quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O velho filme das denúncias eleitorais


O roteiro é conhecido, o filme é velho, mas continua a ser exibido a cada quatro anos, quando se anunciam mudanças políticas no Brasil. É um filme B, de candidatos a canastrão, de poucas locações, mas ainda assim caro, muito caro, pelo preço cobrado e pelas repercussões na vida econômica do Brasil. É uma película grossa, repleta de truques manjados, repetidos à exaustão, sem qualquer voo tecnológico ou design de jornadas nas estrelas, mas ainda assim eficaz como uma armadilha de sexo, cujo final é sempre conhecido, mas ainda assim sedutor.


Os mais maduros já viram. Assim como neste setembro de 2010, quando aparece a denúncia do vazamento do sigilo da pulcra filha de Serra, cuja pulcritude não conseguiu arrancar votos de Dilma, apesar do reforço da pulcríssima candidata Marina... assim como nestes últimos dias, quando surgiu mais um escândalo, desta vez para responsabilizar a Casa Civil do governo Lula, utilizando a ponte do filho da substituta de Dilma, que não está mais do governo, mas “aí tem coisa”, pois os links se fazem com lances de ilusionismo, não custa lembrar a última exibição desse arrasa quarteirão da guerra política.


Em setembro, Lula, que estava próximo a ganhar as eleições no primeiro turno, recebeu um golpe desse filme em 15 de setembro de 2006. O dia desse clássico da velhacaria não é certo. Mas o título, sim. Na sua versão de 2006, ficou conhecido “O escândalo do dossiê”. O certo é que em 16.09.2006 a Folha de São Paulo denunciou:


“PF prende petistas acusados de comprar dossiê anti-Serra


A Polícia Federal apreendeu ontem US$ 248,8 mil e R$ 1,168 milhão (R$ 1,7 milhão), em um hotel de São Paulo, em poder do petista Valdebran Carlos Padilha da Silva, empreiteiro mato-grossense, e de Gedimar Pereira Passos, advogado e ex-agente da PF. Eles estavam intermediando a compra de vídeos, fotos e documentos que mostrariam suposto envolvimento dos candidatos tucanos Geraldo Alckmin e José Serra com a máfia dos sanguessugas.”


A duas semanas do primeiro turno de 2006, um raio de Cecil B. DeMille riscou os céus do Brasil. A hipocrisia e a malandragem se juntaram em uníssono. Com espaço aberto em toda grande imprensa, instigados, como dizem os jovens hoje, vieram as vozes dos varões de Plutarco:
“Pega ladrão! (A chantagem eleitoral de Lula)

JORGE BORNHAUSEN


SURPREENDIDO, o ladrão antecipa-se ao alarme e grita: "Ladrão!


Pega ladrão!". Mistura-se aos seus próprios perseguidores e se livra da polícia. (Ou então, numa variável da cena, usada como cortina cômica dos picadeiros de circo de antigamente, o ator que faz o papel do descuidista ou do sedutor apanhado em flagrante de adultério grita "Fogo! Fogo!", e aproveita a confusão pra fugir.)...


Heloísa compara PT a facção criminosa por elo com dossiê


COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM GOIÂNIA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA


A candidata do PSOL à Presidência Heloísa Helena classificou o PT como "organização criminosa" ao comentar, ontem, a participação de membros do partido na compra de dossiê contra tucanos....


É mais prático afastar Lula, diz Alckmin


O candidato do PSDB a presidente, Geraldo Alckmin, afirmou ontem, quando questionado sobre a série de demissões no PT e no governo provocadas pelas crises políticas, que é ‘mais prático afastar o Lula’.
Cinco ministros afastados, indiciados, denunciados, a direção do PT envolvida em escândalos, agora um novo. Eu acho que tem que afastar o Lula, é mais prático”.


Mas faltava para a televisão a imagem escandalosa do crime. No dia 29 de setembro, pela versão da mídia, uma “pessoa” (o criminoso em off) entrega aos jornalistas um CD com as fotos do dossiê. O Delegado da Polícia Federal de São Paulo, Edmilson Pereira Bruno, declara que foi vítima de furto, ao contar que as fotos vazadas foram roubadas de sua sala. Na verdade, desde 28 de setembro as fotos das pilhas de dinheiro haviam sido tiradas pelo próprio delegado. Em seguida, como se não soubesse de nada, deu entrevista dizendo que abriria investigação para descobrir como as fotos foram parar na imprensa.


Era tudo de que precisava o filme do escândalo. O Jornal Nacional, no dia 29 de setembro, dois dias antes das eleições do primeiro turno, deu o furo, previsível, programado, das pilhas do dinheiro dos “petistas”. E Lula foi para o segundo turno.


Esse é o enredo, o roteiro. Esperamos não ter desta vez, nestes tempos da web livre, mais um campeão de audiência.


Urariano Motta, Direto da Redação

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