quarta-feira, 18 de novembro de 2009

69 para esquecer


Autor(es): Zuenir Ventura
O Globo - 18/11/2009

Em meio às comemorações de 1989, "o ano que mudou o mundo", há outro nove, este para esquecer. Ou não. É o 1969 brasileiro. Quando o homem realizava o sonho de chegar à Lua, fazendo a humanidade dar o que o astronauta Neil Armstrong chamou de "gigantesco salto", nós andávamos para trás e mergulhávamos nas trevas, atacados de sectarismo ideológico e intolerância política. Ao contrário de 68, sintonizado com o planeta, 69 foi de descompasso e desvio. À onda planetária de distensão política e liberação de costumes, respondemos com a violência e o obscurantismo.


No mesmo ano em que 400 mil jovens se reuniam em Woodstock para fazer amor e pedir a paz ao som de Jimi Hendrix, uma parte de nossa juventude se entregava a uma guerra perdida. Sombrio, 1969 inaugurou os anos de chumbo - os tempos de censura, tortura, terror e medo. De um lado, um governo tirânico impondo uma repressão brutal, de outro, uma esquerda radical tentando derrubar a ditadura pelas armas. Até hoje se discute para saber quem deu a partida nessa marcha da insensatez, e a única certeza é que os dois lados fizeram tudo para continuá-la.

Em doze meses, o país conheceu vários graus de arbítrio. Esperava-se que a ditadura ambígua de Costa e Silva revogasse os efeitos do AI-5 que ele próprio assinara com certa hesitação, mas o velho marechal foi revogado antes por uma trombose. Em seu lugar tomou o poder uma junta militar, que afastou da sucessão o vice-presidente Pedro Aleixo e aprovou uma nova Lei de Segurança Nacional, que introduziu a pena de morte, a prisão perpétua e o banimento. Como se não bastasse, promoveu a escolha de Médici como terceiro ditador - e o mais arbitrário dos cinco que o golpe de 64 teve.


Marcado pelo sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, por operações de guerrilha comandadas pelo ex-capitão Carlos Lamarca e pelo ex-deputado Carlos Marighela, por vários atentados e assaltos a bancos e pela perseguição a artistas como Vandré, Caetano, Gil e Chico, que tiveram que deixar o país, 1969 teve pouca coisa de bom. Vale lembrar a beleza luminosa da miss Vera Fischer, o verbo solto de Leila Diniz, a explosão de risos provocada pelo "Pasquim", a estreia de "Hair" em SP e, claro, o milésimo gol de Pelé. Mas até este foi politizado. Ao dedicar o feito às "criancinhas do Brasil", o Rei sofreu implacável patrulha. Alguns queriam que ele gritasse "abaixo a ditadura".

Em suma, 1969 só não deve ser esquecido para que não se repita.

Grande projeto esse do senador Cristovam Buarque, o de obrigar os políticos eleitos - vereador, deputado, senador etc. - a matricularem seus filhos nas escolas públicas. Só assim o nosso ensino vai melhorar.

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