quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

História une Lula a Getúlio para derrotar FHC e Lacerda

 


Por Davis Sena Filho Blog Palavra Livre

No dia 24 de agosto de 2013 vão se completar 59 anos da morte do grande estadista Getúlio Dornelles Vargas. Ao acordar, pensei no notável político que foi o gaúcho da cidade de São Borja, berço do trabalhismo brasileiro. Lembrei que o Senado homenageou, em 2004, o grande estadista, em uma sessão especial, da qual participei por meio de convite, pelo transcurso dos 50 anos de seu trágico desaparecimento e que, contraditoriamente, propiciou naquele momento a derrota da direita brasileira, que estava há poucos momentos de efetivar mais um golpe de estado.

O Senado, instituição republicana por onde passaram vultos importantes de nossa história, entre eles o general gaúcho, Pinheiro Machado, e o doutor das letras, o baiano Rui Barbosa, sempre relembrou e homenageou as pessoas que ajudaram a pensar e a construir este País. É tradição, e, a meu ver, assim continuará, pois se trata de uma Casa augusta, enraizada na história do Brasil, além de ser um fórum político muito importante de deliberações e decisões em âmbito nacional.

Pensei em Getúlio e em sua grandiosa obra. Refleti sobre seu imenso legado, e, conseqüentemente, em seus opositores, ferozes e injustos, desrespeitosos e ousados, mas, principalmente, oportunistas e mentirosos, combustíveis da violência daqueles que querem assumir o poder pela força das armas. Uma oposição de direita, sobretudo, herdeira da escravidão e contrária ao desenvolvimento social e econômico que a população brasileira estava a experimentar pela primeira vez em sua história.

O Brasil, até então, era um País de herança escrava, atrasado. Cerca de 70% da população, em 1930, vivia no campo. Para ilustrar ou dimensionar o que foi Getúlio Vargas recorro ao saudoso professor, fundador da Universidade de Brasília (UnB) e criador do CIEP, senador Darcy Ribeiro, que disse a seguinte frase: "Quando você pensa que coisas elementares para qualquer País como os Ministérios da Educação, da Saúde e do Trabalho não existiam no Brasil antes de 1930; quando você pensa que não havia jornada de oito horas de trabalho, não havia direito a férias, a sindicato, à greve, e constata que quem introduziu isso tudo foi Getúlio, mesmo reconhecendo seus defeitos não se pode esquecer sua importância histórica".

A constatação do mineiro Darcy Ribeiro personifica e sedimenta a vida política, o ideário do estadista gaúcho, herdeiro de Júlio de Castilhos e, filosoficamente, positivista. Não há como, de forma imparcial, dissociar Getúlio Vargas do desenvolvimento do Brasil, e, por conseguinte, da inserção de nosso País no rol dos países que são considerados civilizados.

Getúlio civilizou a sociedade brasileira, porque garantiu os direitos civis e trabalhistas, bem como permitiu que o cidadão brasileiro se tornasse independente, por intermédio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), da instituição do salário mínimo, da organização dos sindicatos, do direito à greve, do acesso das massas à educação, da criação da Previdência Social e da Justiça do Trabalho.

Além disso, Getúlio reorganizou o estado nacional ao instituir o concurso público, para depois centralizá-lo e com isso obrigar os estados a serem, de fato, federados. Naquela época, os governadores eram chamados de presidentes, e as oligarquias rurais e urbanas controlavam os governos estaduais, administravam o dinheiro público sem darem satisfações a um poder central, que hoje tem instrumentos como a Receita Federal, a Polícia Federal, o Ministério Público e as procuradorias, que combatem o desvio de recursos e apontam aqueles que são os responsáveis pela corrupção e por diversas modalidades de crimes financeiros e fiscais. A punição fica a cargo dos tribunais do Judiciário, não se pode confundir.

Por tudo isso, não é correto, historicamente, negar o valor e a importância de um homem, raro, como Getúlio Vargas. Ele, juntamente com homens da importância de Oswaldo Aranha, Lindolfo Collor, Francisco Campos, Gustavo Capanema, Pedro Ernesto, Juarez Távora, Tancredo Neves, Assis Brasil, Juracy Magalhães, Alberto Pasqualini, João Goulart e, posteriormente, Leonel Brizola, entre muitos outros, revolucionaram o nosso País, que até então era rural, voltado à agricultura e à pecuária, além de exportar minérios, sem, entretanto, agregar valor algum.

Essa brilhante geração de políticos realmente pensou o Brasil e o construiu, solidificando-o para o futuro, mesmo quando este mesmo futuro não foi tão bom para os brasileiros — vide os homens que vieram a governar este País após a morte de Getúlio Vargas e da queda de João Goulart, o Jango, no ano de 1964. Em vez de darem continuidade à sua monumental obra, tentaram desconstruí-la, aos poucos, de governo a governo.

Ao contrário dos Estados Unidos, cujos presidentes, em sua maioria, deram continuidade à obra social e econômica de Franklin Delano Roosevelt, os ditadores do período militar e os presidentes José Sarney, Fernando Collor e o tucano Fernando Henrique Cardoso, conhecido também como FHC — o Neoliberal — anunciaram o fim da Era Vargas.

FHC — o Lesa-Pátria —, com sua vaidade e petulância de "aristocrata" ou de cafeicultor paulista quatrocentão, além da vocação para intelectual sociológico, colocou em prática sua característica principal como mandatário: nenhuma praticidade e vontade para fazer do povo brasileiro um povo orgulhoso e satisfeito com os rumos de seu País.

Vendeu empresas públicas lucrativas e organizadas, que serviram de base para o nosso desenvolvimento. Estatais, a exemplo da Vale do Rio Doce (obra de Getúlio) e a Telebras hoje mutilada e dividida entre os estrangeiros em várias partes, foram alienadas do patrimônio público brasileiro e vendidas a preços tão baixos que hoje soam como piada. De mau gosto, é claro.

Em vez de ter papel social, a Telebrás, dividida pela iniciativa privada estrangeira e nacional, transformou-se apenas em prestadora de serviços de telefonia dos mais caros do mundo. Por seu turno, essas empresas são as campeãs de reclamações no Procon. Realmente, as telefônicas privadas dão nos nervos da população, porque quando algo ou alguém somente visa o lucro, não há como priorizar a sociedade e nem respeitar seus direitos fundamentais, garantidos pela Constituição e pelo Código do Consumidor. Portanto, considero que as agências reguladoras e o governo têm de ser duros com os maus empresários e cobrar, sem tergiversar, o que é definido pelos contratos.

As empresas de telefonia se recusam a investir nos rincões do Brasil e até hoje não disseminaram o sistema de banda larga, porque não têm competência para realizar tal projeto, além de considerá-lo caro para seus cofres abarrotados de dinheiro, valores monetários que, evidentemente, vão para fora em forma de remessa de lucro e com isso ajudar a gringada a amenizar o colapso financeiro, econômico, social e moral pelo qual estão a passar, por causa do derretimento do fracassado e desumano neoliberalismo, a partir de 2008. Somente os "especialistas" da imprensa de negócios privados comprometidos com o grande capital "não percebem" essas realidades. Eles não são uns gênios, prezado leitor?

O neoliberal tucano FHC, na verdade, não governou como presidente de uma Nação, e sim como corretor de imóveis e de empresas à venda. Lula trilhou um caminho contrário e fortaleceu o estado nacional, que, posteriormente, tornou-se o maior responsável pelo Brasil praticamente não sofrer com a crise econômico-financeira internacional, que acometeu o mundo no ano de 2008. Lula vem do trabalhismo paulista, que é diferente do gaúcho, mas que, no fim das contas, tem os mesmos interesses políticos e sindicais, porque se trata de defender os interesses dos trabalhadores. E é esta a questão primordial.

Lula, mandatário que já tem um lugar de honra na história do Brasil, tal qual Getúlio Vargas, apenas compreendeu o trabalhismo do antigo PTB e do PDT e passou a trabalhar, de forma programática, essa realidade na Presidência da República. A direita percebeu e sua ponta-de-lança, a imprensa de mercado, passou a combatê-lo, como o fez com Getúlio, Jango e Brizola, ao ponto de, em 2005, quase ser derrubado por essa estratégia conservadora, que se valeu do caso do mensalão para sangrá-lo politicamente, enfraquecê-lo, porque no ano seguinte haveria as eleições para presidente. Todo esse processo teve a cumplicidade da cúpula do PSDB e, obviamente, do DEM, que é o pior partido do mundo, pois tão conservadores quanto os republicanos do Texas. Eles, juntamente com os tucanos paulistas, são o Tea Party brasileiro.

Lula percebeu, juntamente com Marco Aurélio Garcia, assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, Márcio Thomaz Bastos, ministro da Justiça, Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores, Dilma Rousseff, ministra-chefe da Casa Civil e Luiz Dulci, ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, que estava em jogo não apenas a luta pelo poder em termos civilizados, partidários, eleitorais e constitucionais. O que estava a acontecer era uma conspiração de setores reacionários da vida brasileira, que colocavam em risco o seu mandato de presidente da República conquistado, inquestionavelmente e democraticamente, nas urnas.

O presidente trabalhista avisou aos seus ministros: "Continuem trabalhando no Ministério, porque eu vou para as ruas". Dito e feito. Lula subiu para o Nordeste, e de lá avisou aos golpistas que não aceitaria golpe de estado. Posteriormente, o político fundador do PT e da CUT disse que o problema da direita, dos conservadores é que eles nunca se depararam e trataram com um presidente cuja origem tem raízes profundas no sindicalismo, na ala progressista da Igreja Católica e nas organizações sociais. Trata-se de um triunvirato poderoso, porque ele é enraizado na alma do povo, e, por conseguinte, ramificado em todos os setores da sociedade brasileira. A direita percebeu e recuou. Ela é cruel, mas não é e nunca foi idiota.

O governo neoliberal e entreguista do tucano FHC, que envergonhou a verdadeira social-democracia, principalmente a europeia, deveria, na verdade, ter se espelhado em Getúlio Vargas, que ofereceu propostas e efetivou não um programa de governo, mas, sim, de estado para o País, com sua equipe e, obviamente, com a força dos trabalhadores brasileiros. Se Getúlio é considerado em um período ditador, como gostam de afirmar os "gênios" da imprensa privada golpista, o que pensar então das políticas econômicas e sociais dos cinco ditadores militares, de José Sarney, Fernando Collor e, principalmente, do neoliberal Fernando Henrique Cardoso?

Existe ditadura mais cruel? E há crueldade maior do que a da imprensa comercial e privada? Esta, historicamente, liga-se a políticos que fomentam o jogo de interesses do grande capital nacional e internacional. Barões da imprensa que compactuam, como sempre, com os conspiradores de outros segmentos, que se dedicam a derrubar ou ridicularizar quaisquer políticos que tenham propostas nacionalistas, projetos para o País e programas de governo voltados para o desenvolvimento social, que visam emancipar o povo brasileiro. Programas e projetos exemplificados em Getúlio Vargas, João Goulart e Luiz Inácio Lula da Silva, bem como em Juscelino Kubistchek, que, por pensar em seu futuro político, apoiou, em um primeiro momento, o golpe de estado de 1964. Depois Juscelino percebeu seu grave erro e passou também a combater, corajosamente, a ditadura civil-militar, que o perseguiu e o humilhou.

CARLOS LACERDA E FHC: TUDO A VER... PLIM PLIM!
Por sua vez, a corrente política trabalhista dos gaúchos, também dos uruguaios e dos argentinos, enfim, foi derrotada em 1964, por intermédio de políticos e militares udenistas e golpistas umbilicalmente ligados à Guerra Fria, promovida e patrocinada no ocidente pelos Estados Unidos, e apoiada por parte da classe média despolitizada e conservadora e, logicamente, como não poderia deixar de ser, pela imprensa alienígena e pelos religiosos conservadores da Igreja Católica, além de banqueiros como o governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, que tiveram ainda a cumplicidade dos empresários da Fiesp, da Fierj e de outras federações empresariais menos importantes.

Não procede e não reflete a verdade histórica a interpretação de muitos historiadores, sociólogos, políticos e jornalistas que Getúlio Vargas, em 1945, teve de renunciar por causa da vitória da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na II Guerra Mundial, como, por exemplo, declarou, na época, o presidente do Senado, José Sarney. O político maranhense, de origem udenista da ala Bossa Nova, afirmou tais palavras ao "Jornal do Senado", em sua edição especial de 24 de agosto de 2004, em homenagem a Getúlio Vargas.

A verdade é a seguinte: em 1945, Getúlio Vargas teve de renunciar, pois o Palácio do Catete estava sitiado pelos militares (sempre eles). Agiu dessa forma para manter o regime democrático e com isso garantir a vitória do marechal Eurico Gaspar Dutra, seu ministro da Guerra, nas eleições constitucionais de 1946. Tanto é verdade que Getúlio foi eleito democraticamente, em 1950, fato este que recrudesceu o ódio feito de bílis da direita reacionária udenista-militar, que nunca teve voto e continuou a não tê-lo através da história. Nem mesmo as mudanças constantes de nomes, como, por exemplo, Arena, PDS, PFL e agora DEM, partido que está a se transformar em uma agremiação média para pequena, serviu para que os udenistas melhorassem suas imagens perante os eleitores. Mudar o nome da sigla não convence ninguém. A direita é o que é, porque seus propósitos são o que são, e todo mundo sabe disso, até um recém-nascido.

Com o ressurgimento do PSD (sigla partidária fundada por Getúlio) do ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab, acarretou que muitos demoníacos (desculpem, foi um lapso!) do DEM pulassem do barco para não afundar com o partido direitista. Kassab percebeu que ser aliado de José Serra é dar abraço em afogado, e apoiar Geraldo Alckmin significa não ter acesso livre para concorrer a governador de São Paulo. Esperto o Kassab, não achas, caro leitor? Com isso, o DEM, que é o PFL e a UDN, vai seguir o seu destino: o fracasso retumbante e, quiçá, a extinção, palavra esta muito íntima de ex-senador e ex-governador de Santa Catarina e ex-"ideólogo" do DEM, Jorge Bornhausen. Quem sobrou para o DEM? O ACM Neto, atual prefeito de Salvador. Só que o neto do falecido coronel ACM não tem expressão nacional, mas mesmo assim o DEM, o pior partido do mundo, ergue as mãos aos céus por ter conquistado a capital dos baianos.

Voltemos ao Sarney. Udenista que também foi da Arena e do PDS, conhece a história do Brasil. Ele sabe que Getúlio Vargas foi vítima de um golpe. Vargas caiu porque sofreu um golpe "branco" e foi traído pelos coronéis e generais, inclusive pelo seu ministro da Guerra, general Zenóbio da Costa. Os generais, a maioria, dizia-se, até então, legalista, portanto, constitucionalista. Esses mesmos coronéis e generais, dez anos mais tarde (1964), ascendem ao poder, por meio de um golpe militar, com amplo apoio de forças estrangeiras, como a CIA e o Departamento de Estado, da IV Frota dos EUA, de civis brasileiros de oposição, aqueles com influência junto aos empresários que controlam os meios de produção e de comunicação, bem como o importantíssimo apoio logístico, geográfico e político de governadores poderosos como Magalhães Pinto de Minas Gerais, o intrépido, loquaz, agressivo, ambicioso sem limites pelo poder e multifacetado Carlos Lacerda do Rio de Janeiro, denominado pelos seus adversários de o Corvo, além do governador de São Paulo, Ademar de Barros, "o rouba, mas faz".

Para o bem da verdade é necessário que fique claro que Getúlio não foi derrubado porque era "ditador", e sim porque era nacionalista, contrariava interesses internacionais e elaborou leis e assinou resoluções que beneficiaram o trabalhador. A questão política (ser ditador ou não) sempre ficou em segundo plano, mas foi usada e manipulada, sistematicamente, como questão principal. A imprensa atacava violentamente Getúlio (a Tribuna da Imprensa, do golpista Carlos Lacerda, publicou, de forma cruel e infame, a seguinte manchete: "Somos um povo descente governado por um ladrão"). Os proprietários de jornais, rádios, televisões e revistas pertencem à classe do patronato e, igualmente, aos patrões de outros segmentos da economia, eram e ainda o são até hoje contra os avanços sociais efetivados pelos governantes trabalhistas. Eles sempre, quando podem, pedem a revisão das leis trabalhistas. Sempre.

Considerar Getúlio ditador realmente foi um subterfúgio para a burguesia brasileira combatê-lo e derrubá-lo. Tanto é verdade que depois a imprensa empresarial apoiou como cúmplice e de forma subserviente os militares a partir de 1964. Ou seja, a imprensa privada foi um dos principais alicerces da ditadura militar. Ao apoiarem o golpe de estado, os barões da imprensa e das mídias enriqueceram a tal ponto que hoje enfrentam governos e tentam pautá-los conforme seus interesses políticos, ideológicos, econômicos e financeiros. Ainda mais se determinado governante for trabalhista, a exemplo de Getúlio, Jango, Lula e agora a presidenta Dilma Rousseff.

A verdade é que a ditadura Vargas perto da dos militares de 1964 era coisa de amador. A imprensa da época, os ricos e parte da classe média derrubaram Getúlio porque seu governo estava a distribuir renda, além de inserir muitos milhares de brasileiros no mercado de trabalho e nas escolas públicas. Getúlio Vargas foi derrubado em 1945 e morto em 1954 porque era nacionalista e tinha um projeto de autodeterminação e de independência para o Brasil. Fato este que não interessa e nunca interessou aos EUA e à nossa burguesia herdeira do sistema de escravidão.

Os militares e civis que passaram a controlar o Brasil com mão de ferro em 1964 se alinharam aos interesses internacionais, a ter como base a Guerra Fria. Os Estados Unidos não permitiriam jamais que o Brasil, bem como a Argentina de Perón e o Uruguai se desenvolvessem sem sua aquiescência. Era uma questão geopolítica e colonialismo, sem sombra de dúvida, pois os estadunidenses passaram a ficar histéricos quando a União Soviética dividiu o mundo, simbolicamente, com o muro de Berlim.

O Brasil, então, passou a abrir as portas, com ênfase, às multinacionais. Os economistas, de pensamento monetarista,/liberal, como Eugênio Gudin, Roberto Campos e equipes direcionaram a economia do País para o que hoje é conhecido como neoliberalismo, sistema perverso alicerçado na globalização, que é o colonialismo maquiado, com nova estampa, a fim de atender às demandas da nova ordem mundial, que é a mesma ordem secular de sempre: manda quem pode (países ricos); obedece quem tem juízo (países pobres). Como ocorreu com a Líbia. Os países colonialistas, por meio da ONU, órgão de supremacia e defasado; superado e de espoliação internacional, calou-se e mais uma vez se tornou cúmplice da rapinagem e da pirataria que se pratica por meio da força nos países árabes, como exemplificam muito bem a Palestina, o Iraque e o Afeganistão, somente para ficar nesses.

Acontece que Getúlio Dornelles Vargas tinha juízo. Quem não tinha e continua a não tê-lo são os políticos de partidos (extintos ou não) como a União Democrática Nacional (UDN), o PL, a Aliança Renovadora Nacional (Arena), o Partido Democrático Social (PDS), o DEM (ex-PFL), o Partido Popular Brasileiro, atual Partido Popular (PP), além de outros partidos de centro e de direita como o PPS e o PSDB, aquela agremiação política que vendeu o País e por causa desse grave motivo perdeu as últimas três eleições para presidente da República. Lembro ainda que partidos que se dizem de esquerda, como o PPS e o PSOL foram cooptados pelo establishment, como o foi também o partido de Marina Silva, o Rede, que antes de ser legalizado no TSE já é uma metáfora de si mesmo.

Getúlio Vargas estava tão à frente de seu tempo que, em 1929, na campanha à Presidência da República, pela Aliança Liberal, ele propunha uma legislação que efetivasse as férias remuneradas e a regulamentação do trabalho do menor e da mulher, o que venhamos e convenhamos, deixou a "elite" econômica nacional inconformada, com raiva, ou melhor, com ódio. Getúlio Vargas foi o maquinista da revolução industrial brasileira, a transformar, desse modo, um País rural em urbano.

Criou a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a Vale do Rio Doce e a Petrobras. O mundo hoje, com as guerras no Oriente Médio, na África e na Ásia árabe, está a enfrentar mais uma crise de petróleo, na verdade de vários tipos de energia, e o Brasil é autossuficiente e, portanto, não sente em demasia a alta nos preços do combustível fóssil. É verdade que o preço da gasolina, por exemplo, não é barato, mas, contudo, o Brasil, com a descoberta do Pré-Sal e com seu mercado interno cada vez mais forte, torna-se um País mais poderoso do que já é, e preparado para enfrentar crises, bem como ter o controle de suas diferentes fontes de energia.

Retornemos a Getúlio. Além disso, a construção da CSN permitiu que o Brasil liderasse o segmento do aço e assim se tornasse proprietário de seu destino, sem precisar exportar ferro bruto e depois comprar o mesmo ferro de países industrializados a preços altíssimos, em dólares, o que, sobremaneira, não agradou aos industriais norte-americanos do segmento do aço. Só que produzir aço é uma questão de segurança nacional e de independência para qualquer País, e Getúlio percebeu isso. Alguns grandes empresários sempre remam contra a maré e contrariam os interesses de seu próprio País.

Lula, quando presidente, pressionou o ex-manda-chuva da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, a agregar valor à produção da Companhia, ou seja, construir siderúrgica, fábricas que pudessem propiciar empregos no Brasil para os trabalhadores brasileiros. Lula demonstrou, em público, sua contrariedade. Agnelli pagou para ver. E viu; pois demitido. No governo Dilma ele teve de sair da presidência da Vale do Rio Doce. Como se vê, existem empresários, executivos atuais que agem como os empresários e executivos do passado. O tempo passa, mas a cabeça é a mesma. São tacanhos e medíocres, porque não pensam no País. Eles não têm compromisso. Não dá para deixar na mão de um executivo predador uma empresa do gigantismo da Vale do Rio Doce, identificada com o povo brasileiro, além de ser obra do estadista nacionalista Getúlio Vargas. E a imprensa e seus "especialistas" de prateleira têm a insensatez e a total falta de noção ao defender o injustificável e o indefensável, tudo para manter privilégios e atender os interesses do mercado internacional, mesmo se o preço for o prejuízo do Brasil e do seu povo competente, criativo e trabalhador.

Fernando Henrique Cardoso — o Neoliberal — quando se despediu do Senado em 1994, com o propósito de desmontar a Era Vargas, afirmou: "Um pedaço do nosso passado político ainda atravanca o presente e retarda o avanço da sociedade. Refiro-me ao legado da Era Vargas, ao seu modelo de desenvolvimento autárquico e ao seu Estado Intervencionista". FHC queria o quê? O País não tinha nada. Era rural. Getúlio remodelou o estado nacional e o organizou. Somente o estado teria e tem (como demonstrou na crise mundial de 2008) condições de fomentar e desenvolver a economia e, por conseguinte, permitir a melhoria da qualidade de vida da população, ainda mais naquela época de Vargas.

Nada mais natural aos tucanos do que as palavras de FHC, que depois de terminar seu mandato não deixou legado algum. O político neoliberal e entreguista deixou, certamente, um legado de miséria, de diminuição da renda do trabalhador, de desemprego, de venda das estatais, que FHC não construiu e não lutou para construí-las, de subserviência ao FMI (faliu o Brasil três vezes e pediu dinheiro de joelhos e com o pires na mão), de não efetivação séria da reforma agrária, de degradação do meio ambiente, de destruição das nossas estradas, ferrovias e portos, de racionamento de energia durante nove meses, que redundou no famoso apagão, e, como não poderia deixar de ser, de crescimento da violência.

O executor do neoliberalismo no Brasil, o tucano FHC, criticou o legado de Getúlio Vargas no Senado, em 1994, como se fosse uma senha. Ele sinalizou aos estadunidenses, credores históricos, que desmontaria o estado brasileiro, com as vendas das estatais e do fechamento de instituições e órgãos públicos e com isso permitir a diminuição do estado nacional. Estado menor mais dinheiro para pagar a dívida. Atitude que os estadunidenses, por não serem entreguistas, não fariam com o estado deles.

FHC, o Neoliberal, trabalhou bem para os ricos e manchou de vergonha todos os brasileiros que um dia acreditaram que a social-democracia fosse democratizar a vida nacional, a começar pela distribuição de renda e de riqueza. Afinal, foi isso que os sociais democratas europeus fizeram. Somente eleições não bastam. Tem de haver democracia na economia. Distribuição de renda, de terra, apoio à micro e média empresas, crescimento nos índices de emprego e, sobretudo, aplicação massiva de recursos para a educação. Foi isso que Getúlio e Lula fizeram. Cada uma com as realidades e as diferenças de suas épocas.

FHC (ele é professor) e seu governo entreguista não construíram uma escola de ponta, uma escola técnica. As universidades públicas foram quase desmanteladas e as faculdades particulares surgiram como sarampo em criança, a maioria delas somente de olho nas mensalidades pagas pelo aluno trabalhador, despossuído de dinheiro e de ensino de qualidade. Quanto a Lula, o que dizer?

Lula (e muitos sindicalistas da CUT, alguns deles, inclusive, foram eleitos deputados), antes de ser presidente e por desconhecimento, pensava de uma maneira bem parecida com a de FHC, no que tange ao trabalhismo e ao sindicalismo. Lula considerava a CLT como o AI-5 dos trabalhadores. Para o presidente petista, Getúlio Vargas era o pai dos pobres e a mãe dos ricos. Lula afirmava que o PT nasceu dos operários de macacão e por isso tem de escolher seu destino em vez de ficar à mercê do cajado de políticos que deveriam andar com os trabalhadores e não dizer o que eles têm que fazer.

Na Presidência da República, Lula, homem inteligente, dotado de uma clarividência política ímpar, percebeu que sua condição de político, sua realidade de vida e seu pensamento ideológico eram mais próximos dos trabalhistas gaúchos do que ele pensava. Ele não somente percebeu como começou a governar como tal, ou seja, com as características inconfundíveis de um mandatário trabalhista, tanto no Brasil como na Argentina ou no Uruguai.

Lula sempre quis os sindicatos desvinculados do estado. Os sindicatos foram criados na era Vargas. Lula tem forte influência nos sindicatos, pois a CUT é um conjunto imenso dessas importantes entidades. A verdade é que se não existissem os sindicatos, Lula não existiria como grande líder político que é hoje. Lula, portanto, é fruto do sindicalismo criado por Getúlio. Por mais que os sindicatos paulistas e confederações e federações de trabalhadores não tenham oficialmente vínculo com o estado, não há como desvincular Lula de Getúlio, porque ambos são (ressaltadas suas diferentes épocas e origens) umbilicalmente e historicamente ligados aos trabalhadores brasileiros.

Contudo, de uma coisa eu tenho certeza: não se consegue desmontar a história; e Getúlio Vargas vai ficar para sempre na memória do povo brasileiro. Antes de dar fim à Era Vargas (coisa que muitos tentaram, mas não conseguiram), todo dirigente político tem de procurar não imitar FHC — o neoliberal. Se tal mandatário pensa em realmente ficar na história que ele faça por onde. Não basta ser um presidente administrador dos interesses das classes privilegiadas e dos trustes nacionais e internacionais. Tem de ser estadista. E Lula se fez estadista igual a Getúlio. Ponto.

FHC falou demais e fez de menos. Lula aproveitou a crise mundial e parou de administrar somente a macroeconomia (exportações, bancos, grandes indústrias e serviços) e passou, inclusive antes da crise, a valorizar o mercado interno para fazer o País crescer, além de se preocupar com a criação de universidades, extensões e escolas técnicas. Dilma Rousseff vai agora implementar a construção de creches e melhorar o ensino público fundamental.

Todavia, quem quer pagar ensino que pague. O estado é o provedor maior, pois o estado é a própria população. Quando o estado não cuida de seu povo, ele não é democrático. Esse negócio de empresa privada, livre iniciativa é papo para boi dormir. Conversa mole para favorecer os ricos. A livre iniciativa mama nas tetas do estado há muito tempo, como ocorreu há pouco nos Estados Unidos e na Europa, por causa da crise de 2008, que derreteu o neoliberalismo, sistema de rapina e desregulamentado de propósito para privilegiar ainda mais a quem já era privilegiado.

A verdade é a seguinte: empresário empregador tem de ter apoio sempre e financiamento. Empresário especulador "tem que passar a ser competente para se estabelecer", como define o principal bordão empresarial, além de ser a regra número um do mercado, tão admirada inclusive pelos maus empresários. Getúlio Vargas é mais moderno que todos os presidentes brasileiros, juntamente com Lula. Acontece que até hoje a nossa elite econômica tem rancor do grande estadista, por ele ter colocado ordem no País, quando assumiu o poder em 1930 e depois derrotou a "revolução" Cartola Constitucionalista de 1932, que queria manter os privilégios de uma oligarquia que ainda sonhava com o tempo da escravidão (política do café com leite).

Inclusive, infelizmente, parte da elite acadêmica, universitária e de viés tucano, analisa Getúlio com uma ponta de desdém, que é a inveja dissimulada. Getúlio Vargas foi um fenômeno político. Quando ele assumiu o poder e passou a modernizar o estado e as relações trabalhistas a libertação dos escravos tinha acontecido há apenas 42 anos, depois de 350 anos de escravidão, a mais longa da história da humanidade. Acham isto pouco? Mas não é. É muito. A Era de Getúlio não foi devidamente dimensionada pela história e pelos historiadores, e vai levar tempo enquanto viverem neste País pessoas rancorosas, conservadoras e que lutam, incessantemente, pela manutenção do status quo das classes dominantes.

O estadista brasileiro, o "ditador" esclarecido Getúlio Dornelles Vargas reorganizou os partidos, fundou o PSD e o PTB, estabeleceu o voto feminino, o voto secreto, criou a Previdência Social, criou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), estatizou a geração de energia elétrica, criou a carteira de trabalho, criou a Fábrica Nacional de Motores (lembra-se do caminhão FNM?), criou a Rádio Nacional, criou o Museu Imperial de Petrópolis, a resguardar assim a memória do Século XIX, criou a Eletrobras, criou o Serviço Nacional da Indústria (Senai) e o Serviço Social da Indústria (Sesi), instituições essenciais para a formação de mão-de-obra especializada, pois Getúlio Vargas estava a iniciar a industrialização do País. Os empresários da Fiesp acham que foram eles que criaram o Sesi e o Senai. E os Marinho e os executivos das Organizações(?) Globo pensam que o "Criança Esperança" é programa de governo. Seria cômico se não fosse trágico. Realmente... Sem comentários.

Criou ainda o presidente gaúcho e trabalhista o Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp), responsável pelo treinamento e profissionalização da carreira dos funcionários públicos, criou a "Voz do Brasil", para divulgar as ações do governo, além de limitar a remessa de lucros de empresas estrangeiras para o exterior. Somente este último item me leva a imaginar o que Vargas deve ter arrumado de inimigos, tanto estrangeiros quanto nacionais. O político trabalhista era, sobretudo, um homem corajoso. Getúlio Dornelles Vargas fez essa obra gigantesca em 19 anos. Os outros presidentes, juntos, com exceção do também estadista e trabalhista Lula, não fizeram nem a terça parte do que fez o Getúlio. É isso aí.

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