O ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), voltou amolecido, cordato, compreensivo, após o generoso recesso do Judiciário. O tipo “malvadeza durão”, encarnado por ele ao longo do julgamento do chamado “mensalão” petista, esfumou-se. Talvez temporariamente ou, quem sabe, por força das circunstâncias.
Sob a presidência de Barbosa, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em reunião no dia 19, ao julgar o veto a patrocínios da iniciativa privada para festas de juízes, estabeleceu um nível porcentual de tolerância para a ética. É mais ou menos assim: eventos promovidos por conselhos de Justiça, tribunais e escolas da Magistratura podem ganhar incentivo privado de até 30%. Alguém poderá pensar: melhorou, só porque não havia limites.
Embora tomado pelo espírito da discutida cordialidade brasileira, o ministro Barbosa ainda fez uma ponderação restritiva ao que chancelou: “É uma primeira tentativa de segregar o Poder Judiciário dessas relações duvidosas, senão promíscuas, às vezes, com o empreendimento privado”. Fez a concessão emoldurada por um discurso duro: “A minha posição, e de outros conselheiros, é no sentido de proibição total. Acho que isso virá em futuro próximo”.
Houve, no entanto, quem não cedeu. Os conselheiros do CNJ Jefferson Kravchychyn e Jorge Hélio, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, ficaram a favor da proibição de 100%. Não queriam deixar para depois.
Esses patrocínios são uma tradição equivocada no Judiciário brasileiro. Na falta de freio, tudo foi se agravando: houve congresso em resort de luxo patrocinado por instituições financeiras e a Associação Paulista de Magistrados recebeu brindes que foram distribuídos em uma festa na qual, por fim, foi sorteado um carro.
“É uma verdadeira vergonha esse evento”, condenou, na ocasião, o corregedor do CNJ, Francisco Falcão. Ele anotou a transgressão na sua lista de tarefas.
Quem ousa negar um “pedidinho” de ajuda para realizar um evento da Magistratura? O pedido por si só constrange, independentemente de outros problemas que possa criar.
Quando corregedora, a ministra Eliana Calmon, a favor do veto total ao patrocínio, tinha força na opinião pública, mas era fraca junto às forças ocultas. Não chegou a levar a questão a plenário. Isso foi feito pelo ministro Francisco Falcão, atual corregedor. Falcão apresentou a proposta de veto total, mas não manteve a posição. Aderiu ao porcentual aprovado.
No Conselho, a maioria votou seguindo a proposta apresentada pelos ministros Carlos Alberto de Paula e o próprio Falcão. O novo texto foi costurado no último fim de semana pelos dois.
A explicação oficial para o recuo foi político: não se formou consenso. A decisão final foi obtida por maioria de 10 votos a 5.
Há também explicação oficiosa. Fontes bem informadas garantem que o Instituto Innovare, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) que conta com apoio do Sistema Globo, conseguiu demover vários integrantes do CNJ.
Não se sabe se houve proibição de brindes, prêmios e passagens aéreas, entre outras coisas condenáveis. Essa decisão, de manga curta, do CNJ prova, entre outras coisas, que a ética no Brasil, tão invocada, avança no ritmo da nossa história: lenta e gradualmente.
Seguimos com o estandarte da esperança, no qual se lê: Brasil, país do futuro.
Mauricio Dias-CartaCapital
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