As eleições que estão em curso entre nós permitem diversas análises e, para usar a palavra da moda, fornecem indícios bastante significativos. O primeiro deles parte das expectativas dos direitistas de plantão de que o julgamento do “mensalão" – estrategicamente colocado, com requintes cirúrgicos, no meio do processo eleitoral – levaria à derrocada das forças políticas de esquerda, convenientemente confundidas com a corrupção. Afinal, há robustos indícios de que os elitistas de sempre, com uma mãozinha do STF, tenham imaginado pôr fim a tantos projetos de inclusão social, com tanta gente saindo da pobreza, tantas pessoas comendo e estudando mais e (pasmem !) até poluindo os aeroportos do país...
Mas as urnas acabaram fornecendo outros indícios. Um deles: o de que o povo brasileiro parece estar aprendendo a ler nas entrelinhas e não aceita as falsas generalizações que buscam fabricar uma verdade conveniente. Com toda a propaganda antigovernista que o “mensalão” permitiu – em fragrante agressão ao rigor que usualmente cerca o período eleitoral – amplificada por uma mídia comprometida que controla a comunicação no país, o resultado das eleições mostra que os programas das esquerdas, uma vez mais, obtiveram a aprovação popular. O partido com maior número de votos foi o da Presidenta Dilma e o do ex-Presidente Lula, os partidos que mais perderam foram, até aqui, as agremiações neoliberais de direita, sendo que o DEM, em breve, ao tudo indica – vai despedir-se do cenário político, sem pompas e circunstâncias...
Todo o processo eleitoral deixou, assim, claros indícios de manipulação por parte dos órgãos de comunicação (esses, que vivem às custas de concessões governamentais e gordíssimas verbas de propaganda oficial que, um dia, esperamos, venham a ser extintas ou destinadas aos interesses do povo). A pauta da mídia hegemônica, capitaneada por segmentos da elite e alicerçada em comprometidos analistas políticos, esmerou-se em estabelecer a ideia de que , nas eleições, se estaria julgando Lula e, por tabela, o governo Dilma. Agora, como os resultados não foram os esperados, levantam a tese de que eleições municipais não se vinculam ao cenário federal, constituindo apenas uma radiografia de situações regionais específicas. É engraçado verificar as contradições malandras nessa teses todas, porque é nítida a atual intenção de glorificar nacionalmente o tucano Aécio e o político pernambucano Eduardo Campos, até apelidado de “noiva da vez” por essa imprensa traiçoeira.
Há indícios, sim, que as eleições repercutem o cenário maior da política nacional. Isso é inegável, por exemplo, em São Paulo, onde teremos o embate entre um político novo no cenário – cujas causas são totalmente opostas às do vetusto Serra que, pelo que se pode perceber, corre o risco de um inglório fim. Nítida influência de Lula, dizem agora os mesmos que esperavam o ocaso do“partido do mensalão e seu chefe”. Haddad, para essa turma, agora é um “novo poste”guindado à política pelas artes do ex-Presidente. Mas há indícios de que esse poste pretende iluminar a mesma estrada onde já brilha um outro, que o lulismo também “inventou”, e que hoje tem mais de 70% de aprovação popular...
Voltando ao “mensalão”, e obedecendo ao “script” que o quis vincular ao processo eleitoral, há marcantes indícios de que tudo isso vai acabar constituindo um autêntico tiro no pé daqueles que hoje enchem as páginas dos jornais e os noticiários globais. Com repercussões eleitorais, sim, mas não para agora, e sim para daqui a dois anos... Afinal, o que se espera a partir de agora é que esse mesmo tribunal que tanto se esmerou em buscar argumentos para condenar por indícios, continue a sua “cruzada pela ética”. Espera-se, assim, que, por justiça, se utilizem da mesma jurisprudência para investigar e punir com igual rigor os outros mensaleiros – os do PSDB de Minas -, a turma do Arruda em Brasília, os marginais da cachoeira do Demóstenes e, por que não, eventuais piratas da privatização... Se isso não acontecer, teremos alarmantes indícios de incoerência da justiça maior em face da política menor dos interesses dos ricos e do mercado. E aí, das duas uma: ou ficará definitivamente desmascarada essa “aura”de retidão de que os vestais demotucanos pretendem cercar-se, ou ficarão claros os objetivos estratégicos do atual justiçamento, com suas perigosas teses de condenação por “fortes indícios” (confundidos com provas cabais), a propalada “teoria do domínio do fato” e a atribuição do “ônus da prova por conta do acusado”.
Não resisto a uma citação de versos que têm sido erroneamente atribuídos a Bertolt Brecht, mas cuja discussão sobre autoria e exata tradução é pouco importante diante da inquietação que provocam:
“Primeiro levaram os comunistas, / Mas eu não me importei / Porque não era nada comigo./
Em seguida levaram alguns operários, / Mas a mim não me afetou / Porque eu não sou operário. / Depois prenderam os sindicalistas, / Mas eu não me incomodei / Porque nunca fui sindicalista. / Logo a seguir chegou a vez / De alguns padres, mas como / Nunca fui religioso, também não liguei. / Agora levaram-me a mim / E quando percebi, / Já era tarde".
Se, contudo, houver alguém que não entenda o porquê da citação, posso trocar os versos por um delicioso ditado popular, em reverência ao saber do povo: “O pau que dá em Chico dá em Francisco”...
Rodolpho Motta LimaAdvogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.Direto da Rdação
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