quinta-feira, 1 de outubro de 2009

DIPLOMACIA COERENTE



O governo golpista de Honduras se mostra cada dia mais fraco, à medida que revela o seu caráter ditatorial, e a evolução política dos fatos dá sinais de que um entendimento com o presidente legítimo Manuel Zelaya será necessário, o que parecia inconcebível nos primeiros momentos do golpe.

Para quem iniciou o conflito tirando o presidente do palácio, de pijama, sob a mira de um revólver, e o colocando em um avião para outro país, a situação só se deteriorou. As manifestações pró-Zelaya não foram interrompidas, o repúdio da comunidade internacional foi unânime, o presidente voltou ao país e a declaração de estado de sítio afastou aliados originais da conspiração.

O presidente golpista Roberto Michelletti fica cada vez mais isolado e desmoralizado. Impediu missão da OEA de entrar no país e tentou dar um ultimato ao Brasil, que abriga Zelaya em sua embaixada, recebendo de Lula uma resposta exemplar: “O governo brasileiro não acata ultimato de um golpista e nem o reconhece como governo interino. O governo brasileiro não negocia com ele.”

O Brasil atua em defesa da democracia na América Latina e contribui para barrar um golpe que poderia estimular a volta do velho hábito que sempre marcou a política do continente. Neste sentido foi também exemplar a resposta do chanceler Celso Amorim ao senador tucano que manifestou temor de que a diplomacia brasileira fique refém da crise em um “pequeno país”. “O que está em jogo não é só um pequeno país da América Central, mas o destino da democracia na região. A tolerância a um golpe de Estado poderia inspirar outros golpes”, disse Amorim.

A diplomacia brasileira sustenta o papel de liderança regional do país, como fez recentemente na crise entre Venezuela e Colômbia e em outros conflitos após a redemocratização do continente. Ao condenar o golpe em Honduras desde o seu primeiro momento e arcar com o ônus de abrigar Zelaya em sua embaixada, o Brasil não fugiu à responsabilidade de atuar diretamente para a volta da normalidade política ao país.

Esta é a questão de fundo e não as condenações a Zelaya de ameaçar a democracia no país ou a inversão de valores de grande parte da mídia, que preferiu colocar o papel do Brasil na berlinda, chegando a defender o golpe de Estado como restaurador do processo democrático em Honduras.

Neste aspecto é importante retomar a história desde o início. A proposta de Zelaya era promover um referendo para saber se a população concordava que nas eleições de novembro fosse colocada uma nova urna, na qual os eleitores decidiriam se aceitavam ou não a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte para alterar a Constituição.

Ou seja, o povo iria responder se concordava ou não com a consulta em nova urna. Se não concordasse, a idéia morria, se concordasse, a urna estaria nas eleições de novembro. Mais uma vez, o povo decidiria, em voto secreto, se concordaria ou não com uma Constituinte para alterar a Constituição. Nada estava assegurado. Além do mais, Zelaya não se beneficiaria de uma possível mudança, pois as eleições de novembro também elegeriam um novo presidente. Este sim, poderia vir a se reeleger se todo o processo fosse adiante. É importante frisar que a Constituição de Honduras prevê a consulta direta ao povo por iniciativa do presidente da República.

O que aconteceu a partir daí foi um golpe de Estado clássico, repudiado pelos fóruns internacionais, como a ONU e a OEA, e para cujo fim o Brasil colabora de forma consistente, ao contrário da dubiedade dos Estados Unidos, que num dia classifica a volta de Zelaya ao país como importante para uma solução negociada e no outro a tacha de irresponsável.

Mair Pena Neto, Direto da Redação.

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