quinta-feira, 12 de julho de 2012

Cassação de Demóstenes Torres: erro de cálculo, moralidade pública e transparência


Demóstenes Torres errou a conta. Cassado por quebra de decorro parlamentar pelo voto de 56 senadores dentre os 81 que compõem a casa, Demóstenes teve o voto contrário à sua cassação de 19 senadores e a abstenção de outros três, o que implica que 24 foram favoráveis à sua permanência no Senado Federal. Apostando na proteção do anonimato, garantido pelo voto secreto em plenário, o erro de Demóstenes foi de 17 votos.
 
Não se depreenda, entretanto, que a cassação do ex-arauto da moralidade pública no Senado tenha sido a redenção dos demais senadores, que teriam afirmado seu repúdio à corrupção e à convivência conspícua com a delinquência, ou, ainda, que a mais alta casa legislativa do país tenha dado demonstração de que não mais será convivente com o tráfego de influência e não mais contemporizará com os senadores que o praticarem.

Os exemplos pregressos são negativos. O mesmo Senado que hoje cassou Demóstenes Torres por quebra do decoro parlamentar foi o que absolveu Renan Calheiros, em 2009, ou, ainda, que absolveu Jaqueline Roriz, no ano passado, ambos acusados da mesma falta, que foram amplamente documentadas. Tal como Demóstenes, Renan Calheiros e Jaqueline Roriz foram acusados de se envolver com corruptos e de mentir para seus pares, a fim de negar suas faltas. Mais do que no caso de Demóstenes, havia provas que incriminavam Calheiros e Roriz. O primeiro teve contas pessoais pagas por lobistas e falsificou documentos que o comprometiam. A última aparecia em um vídeo, amplamente divulgado, recebendo dinheiro ilícito.

Ao contrário do que aconteceu com Calheiros e com Roriz, entretanto, Demóstenes foi cassado porque se viu sozinho. Desligado do DEM por iniciativa própria, antes que o expulsassem, Demóstenes não contou com a solidariedade dos seus pares e das grandes lideranças do Senado, como contaram Calheiros e Roriz, nem teve a seu favor as pressões de setores governistas, como teve Renan Calheiros. Foram estes os motivos pelos quais Demóstenes foi cassado ontem e os dois outros foram absolvidos.
 
Como nos dois episódios anteriores, a votação de ontem, que definiu a cassação de Demóstenes, foi secreta. Apostando no voto secreto para conseguir sua absolvição, Demóstenes acreditou que poderia obter a solidariedade da maioria dos senadores, que votariam movidos por sentimentos corporativos. Não contava ele com a vingança daqueles que vilipendiou durante todo o tempo em que pousou como vestal, quando, fingindo indignação, fazia denúncias e exigia punições. Não contava, além disso, com a decepção e a indignação de muitos dos que anteriormente o admiravam e confiavam em suas ações.
 
O corporativismo dos senadores, além disso, pode ter funcionado ao contrário. Visando manter suas prerrogativas e procurando garantir a prática do voto secreto para a tomada das decisões delicadas, os senadores podem ter votado pela cassação de Demóstenes Torres para dar uma satisfação à opinião pública e tentar convencê-la de que seus votos não precisam ser expostos para que seja respeitada a vontade de seus eleitores.
 
Independente dos motivos que possam ter movido os senadores na votação de ontem, aplauda-se a atitude moralizante que, finalmente, adotaram. Como bem afirma a sabedoria popular, “antes tarde do que nunca!”. Para que atitudes como esta tornem-se mais frequentes, no entanto, é bom que ninguém se iluda, será preciso que o regimento interno de todas as casas legislativas brasileiras sejam alterados. Tanto no Senado, quanto na Câmara dos Deputados, nas Assembleias Legislativas de cada Estado e nas Câmaras de Vereadores de todos os municípios brasileiros será preciso que o voto dos representantes populares seja sempre aberto, independente do tipo de decisão que tenha de ser tomada. Só assim estará garantida a transparência dos atos do poder Legislativo e assegurada a possibilidade de a opinião pública e os eleitores fiscalizarem efetivamente as posturas adotadas por aqueles que são eleitos para representá-los e para defender os interesses coletivos.Sul21

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