domingo, 3 de junho de 2012

O PiG já não acredita na tese do mensalão

Verdades incômodas sobre o mensalão


O leitor que tiver paciência de ler esta nota até o fim terá elementos melhores para julgar o debate envolvendo Lula e Gilmar Mendes.

Escrevi em nota anterior que o pano de fundo deste conflito envolve o ambiente político em torno do mensalão.

Uma das partes tem interesses em politizar o debate no ponto máximo. A outra tem esperança de convencer os ministros a apoiar-se em argumentos de natureza técnico, no exame das provas.

A leitura do relatório do delegado da Polícia Federal Luiz Flávio Zampronha, disponível na internet, é rico em detalhes e bastante completo na abordagem.

Só para o leitor ter uma ideia da radicalização da situação. Tratado pela imprensa, o relatório já foi exibido como prova definitiva da existência do mensalão. Também foi apontado como prova do contrário.
 
 
 
Em suas conclusões, o relatório mostra que se o PT não pode estar feliz com as denúncias apuradas, a oposição não tem o direito de festejar por antecipação.

É por isso que o julgamento é aguardado com tensão. Todo mundo espera um proveito político mas ninguém sabe o que pode acontecer.

Ninguém quer prestar atenção ao relatório.

Zampronha juntou os fios dos empréstimos bancários e dos contratos de publicidade do Banco do Brasil e concluiu que houve sim desvio de dinheiro público para pagar os compromissos assumidos pelo PT. Os dados estão lá.

O PT pode alegar, corretamente, que o mensalão de Delúbio Soares é igual ao mensalão mineiro e até pode dizer que o esquema dos tucanos mineiros está melhor demonstrado. Tudo isso é verdade. Mas a culpa de Marcos Valério em Minas pode até ajudar a denúncia em seu devido lugar. Mostra que o esquema do PT tinha antecedentes.

Mas nada disso ajuda a demonstrar que ele era inocente quando se juntou ao PT.

Pelo relatório, petistas e não petistas que deixaram sua assinatura em algum documento oficial terão dificuldades muito grandes para demonstrar que são inocentes.

O problema, para a oposição, é que essas conclusões estão longe de demonstrar a culpa dos 38 réus. Pior ainda. Para quem transformou José Dirceu no cérebro e gênio do mal, a investigação da Polícia Federal é uma decepção.
 
 
 
Evitando mencionar hipóteses que estão na mente de muitas pessoas, mas não podem ser comprovadas com fatos, o relatório não apresenta uma linha contra Dirceu.
Embora Zampronha não dê entrevistas, é fácil concluir o que aconteceu.
A culpa de Dirceu não foi registrada pela equipe de policiais encarregada de apurar os fatos capazes de incriminá-lo. Não há provas contra ele.

Não há uma denúncia nem uma testemunha. O próprio Roberto Jefferson, que fez acusações políticas a Dirceu em 2005, não apontou um caso específico nem uma situação precisa. Aliás: quem voltar à entrevista de Jefferson a Renata Lo Prete, na Folha, irá encontrar palavras em que ele testemunha a reação de Dirceu de crítica ao próprio Delúbio. Jefferson contou a Lo Prete que, ao ser informado do que ocorria, Dirceu até deu socos na mesa. (Ele também disse que Lula chorou).

Puro teatro maquiavélico, você pode dizer. Coisa de tem treinados profissionais do crime. São todos farsantes, mentirosos…Esses políticos são todos iguais. Quem sabe?

Falando para os autos, Jefferson também não falou sobre o esquema de “compra de votos no Congresso” nem de “compra de consciências”. Jefferson repete nos vários depoimentos que deu à Polícia que jamais votou em projetos do governo em troca de dinheiro. Lembra que ele e sua bancada estavam de acordo com as propostas de Lula. Dá exemplos.

Fala que o problema é que os petistas combinaram e não entregaram recursos para a campanha de 2004.

Jefferson, neste aspecto, concorda com aquilo que Delúbio sempre disse. Era dinheiro de campanha.

Já estou ouvindo um grito do leitor do outro lado: “P…que p…!”

“Não é possível!”

“O PML enlouqueceu de vez!”

“Não percebe que a Polícia Federal faz o que o governo quer?”

Todos nós temos direito a uma opinião sobre o caso e seus protagonistas mas, acionada pela Procuradoria Geral da República, aquela que denunciou o governo pela montagem de uma “organização criminosa”, a Polícia Federal chegou a outro caminho.

Não demonstra o “mensalão”. Tampouco aponta para José Dirceu. Mas incrimina quem foi apanhado numa operação que implicava em desvio de recursos públicos. Não é pouca coisa, num país de altíssima impunidade. Mas não irá agradar quem acredita que estava tudo provado e demonstrado sobre a “quadrilha criminosa.”

Isso quer dizer que o Supremo irá seguir as recomendações da Polícia Federal? Nem de longe. Cada ministro tem o direito a suas convicções e próprias conclusões. O relatório da Polícia Federal pode inspirar alguns ministros, a maioria, a minoria, ou nenhum. Com certeza não será um julgamento unânime como a votação sobre cotas.

Não é inteiramente bom para nenhum lado. Nem totalmente ruim.


 
Revista Época

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