Mauricio Dias
A presidenta Dilma Rousseff aproxima-se do centésimo dia de governo. A data é antecedida pela inquietação que afeta setores do Partido dos Trabalhadores. Uma angústia que se reflete na bancada petista do Congresso, que, por sua vez, transmite o desassossego embutido em dúvidas correntes nas bases do PT.
Centésimo dia é data emblemática. Sugere, por exemplo, o balanço do que tem sido feito até agora. Embora seja um tempo curto demais para julgamentos profundos, permite, no entanto, delinear contornos das ações que marcaram esse começo, indicativas dos rumos seguintes.
O mais forte sinal seria, segundo os descontentes, a desidratação na identidade ideológica de esquerda, mantida ao longo do governo Lula. Isso, não por acaso, teria fortalecido a influência do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci.
Ao contrário de Lula, a sucessora é que tem vínculos históricos com a esquerda, mas a presença de Palocci contrasta com a ausência de quadros de influência no governo Lula, a sinalizarem um viés político mais à esquerda. As figuras mais citadas são: Celso Amorim, Franklin Martins, Luiz Dulci e Marco Aurélio Garcia, o qual, embora mantido no Planalto, teria perdido parte do seu peso de conselheiro influente.
Essa agitação, em razão de outros problemas, se alastra por diversos setores da base governista. Nesses casos, é sequela da queda de braço na fixação do novo salário mínimo que deixou desnorteado o titubeante ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Somem-se a isso o aumento da taxa de juros e o corte de 50 bilhões de reais no Orçamento.
Existe dificuldade entre os petistas para assumir as alianças que levaram Dilma ao poder. Desta vez há um parceiro forte que, desde o início, marcou como ponto fundamental do acordo político-eleitoral a partir da indicação do candidato a vice.
Nas entranhas do PT há reflexo a partir de mudanças expressivas nas ações da chancelaria desde a restrição da violação dos direitos humanos no Irã. A objeção é estranha. Como sustentar a condenação da violação dos direitos humanos, durante a ditadura no Brasil e se omitir quando isso ocorre além-fronteira? Observe-se que a presidenta também se referiu a Guantánamo.
Os murmúrios de insatisfação também aludem a um pretenso realinhamento com a política externa americana, em oposição às relações com a Venezuela.
A rigor, a referência feita por Dilma às violações cometidas pelos americanos contrasta com essa suposição. Sabe-se, porém, que depois de receber Obama, visitante iminente, a presidenta irá à Venezuela para encontrar-se com Chávez.
A mineira Dilma não se aproxima depressa demais desse país para não criar açodamento, mas, também, nem tão devagar para evitar distanciamento.
Embora tenha deixado para trás os tempos do “assembleísmo”, alcançando com Lula o poder máximo do País há oito anos, o PT ainda guarda uma estreita relação com os movimentos sociais que sempre exigem prestação de contas. Ao fim, é o ingrediente mais importante nesse fermento que se forma no partido.
Os petistas estão escabreados com a corte que, no momento, a mídia faz a Dilma. Eles ainda guardam as marcas deixadas pela “guerra suja” em que foi transformada a campanha presidencial em outubro de 2010.
Essa reação projeta, certamente, o receio de que a regulação dos meios de comunicação, guardada com zelo pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, seja esquecida pelo caminho. Essa é uma medida necessária para fortalecer a democracia e não para coibir a liberdade de expressão.
Mauricio Dias
Maurício Dias é jornalista, editor especial e colunista da edição impressa da Revista CartaCapital.
2 comentários:
Estou achando muito bom o governo da Dilma exatamente porque não é ideológico, não é ressentido e não faz alarde. E que continue assim.
Carlos, certo.
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