sábado, 11 de agosto de 2012

A Justiça como espetáculo


Em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento da Ação Penal 470, batizada de “mensalão” para maior efeito político e jornalístico, transformou-se em espetáculo negativo para a Justiça brasileira. Sobre ela não só analistas amadores, na mídia, avançam sem pudor pela hermenêutica jurídica, como também os juízes, ministros da Corte, contrariamente se arriscam a pequenas peruadas.



“Eu fui o único que não deixou o plenário” gabou-se o ministro Celso de Mello na noite de terça-feira 7, após mais uma apresentação televisionada do julgamento.


Ele se referia ao senta-levanta dos julgadores batidos pelo cansaço das sessões que se estendem por mais de cinco horas. Mello, no entanto, a exemplo de outros pares dele avaliou a atuação dos advogados de defesa: “Muito boa”.


Dias antes foi a vez de outro Mello expor um juízo de valor. Marco Aurélio avaliou a peça de acusação do procurador-geral da República: “Foi substanciosa, um trabalho sério do Ministério Público”.



Os dois ministros talvez não tenham agredido regras oficiais de comportamento. Mas, para efeito de compreensão do argumento, pergunta-se: poderiam se manifestar ao contrário? Ou seja, poderiam dizer que a defesa dos réus atuou mal ou criticar a qualidade do trabalho de Gurgel? Sem liberdade de criticar não cabe fazer o elogio, mesmo que seja por mera cortesia.


Essas deformações no julgamento desse processo não foram iniciadas pelo “confronto”, transmitido pela televisão, entre o relator e o revisor da ação, ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, já no primeiro dia dos trabalhos no STF. Aliás, discordaram após o “excesso de deferência”, conforme comentários feitos nos corredores do tribunal, ao advogado Márcio Thomaz Bastos. Ele apresentou, sem sucesso, proposta de desmembramento da ação já discutida e negada pela Corte.


Antes disso, o ministro Ayres Britto tinha falado da questionada participação de Dias Toffoli, no julgamento do dito mensalão, em razão das ligações funcionais dele com o réu José Dirceu na Casa Civil. Após dizer que não competia a ele “opinar sobre nada” Britto, mesmo assim, opinou. Embaralhou-se ao sinalizar contra a presença de Toffoli: “Não quero ser mal interpretado. Agora isso sinaliza participação. Sem dúvida. Apenas isso”. De fato, não precisava dizer mais nada.


O Supremo Tribunal Federal passou sete anos sem julgar essa ação. Tentou corrigir esse erro com outro ao marcar o julgamento, sob pressão da mídia, para as vésperas das eleições municipais. Agora está premido a acelerar a votação, caso seja preciso, para não perder o voto do ministro Cezar Peluso, que se aposenta no dia 3 de setembro. Dez entre dez opiniões afirmam que Peluso votará pela condenação.


Fosse ao contrário a tendência do voto dele, a pergunta seria a mesma: será legítimo?


Quem se propôs a trabalhar infatigavelmente para isso foi o ministro Gilmar Mendes. Na segunda-feira 6, em São Paulo, defendeu a realização de sessões extras para cumprir o calendário do julgamento.


Horas depois, vítima da fadiga, Mendes adormeceu e não pôde ouvir o que a defesa dizia. Cochilaram também os ministros Joaquim Barbosa e Celso de Mello autor de um alerta registrado em reportagem: “A defesa leva desvantagem por pegar julgadores cansados quando a sessão é muito longa”.


Mello tem razão ou apenas argumenta em causa própria?


Mauricio Dias, CartaCapital

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