Às vésperas do início do julgamento do processo conhecido como “Mensalão do
PT”, a atenção pública começa a se concentrar no STF. A imprensa abre manchetes
e antecipa o clima do julgamento. A expectativa generalizada é a da condenação
categórica dos envolvidos, principalmente do ex-ministro e ex-deputado federal
José Dirceu, do ex-presidente nacional do PT José Genoino e do ex-tesoureiro
nacional do PT Delúbio Soares, além de Duda Mendonza, o “mago” das campanhas
eleitorais, e de Marcus Valério, um publicitário que já se envolvera com o
esquema de financiamento de campanha de Eduardo Azeredo, presidente do PSDB
nacional, ao governo do estado de Minas Gerais.
No rol dos acusados, constam também, além de dezenas de outros políticos, os
nomes de Valdemar Costa Neto, na época presidente nacional do PL e hoje
secretário-geral do PR, e de Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB e
denunciante do “mensalão”, que teriam sido os maiores beneficiados pelos
pagamentos irregulares feitos pelos petistas para garantir o voto favorável dos
deputados e senadores destes partidos nos projetos de interesse do governo
Lula.
O termo “mensalão” foi cunhado por Roberto Jefferson, em sua acusação contra
José Dirceu, e designava a existência de pagamentos regulares e mensais aos
integrantes da base aliada lulista. José Dirceu, Delúbio Soares e os petistas
afirmam que nunca existiu esta prática. O que teria ocorrido seria o pagamento
das dívidas da campanha eleitoral do PTB, do PL e de integrantes de outros
partidos políticos, inclusive do PT, assumidas pela tesouraria nacional petista
em troca do apoio do PTB e do PL à candidatura de Lula durante o segundo turno
da eleição de 2002. Roberto Jefferson e Valdemar Costa Neto nunca explicaram o
que fizeram com o dinheiro que não negam ter recebido.
A denúncia, feita pelo procurador-geral da República, Antônio Fernando Barros
e Silva, acusa 40 pessoas e afirma que foi constituída uma “quadrilha” sob o
comando de José Dirceu, então ministro chefe da Casa Civil da Presidência da
República. Apesar da veemência das acusações contidas na denúncia, segundo a
opinião de juristas consagrados e de boa parte da própria imprensa, ela não
acrescenta fatos novos ao processo, não apresenta provas materiais da ocorrência
dos fatos em julgamento, nem demonstra cabalmente a participação dos principais
denunciados.
Dia 2 de agosto terá início o julgamento que tem tudo para catalisar a
opinião do público e que merecerá cobertura exaustiva da imprensa. É justo que
assim seja, dada a importância dos fatos e dos personagens envolvidos no
processo. Ocorrido há dez anos e se arrastando desde 2005, quando as denúncias
vieram a público, é elogiável que o processo seja julgado. O processo de
“mensalão petista/petebista” vai a julgamento, no entanto, antes do “mensalão
peessedebista”, que deu origem ao termo “valerioduto” e que foi instaurado em
1998, há 14 anos, e se arrasta sem data para o início do seu julgamento.
Sem que se pretenda antecipar aqui o(s) julgamento(s) do(s) processo(s), nem
discutir a existência ou não de provas capazes de incriminar os réus indiciados,
o fato de existirem evidências de que há muito tempo vêm ocorrendo desvios e
malversação de recursos públicos e privados para a compra de apoio político em
campanhas eleitorais e no exercício do(s) governo(s) é evidência da necessidade
de se reformular o modo como se fazem maiorias eleitorais (ou seja, como se
ganham eleições) e governamentais (ou seja, como se obtém apoio para governar)
no Brasil.
Com um dos processos eleitorais mais caros do mundo, superior ao dos EUA
relativamente ao seu PIB, e com a existência de um altíssimo número de partidos
políticos com poder de influência e veto no processo decisório, o Brasil vê
proliferar os caixas-dois de campanha (constituídos com recursos públicos
desviados por meio de licitações fraudulentas e por doações ilícitas de
empresas), a compra de tempo no horário eleitoral “gratuito” (por meio da adesão
paga do apoio de partidos de aluguel) e a cooptação sistemática de antigos
adversários e mesmo de tradicionais aliados para garantir apoio ao governo e aos
seus projetos (por meio da liberação de verbas, nomeação de cargos e
distribuição de ministérios e secretarias). Sem maioria, é bom que se relembre,
nenhum presidente terminou seu mandato no Brasil. Getúlio suicidou-se, Collor
foi caçado e Lula sofreria tentativa de destituição.
Estas práticas não são privilégios exclusivos do PT, do PTB, do PR/PL, do
PMDB ou do PSDB e do PFL/DEM. São comuns a todos os partidos no país, pois sem
elas é impossível fazer campanhas eleitorais vitoriosas e, mais preocupante
ainda, obter estabilidade política para governar o país, os estados e os
municípios. Não venham, inclusive, PSOL, PSTU e outros micro-partidos de
esquerda ou de direita afirmarem que com eles é diferente hoje e que com eles
será diferente amanhã. Tanto o PT quanto o PSDB já fizeram as mesmas afirmações,
quando ainda eram pequenos partidos e não integravam governos. Tanto é assim,
que o PSOL já aceitou doações LÍCITAS (afirme-se com letras maiúsculas) do Grupo
Gerdau, contrariando, entretanto, sua determinação original de não aceitar
dinheiro “de empresas da burguesia”.
O que é urgente, além do julgamento dos ditos “mensalões” e da condenação dos
que forem efetivamente culpados da prática de atos ilícitos, é a revisão do
sistema eleitoral brasileiro. É preciso criar mecanismos institucionais que
tornem as eleições mais baratas, que dificultem as negociatas envolvendo apoios
eleitorais e, mais importante, que possibilitem a construção e a
operacionalização de maiorias políticas e governamentais firmadas sobre
programas e não apenas sobre vantagens. Desta forma, será possível acabar com a
necessidade de se aliciar oportunistas políticos que barganham seus apoios a
candidatos e a governos mediante a concessão regular de favores e à liberação
continuada de altas somas de recursos.Sul21
Um comentário:
Tá certo disso sr. gilvan?
To bobo.
Postar um comentário