quinta-feira, 26 de julho de 2012

A praga da reeleição

O direito à reeleição no sistema eleitoral brasileiro, introduzido no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso a um custo até hoje desconhecido, tornou-se um problema pela vantagem que proporciona aos mandatários da vez e pela personificação da política. Agora, que mais um pleito se aproxima, proliferam as queixas aos tribunais eleitorais relativas a abuso de poder político e uso da máquina pública.


No caso do Rio de Janeiro, o atual prefeito Eduardo Paes tem sido acionado com frequência, não só pelos candidatos adversários, mas pela própria Procuradoria Regional Eleitoral. Paes se vale - e ele não é o único - do limite tênue entre o exercício da função e a condição de candidato à reeleição. É aí, neste espaço, que a vantagem de um candidato que já exerce o cargo se manifesta.


Agora mesmo, após um evento de campanha no Complexo do Alemão, uma das áreas particularmente sensíveis da cidade e onde uma policial foi morta recentemente pelo tráfico de drogas, Paes disse a jornalistas que irá pagar uma gratificação de R$ 250 aos policiais militares que trabalham nas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) do Rio. O anúncio contraria a legislação eleitoral, que proíbe reajuste de salários durante o período de campanha até a posse do prefeito eleito. O caso seguiu para exame do Ministério Público Eleitoral.


Paes, espertamente, disse que se a lei eleitoral permitisse ( o que ele sabe que não) o pagamento seria feito imediatamente. Caso contrário, ele o faria após as eleições, quando continuaria prefeito até o fim do ano, mesmo que não saísse vencedor. Afinal, Paes agiu como candidato ou como prefeito? As interpretações são variadas. Para a Procuradoria Regional Eleitoral, Paes fez campanha descarada e ainda enganou o eleitor, pois tal aumento só poderá ser dado em 2013 pelo prefeito eleito ou reeleito.


Paes, por sua vez, alega que a promessa foi feita na condição de prefeito, não de candidato. Foi assim, também em tese, que teria agido na recepção ao jogador de futebol holandês Seedorf, contratado pelo Botafogo, e recebido em cerimônia pública, no Palácio da Cidade. O ato também levou o Ministério Público Eleitoral a pedir a cassação do registro de Paes, mas o Tribunal Regional Eleitoral o inocentou. Interpretações legais à parte, o problema está, essencialmente, no instituto da reeleição.

 

Defensores do direito dos governantes disputarem o cargo por ao menos mais um mandato ignoram outra grave questão, que é a da personificação política. Por que um mesmo governante é necessário para levar adiante políticas bem sucedidas? A política não é feita em torno de ideias e de partidos? Por que só um homem ou mulher seria capaz de dar prosseguimento ao que está dando certo?

 

Essas questões foram respondidas na última eleição presidencial, quando Dilma Rousseff chegou ao Palácio do Planalto. Dizia-se que a candidata era um poste, que jamais exercera cargo eletivo e que não estaria preparada. Mas ela foi a escolhida da maioria dos brasileiros por um motivo muito simples: o governo que a antecedeu tinha ampla aprovação da população, que sabia que ela era quem iria manter as políticas públicas em curso e realizar o que ficou por fazer. Ou seja, isso mostrou ao próprio Lula, que também se beneficiou de uma reeleição, que já poderia ter passado o bastão ao fim do primeiro mandato, e voltado a se candidatar posteriormente.

 

A reforma política, a cada dia mais urgente no Brasil, precisa dar fim à reeleição para eliminar vícios, aumentar o equilíbrio dos pleitos e aprimorar as instituições. Um mandato de cinco anos, sem direito à reeleição, seria tempo suficiente para um político mostrar ao que veio. Se for bom, provavelmente fará o sucessor e poderá voltar se candidatar cinco anos depois.


air Pena NetoJornalista carioca. Trabalhou em O Globo, Jornal do Brasil, Agência Estado e Agência Reuters. No JB foi editor de política e repórter especial de economia.Direto da Redação.

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