quarta-feira, 7 de março de 2012

Política não é profissão



Chico Leite


Procurador de Justiça (licenciado), professor de direito penal e deputado distrital pelo Partido dos Trabalhadores


Em 2003, tão logo assumi meu primeiro mandato de deputado distrital, eu me dispus a renunciar ao décimo quarto e ao décimo quinto salários dos deputados e ao pagamento pelas convocações extraordinárias. Sem alarde, sem proselitismo, sem bandeira, sem divulgação, no Memorando nº 002, naquele 2 de janeiro, simplesmente renunciei a tais benefícios—como obra do debate filosófico que eu fazia na campanha,por considerar que nenhum cargo público de reflexo eleitoral pode ser profissão, e que não se pode, em hipótese alguma, utilizar o voto, a confiança das pessoas, como meio de ascensão financeira.


Fui o primeiro em todo o Brasil a fazer isso. E o fiz porque, há muitos anos, defendo uma tese que, com fé em Deus, um dia vai prosperar entre nós. Aquela de que, como política não é profissão, é representação, não deve haver, para aquele que exerce cargo público eletivo, remuneração específica. Por isso, sempre percebi como promotor de Justiça, cargo que conquistei por concurso público há mais de 23 anos.


Mas há os profissionais da política, aqueles que vivem dela habitualmente. Esses defendem pessoas, não causas, tanto que seus aliados têm sempre razão mesmo que falem em defesa do que eles sempre combateram. Têm uma postura quando é oposição e outra quando situação. Não raro, quando estão no governo, agem da mesma forma que agiam os governantes que eles contestavam.


Não é muito difícil, por exemplo, ouvir quem tanto ajudou o Ministério Público a processar criminosos de colarinho branco—no passado— hoje criticar a instituição porque ela atua da mesma maneira, só que desta vez contra aliados. São circunstancialistas. Estão a serviço, na verdade, de causas próprias, particulares. A política, como meio de sobrevivência ou como instrumento para negócios, é só uma forma de se maquiar para parecer atraente à população de boa-fé.


Pois bem. Agora, nove anos após o início da minha luta pelo fim do 14º e do 15º salários, finalmente a Câmara Legislativa extingue esses benefícios. Uma vitória de toda a sociedade. Mas, no mesmo passo, urdiram uma resolução para obrigar os deputados distritais a receber remuneração da Câmara Legislativa.


Tendo sido o primeiro a renunciar ao 14º e ao 15º lá atrás—e por ser, na verdade, o único destinatário da norma—, dei-me por impedido na votação da resolução. E porque entendo que as causas da política devam ser coletivas e nunca individuais, embora me abstendo de votar, coloquei-me a favor do projeto, que, além de reduzir meu salário, me impedirá de ser remunerado pela minha profissão, como sempre fui, e me obrigará a receber pela política, como se profissão fosse. Se é preciso pagar mais esse preço pessoal para manter a linha da moralização pública, eu o farei. E farei mais ainda.


Grato


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