quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

POBRES MENINOS RICOS




Bristol (EUA) – Um dia conversava eu com um amigo cuja peso aumentava aceleradamente. Ele garantiu-me que “passava fome” e só podia atribuir os números assustadores na balança a um “distúrbio glandular”.

Observei-lhe que a história não registrava casos de obesidade em campos de concentração, o que o deixou abespinhado, porque, além de gordo, era judeu.

Mas os fatos são estes. As probabilidades estatíscas asseguram que muitos portadores de distúrbios glandulares deram com os costados em campos de concentração e todos foram vítimas do axioma inelutável de que quem não come não engorda.

Lembrei-me da conversa ao ver uma história no New York Times em que o repórter Allen Salkin procurava provar que os altos executivos dos grandes bancos americanos não conseguem sobreviver com um salário de “apenas” 500 mil dólares por ano.

Como a maioria de meus leitores deve saber, este foi o limite salarial imposto pela administração de Barack Obama aos banqueiros cujas instituições estão sendo socorridas pelo governo com o dinheiro do contribuinte. A farra vinha sendo tão grande que, apesar de levarem seus estabelecimentos para o buraco, os banqueiros continuavam a receber “bônus de performance” de milhões de dólares.

Tais incentivos não acabaram de todo, mas o governo determinou que só poderão ser resgatados depois dos bancos pagarem o que devem ao Poder Público.

Justíssimo, dirão vocês. Mas Allen Salkin tenta explicar que tais banqueiros se acostumaram com um nível de consumo tão alto que não podem sobreviver com um mero meio milhão de dólares por 12 meses de trabalho.

Ele argumenta que suas famílias (tipicamente, marido, mulher e dois filhos) precisam de ferias duas vezes por ano, uma para esquiar e a outra para se bronzear num litoral chique.

Precisam de uma babá para as crianças. Melhor dizendo, uma babá para cada criança, ao custo combinado de 90 mil dólares anuais.

Botar as crianças em escola pública, nem pensar, embora, como eu explique em meu livro “Com Esperança no Coração”, as escolas públicas em distritos ricos nos Estados Unidos sejam excelentes, por serem sustentadas pelos impostos locais. (O corolário de tal regra é que, nos bairros e cidades pobres, as escolas públicas são antros asquerosos.)

Um apartamento de três quartos nas melhores áreas de Manhattan não sai por menos de um e meio milhão de dólares, com oito mil dólares por mês de condomínio e mais oito mil de amortização da hipoteca. Uma casa de campo é “de rigueur” e a mais mixuruca, na elegante localidade de Southampton, não custa menos de quatro milhões de dólares.

E o chofer? Taix executivos “precisam” de um chofer que seja também guarda-costas, o que significa um ex-policial, com direito de porte de arma. Salário anual: 125 mil dólares.

Não podemos esquecer os bailes de caridade. São três ou quatro por ano e as mulheres dos banqueiros prefeririam morrer a serem apanhadas dentro do mesmo vestido. Preço de cada um: entre dez e 15 mil dólares. Precisam também, é claro, de um “personal trainer” a 80 dólares por hora, três vezes por semana, para manterem a silhueta.

Em suma, uma história compungente. Assim como meu amigo gordo, tais banqueiros sofrem de uma peculiar forma de distúrbio glandular. É-lhes impossível mudar, seja de moradia, seja de hábitos. Como deixar de comer naquele restaurante caríssimo?

Li o artigo de Allen Salkin e, por coincidência, no dia seguinte, ouvi-o em uma entrevista na rádio. Ele disse que vinha recebendo e-mails dos leitores “a cada 15 segundos”. Todos com imprecações.

Alguém se admira?
José Inácio Werneck, Direto da Redação.

Nenhum comentário: