sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

HERDEIRA DA TERNURA




Para encerrar o encontro dos quatro presidentes latino-americanos que na quinta-feira 29 falaram a um ginásio repleto de militantes de movimentos sociais os músicos do cerimonial entoaram o grande hit da esquerda latinoamericana. A música, composta em 1965 por Carlos Puebla, é um verdadeiro hino para quem idolatra Che. Aqui, no Fórum Social Mundial, são milhares. Lá, no ginásio cheio de militantes, eram todos. A começar dos chefes de estado.

A música começa assim: "Aprendimos a quererte / desde la histórica altura / donde el sol de tu bravura / le puso un cerco a la muerte" e, na segunda estrofe vem o refrão, que emociona fácil: "Aquí se queda la clara / la entrañable transparencia / de tu querida presencia / Comandante Che Guevara", e por aí segue.
Assim que a música começou, chamaram ao palco uma senhora um pouco gorduchinha, de cabelos ruivos, pele rosada e rosto redondo: é Aleida Guevara, a filha de Che. Amiga de João Pedro Stedile, ela está presente no FSM e participou da agenda de comemorações dos 25 anos do MST. Ovacionada, cantou junto com o ginásio e os presidentes, contribuindo para tornar aquele momento especial. "Sangue do sangue de Che", às vezes, é assim que a apresentam para as platéias. Piegas, mas quase inevitável.


Por onde anda, a toda hora alguém pede para tirar fotos com Aleida. Mesmo cansada, ou mesmo exausta, ela não nega as fotos, nem um sorriso pequenino em seu rosto arredondado. Aleida tem o canto de fora das sobrancelhas caidinho para baixo, o que a faz parecer o tempo todo complacente e carinhosa. Na foto mais reproduzida do século XX (ou entre as mais, vá lá), pode-se ver as mesmas sobrancelhas caidinhas no rosto seu pai, Che. Mas, no semblante do "Comandante", há muito mais dureza, aspereza, secura. Além de posar para inúmeras fotos, sem reclamar, Aleida é generosa também com jornalistas, às dezenas, que lhe pedem uma palavrinha. Foi o que fiz. Ao que ela respondeu com um sorriso.


CartaCapital: Como você lida com todo esse assédio?


Aleida Guevara: Em Cuba, o povo me quis desde o meu primeiro momento de vida. E eu cresci com o compromisso de devolver esse amor. Para mim, é muito tranquilo. Aqui, no Brasil, o povo é humilde, são gente quase sempre muito humilde, nisso se parecem com o povo cubano. Me sinto igual a eles.


CC: Mas você não parece muito afeita a fazer grandes discursos, nem a incitar palavras de ordem.


AG: Eu falo o que quero. Sei que algumas pessoas vão escutar, outras não. Simplesmente tento aproveitar as oportunidades para dizer o que me toca.


CC: O que mais mudou nesses 25 anos do MST?


AG: A cada ano que passa, as consequências da política neo-liberal se tornam mais perversas. A situação de miséria e pobreza que vi no Pará, na região de Marabá, é um exemplo claro de como a política neo-liberal faz vítimas. Nesse contexto, o MST é importantíssimo porque alcança essas pessoas, traz consciência social e isso é fundamental para qualquer mudança.


CC: O que você espera de novo em Cuba, a partir da eleição de Barack Obama?


AG: Nada de mais.
CC: Que te pareceu ele ordenar o fechamento da prisão de Guantánamo?
AG: Ele deveria é nos devolver Guantánamo, isso sim. O mais importante seria devolver a base, que é parte do território cubano. Fechou a prisão, fez bem, mas isso não é o mais importante.

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