Coisas da Política - Mauro Santayana
Jornal do Brasil - 30/12/2009
O orgulho nacional é sentimento que se funda na consciência da igualdade entre os seres humanos. Quando partimos da ideia de que não somos superiores, assiste-nos a certeza de que tampouco somos inferiores. As vicissitudes históricas, assim como as limitações da natureza, podem fazer-nos conjunturalmente mais pobres ou mais ricos, mas não nos convertem em melhores ou piores.
A imprensa do mundo se tem dedicado aos êxitos conjunturais do Brasil com elogios que nos alegram. O presidente Lula é visto como a Personalidade do Ano pelo conceituado Le Monde, e outras publicações. Chefes de Estado a ele se referem com admiração, não só pelos resultados de sua política interna como também por sua capacidade de convencimento na diplomacia direta que vem exercendo, nestes meses de desafios internacionais.
Esse reconhecimento externo tem tido leituras divergentes em nosso país. Para muitos adversários do governo, trata-se de engodo. A oposição quer mostrar o presidente da República como um parvo, que se deixa dominar pela lisonja. É uma leitura, essa, sim, de néscios. O governo brasileiro tem, nestes anos e meses, afirmado, sem jactâncias, seu direito soberano de opinar nas questões internacionais que lhe dizem respeito, como as do aquecimento global, da paz no Oriente Médio, do comércio internacional e do equilíbrio geopolítico na América Latina. Quanto ao problema da preservação ecológica, nenhum outro país do mundo tem a autoridade de que dispomos para dizer o que pensamos. A História nos fez possuidores da maior biodiversidade tropical do planeta, que soubemos preservar com diplomacia, mas também com imensos sacrifícios humanos, e a cuja soberania não podemos renunciar.
Queremos parceiros no comércio internacional, com vantagens e concessões em rigorosa reciprocidade. Quanto à América Latina, não podemos aceitar a subgerência imperial que alguns nos pretendem impor. Não somos o “cachorro grande” do quarteirão, como certos ex-diplomatas se referem à posição econômica, geográfica e política do Brasil. Somos vizinho privilegiado, com fronteiras pacíficas com quase todos os países da América do Sul e não temos problemas com o resto do Hemisfério.
O embaixador Rubens Barbosa, que, ao se afastar compulsoriamente do Itamaraty, se dedica hoje a assessorar a Fiesp, assinou artigo sobre a Argentina em que trata do declínio do grande vizinho do Sul. Há, em seu texto – ainda que dissimulado em linguagem diplomática – referência à superioridade brasileira, o que não é bom para nós. Temos que entender as circunstâncias da Argentina que, a partir da queda de Hipólito Irigoyen, em 1930, vem passando por dificuldades institucionais, em situação pendular entre o peronismo e seus adversários, agravada com a tragédia dos governos militares, estimulados pelos norte-americanos.
Tanto como o nosso, o povo argentino tem direito à autoestima. Seu sistema educacional, reconhecidamente superior, sua cultura, seu desenvolvimento técnico e científico, são motivos de justo orgulho. Suas dificuldades são políticas, e serão resolvidas com a mobilização da cidadania. Rubens Barbosa diz que a Argentina pode escolher entre ser – diante do Brasil – o Canadá ou o México. É melhor que ela continue sendo a Argentina do Pacto ABC, a Argentina do Mercosul, a Argentina das mães da Praça de Maio, de Borges e Bioy Casares, de Cortazar e Carlos Gardel; a Argentina de San Martin, de Urquiza e de Mitre. E de Evita. O México é outra referência infeliz do embaixador. Seu povo é uma vítima histórica, de Cortez ao presidente Polk, e de Polk a Bush, com o Nafta. Sua tragédia é estar, como dizia Cárdenas, “tan lejos de Dios y tan cerca de Estados Unidos”.
O ministro Nelson Jobim prevê represálias contra o Brasil pelos países preteridos na compra de caças para a FAB. Temos o direito soberano de comprar o que nos interessa e onde nos interessa. Sua excelência, no entanto, disse que “corremos o risco de país grande”. Se ele nos adverte que devemos nos preparar contra isso, é porque tem razão. Mas convém observar que nossa grandeza está dentro das fronteiras nacionais e no convívio amistoso com os outros povos. É esse convívio, sereno, sem ser subalterno, firme, sem ser arrogante, que está sendo reconhecido no mundo inteiro. Dessa postura, que o Itamaraty expressa, não nos devemos afastar.
O orgulho nacional é sentimento que se funda na consciência da igualdade entre os seres humanos. Quando partimos da ideia de que não somos superiores, assiste-nos a certeza de que tampouco somos inferiores. As vicissitudes históricas, assim como as limitações da natureza, podem fazer-nos conjunturalmente mais pobres ou mais ricos, mas não nos convertem em melhores ou piores.
A imprensa do mundo se tem dedicado aos êxitos conjunturais do Brasil com elogios que nos alegram. O presidente Lula é visto como a Personalidade do Ano pelo conceituado Le Monde, e outras publicações. Chefes de Estado a ele se referem com admiração, não só pelos resultados de sua política interna como também por sua capacidade de convencimento na diplomacia direta que vem exercendo, nestes meses de desafios internacionais.
Esse reconhecimento externo tem tido leituras divergentes em nosso país. Para muitos adversários do governo, trata-se de engodo. A oposição quer mostrar o presidente da República como um parvo, que se deixa dominar pela lisonja. É uma leitura, essa, sim, de néscios. O governo brasileiro tem, nestes anos e meses, afirmado, sem jactâncias, seu direito soberano de opinar nas questões internacionais que lhe dizem respeito, como as do aquecimento global, da paz no Oriente Médio, do comércio internacional e do equilíbrio geopolítico na América Latina. Quanto ao problema da preservação ecológica, nenhum outro país do mundo tem a autoridade de que dispomos para dizer o que pensamos. A História nos fez possuidores da maior biodiversidade tropical do planeta, que soubemos preservar com diplomacia, mas também com imensos sacrifícios humanos, e a cuja soberania não podemos renunciar.
Queremos parceiros no comércio internacional, com vantagens e concessões em rigorosa reciprocidade. Quanto à América Latina, não podemos aceitar a subgerência imperial que alguns nos pretendem impor. Não somos o “cachorro grande” do quarteirão, como certos ex-diplomatas se referem à posição econômica, geográfica e política do Brasil. Somos vizinho privilegiado, com fronteiras pacíficas com quase todos os países da América do Sul e não temos problemas com o resto do Hemisfério.
O embaixador Rubens Barbosa, que, ao se afastar compulsoriamente do Itamaraty, se dedica hoje a assessorar a Fiesp, assinou artigo sobre a Argentina em que trata do declínio do grande vizinho do Sul. Há, em seu texto – ainda que dissimulado em linguagem diplomática – referência à superioridade brasileira, o que não é bom para nós. Temos que entender as circunstâncias da Argentina que, a partir da queda de Hipólito Irigoyen, em 1930, vem passando por dificuldades institucionais, em situação pendular entre o peronismo e seus adversários, agravada com a tragédia dos governos militares, estimulados pelos norte-americanos.
Tanto como o nosso, o povo argentino tem direito à autoestima. Seu sistema educacional, reconhecidamente superior, sua cultura, seu desenvolvimento técnico e científico, são motivos de justo orgulho. Suas dificuldades são políticas, e serão resolvidas com a mobilização da cidadania. Rubens Barbosa diz que a Argentina pode escolher entre ser – diante do Brasil – o Canadá ou o México. É melhor que ela continue sendo a Argentina do Pacto ABC, a Argentina do Mercosul, a Argentina das mães da Praça de Maio, de Borges e Bioy Casares, de Cortazar e Carlos Gardel; a Argentina de San Martin, de Urquiza e de Mitre. E de Evita. O México é outra referência infeliz do embaixador. Seu povo é uma vítima histórica, de Cortez ao presidente Polk, e de Polk a Bush, com o Nafta. Sua tragédia é estar, como dizia Cárdenas, “tan lejos de Dios y tan cerca de Estados Unidos”.
O ministro Nelson Jobim prevê represálias contra o Brasil pelos países preteridos na compra de caças para a FAB. Temos o direito soberano de comprar o que nos interessa e onde nos interessa. Sua excelência, no entanto, disse que “corremos o risco de país grande”. Se ele nos adverte que devemos nos preparar contra isso, é porque tem razão. Mas convém observar que nossa grandeza está dentro das fronteiras nacionais e no convívio amistoso com os outros povos. É esse convívio, sereno, sem ser subalterno, firme, sem ser arrogante, que está sendo reconhecido no mundo inteiro. Dessa postura, que o Itamaraty expressa, não nos devemos afastar.
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