Asiáticos foram estrelas mais assediadas, mas caso brasileiro tornou-se tema de debate
Por Sergio Leo, no jornal Valor Econômico
Por Sergio Leo, no jornal Valor Econômico
As estrelas emergentes mais assediadas foram os asiáticos no Fórum Econômico Mundial, que terminou ontem, na Suíça; mas o Brasil ganhou um prêmio de consolação: o país transformou-se em exemplo de sucesso, não só no desempenho econômico, como na regulação bancária, no uso de combustíveis renováveis, na conciliação de crescimento com distribuição e renda e até na aplicação de regras de proteção à saúde e ao ambiente dentro da Organização Mundial de Comércio (OMC).
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cancelou a viagem que faria para receber o inédito prêmio de Estadista Global e foi representado, na sexta-feira, pelo chanceler Celso Amorim. O ministro era esperado, também, para participar da mesa que discutiria, no sábado, as relações entre comércio e ambiente; não foi, mas mesmo assim o Brasil e o próprio ministro foram tema do debate. Logo no início do painel, o mediador, o professor de Harvard Robert Lawrence, lamentou a ausência de Amorim, ao ouvir críticas a barreiras comerciais contra produtos “verdes”.
“Se o ministro Amorim estivesse aqui, nos lembraria da taxa nos Estados Unidos sobre o etanol brasileiro”, comentou, sorrindo. Mais adiante, no debate, foi o próprio secretário-geral da OMC, Pascal Lamy, quem usou o Brasil como modelo, ao argumentar que a organização já abriga regras de proteção ambiental e solução de conflitos nesse tema. “Sugiro que consultem na página da OMC a seção de solução de controvérsias e vejam o caso de Brasil e União Europeia sobre pneus remodelados”, disse Lamy.
Ele se referia à recente vitória do Brasil no caso em que a UE contestou as barreiras brasileiras à importação de pneus usados e remodelados, um dos primeiros casos bem-sucedidos na OMC a reconhecer a legalidade de barreiras comerciais em caso de risco à saúde pública. O ministro do Comércio da Índia, Anand Sharma, habitualmente um crítico do uso de alimentos como combustível, teve cuidado de classificar o álcool brasileiro como exceção – seguindo um apelo constantemente feito pelas autoridades brasileiras.
Amorim, que ao chegar a Davos disse que a discussão de comércio “está ficando chata”, participou com Lamy de uma reunião, às margens do Fórum Econômico, para discutir as chances de retomada da rodada de liberalização comercial da OMC conhecida como Rodada Doha. Não teve muito sucesso, porém, em convencer outros governos a elevar a discussão para os presidentes.
Tema obrigatório no passado, o livre comércio mundial, como notaram os participantes do Fórum, ficou praticamente excluído dessa versão do encontro, a não ser pelas discussões relacionadas a clima e comércio de carbono. Um dos motivos desse lapso é o desinteresse americano, que motivou outra ausência mais lamentada em Davos que a falta forçada de Lula: na delegação dos EUA, não havia autoridades de alto nível, além do principal conselheiro econômico da Presidência, Lawrence Summers.
Foi em outro assunto multilateral, a polêmica reforma do sistema financeiro, um dos principais temas do Fórum neste ano, que se sentiu mais fortemente o isolamento dos EUA. Desde antes do início do encontro, banqueiros indicaram que queriam aproveitar o evento para criticar o pacote de punição e controle dos bancos lançado pelo presidente dos EUA, Barack Obama. No que se tornou um dos principais debates do Fórum, as referências ao pacote foram frequentes, às vezes diretamente, às vezes sob expressões como “resposta emocional” ou “populismo”.
Enquanto os bancos e economistas discutiam se dariam certo medidas como a fragmentação de bancos para evitar riscos sistêmicos (pouca gente acredita nisso, lembrando que o Lehman, falido em 2008 e catalisador da crise, não era banco comercial), autoridades e aliados de Obama, como o financista George Soros, reconheciam que o pacote americano era ou precipitado ou insuficiente ou ambas as coisas, ainda que esteja na direção correta. Em um debate sobre o futuro da regulação financeira, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, deu lição de moral a grandes banqueiros presentes, que reclamavam do risco de uma “super-regulação” capaz de afetar a vitalidade do sistema bancário mundial.
“Todos os produtos financeiros que oferecem risco têm de ser contabilizados e gerar reservas de capital”, defendeu Meirelles. A pedido de um dos integrantes da mesa, ele informou que, no Brasil, tanto operações com chamados derivativos têm controle mais estrito que nos países desenvolvidos como os acionistas respondem com o próprio patrimônio, diferentemente da situação dos países ricos, comparada, durante o debate, à de um cassino sem freios.
A situação descrita por Meireles não é, na verdade, exclusiva do Brasil. É regra nos países da Ásia e da América Latina, que reforçaram as regras de segurança bancárias após as crises das dívidas das décadas de 80 e 90. “Os problemas do passado fizeram os países abraçarem regras financeiras mais estritas, o que é muito melhor”, comentou, em um dos debates de Davos, o ex-presidente do Banco Central mexicano Guillermo Ortiz. Por sua relativa impermeabilidade à crise, China e Índia – e não o Brasil – foram parte do painel nobre de encerramento do Fórum, quando o representante chinês se deu ao lixo de apontar o risco de calote na dívida pública na Europa como um dos principais riscos atuais.
Nas discussões entre as empresas privadas, que lamentavam a situação atual de restrição e alta seletividade de crédito, que coloca empresas pequenas e médias nos EUA sem financiamento, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, também pôde fazer pose. “O que há é mais seletividade. Em pleno janeiro de 2009, captamos US$ 6,5 bilhões no mercado privado”, informou o executivo.
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