Ricardo Giuliani Neto
Estava muito decidido a escrever a coluna de hoje sobre algum tema de direito. Tantas coisas na cabeça, tantas polêmicas correndo por aí. Estava preparadíssimo, pois, nesta semana, participei dum debate na TV tratando do tema segredo de Justiça. Os artigos da lei e da Constituição, todos fresquinhos. As combinações, a exegese recomendada, as profundezas da linguagem jurídica, a jurisprudência e a prática do STF (Supremo Tribunal Federal), os princípios constitucionais e, lógico, pitadas de política; finalmente uma coluna genuinamente jurídica, um texto de Justiça.
Ouço coisas a propósito de segredo e de Justiça; os cabelos restantes, ficam em pé. Pergunto-me por segredos e me procuro por justiças...
Pra que Deus devo rezar?
A mídia —sempre a mídia— insiste em afirmar que a atribuição dessa garantia constitucional à imagem, presta-se à impunidade, pois, o manto do segredo, retiraria dela mídia a possibilidade de fazer justiça.
Afirmo o direito à informação como não-direito à prévia condenação. Discutiria a presunção de culpa contra servidores públicos e políticos, sem preocupações com o esporte nacional de jogar “pedra” na Geny.
Quem opta pela política, em que pese ter o dever de abrir-se para a sociedade —inclusive em sua vida privada— não faz a opção pela meia cidadania. Como explicar isso para um povo cada vez mais cansado dos seus políticos?
Lá vou eu, segredos e Justiça... com que livro devo rezar?
Malas, trecos, livros e jornais, processos. Carne pro assado, erva pro mate e, buenas, terçando argumentos pro mundo: lá está, inciso LX do artigo 5o, a regra é a publicidade para a prática dos atos processuais. Não me venha de borzeguins ao leito! O segredo protege o cidadão. A Justiça decide quem merece ser protegido.
Quantos segredos guardados por aí? Tantos Deuses ainda não escolhidos...
A cabeça, andando e andando; escrever nesta revista é uma senhora responsabilidade. “Nossos leitores devem estar cheios das minhas histórias, quase sempre tangenciando a Justiça”, penso.
Deparo-me co´a Folha de S.Paulo de 07 de janeiro. Horror!!! A foto da capa é o inferno.
O pai com o fruto no colo. Inerte como nós outros diante da tragédia no oriente médio. Um rostinho cinza de escombros. Bluzãozinho marrom tingido de terra árabe. Tristeza. Cheiro de pólvora. Frio... Há um frio vertendo do rosto do anjo.
Quero jogar calor e fogo nos corações da humanidade... aquecê-la... libertá-la do silêncio construtor de túmulos... não quero escurecer, mas vou... e escureço.
Cálculos congelados deixam tantos rostinhos sem cor. Essas carinhas não sabem o que é Hamas, não sabem o que é Israel, não sabem do que somos capazes. Inda bem que não sabem!!!
A face da menina morta é azulada, quebrantada tão-somente pela mecha de cabelos vermelhos do sangue. A tragédia se eleva diante dos bracinhos cruzados sobre a impotente armada paterna... vai... dorme o sono sem volta. Os braços que te acalentavam ontem, hoje, só podem formar o teu último berço.
Os olhares que te envolvem não te podem devolver a vida. Volta! Volta! Sei que não podes cumprir meus desejos... Os olhares estão atônitos... morridos pelo esgotamento da tua vidinha captada em luz e sensibilidade humana por Fadi Adwan da Associated Press.
És uma criança morta!!! Judias ou Palestinas, somente crianças... anjos...
As mãos te afagam; saudades do que te carrega, lágrimas e um caminho que te levará, anjo, prum céu onde não sabes qual Deus te receberá. Para qual Deus rezarás? Será que a guerra conseguirá definir para qual Deus devemos rezar? Em que livro vamos rezar? Será que os vencedores da guerra determinarão os nossos segredos e as nossas justiças?
Tantas noites te ajoelhastes no soalho, juntastes as mãozinhas e no teu secreto segredo olhastes pro céu e pro teu Deus escolhido e entregastes os teus sonhos?
Agora querem, na guerra, descobrir os teus segredos?!
Dor de inocência morta, cinza, rostinho azul de inocência perdida e um cobertor vermelho, flanando sobre teu corpo gelado a te presentear o calorzinho tardio.
Quando os anjos choram, chove. Assim diz a música da latino-américa.
Tenham a certeza, há tormentas e aguaceiros. Aguaceiros áridos como a terra de judeus e palestinos. Milhares de anjos, palestinos e judeus, choram naquelas guerras estúpidas.
Aguaceiros imaginários, tormentas simplesmente sentidas e grandes corações calados.
Do choro das crianças mortas não vertem lágrimas. Do choro de crianças mortas, não vertem lágrimas... não vertem lágrimas...
Um mundo sem lágrimas não é capaz de descobrir segredos e de distribuir justiças.
Que vertam, então, as nossas, se é que ainda somos capazes de chorar.
Segunda-feira, 12 de janeiro de 2009
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