frente é aumentar a capacidade de a indústria nacional ofertar as máquinas e equipamentos necessários à expansão do setor petrolífero. Se o ritmo de perfuração do pré-sal for muito veloz, é provável que o volume de importações cresça muito, ainda mais se o real se valorizar com a entrada de dólares de exportação. Nesse caso, o preço do produto nacional encarecerá na comparação com o importado.Uma das alternativas avaliadas é oferecer um certo tipo de preferência ao fornecedor nacional, como feito no início da exploração do petróleo na Noruega. "O perigo da proteção é a acomodação", diz Jorge Camargo, dirigente do IBP e presidente da Statoil Hydro no Brasil, a estatal norueguesa do setor.Segundo ele, o modelo de proteção aplicado na Noruega até 1994 condicionava a preferência ao produtor nacional a certos níveis competitivos de preço, qualidade e prazo de entrega.
Se o real estiver muito valorizado, entretanto, será muito difícil manter um preço competitivo. Por isso, pode se tornar necessário que o governo utilize outros instrumentos - como fundo soberano - para amortecer a valorização cambial.
Fonte:AE.

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