domingo, 10 de agosto de 2008

TORTURADORES X TORTURADOS

Arma letal de Brutus


Mauricio Dias

A reabertura do debate sobre os crimes da ditadura militar mostra, mais uma vez, que é inútil esconder lixo sob o tapete.

Um recuo de quase 30 anos na história lança luzes sobre o ponto de conflito no qual estamos hoje. De um lado, um grande contingente de militares da reserva sonhadores da ditadura. Do outro, civis açodados e amedrontados dispostos a submeter a República a princípios não republicanos.

A anistia, de 1979, não nasceu de uma imposição ao poder, a partir de um movimento que tivesse empolgado e mobilizado a sociedade brasileira. E, pelo caráter político da questão, não era de esperar que fosse assim. A ação ficou restrita a um corajoso grupo de pessoas em que, aliás, as mulheres tinham proeminência. A anistia, que beneficiou os torturadores, nasceu de um cálculo político do poder. Um lance de antecipação política a um movimento que mais tarde irromperia inapelavelmente de baixo para cima com força incontida. O símbolo dessa transição transacionada é o mote tirado de um discurso do general Ernesto Geisel ao se referir ao processo de abertura política: “Distensão lenta, gradual, porém segura”. O ditador impôs o ritual para o funeral da ditadura.

Diferentemente do que aconteceu nas vizinhanças (Argentina e Chile, por exemplo), os militares brasileiros negociaram a saída do poder enquanto ainda dispunham de força. Encontraram, para isso, interlocutores condescendentes com os quais transacionaram. Prova disso foi a luta para ampliar o alcance da anistia que, inicialmente, excluía os chamados crimes de sangue. A proposta inicial do governo do general Figueiredo era a de analisar processo por processo.

Nesse ponto, a questão ganha maior relevância e distinção. Houve um toma-lá-da-cá entre as partes. Assim, a anistia nasceu com um aleijão ao incluir os torturadores como beneficiários. Eles foram alcançados pela extensão da anistia aos chamados “crimes conexos”. Em nome disso, os militares têm ao longo do tempo sonegado informações à sociedade. Guarnecem os arquivos da ditadura onde estão relatadas as histórias de vítimas que deixaram filhos órfãos e mães aflitas sem saber o que se passou com eles nos porões do regime. Muitas famílias ainda têm esperança de enterrar seus mortos.

A decisão da anistia equiparou os algozes às vitimas. Mas há uma diferença clara entre eles. O crime político, incluindo os de sangue, contém uma virtude. Shakespeare a apresentou no discurso de Brutus ao justificar o uso do punhal contra a tirania.

“Todos nós nos levantamos contra o espírito de César e no espírito dos homens não existe sangue.”

Não há lei capaz de igualar torturadores e torturados.

Comentário.
Igualar torturadores e torturados é a mesma coisa que igualar o bandido e a vítima.Não tem cabimento.

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