quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

É PROIBIDO SER POBRE

Publicada em:14/01/2009


Abro O Globo pela manhã e tomo um susto com a manchete: ‘Prefeito baixa decretos para conter a expansão das favelas’. Logo abaixo, um novo espanto: ‘Ordem em Ipanema’. Entre outras medidas que me remetem aos tempos áureos do fascismo (ou nazismo, como queiram) passo a acompanhar as primeiras movimentações do novo prefeito do Rio, Eduardo Paes, na abertura do ano novo. Mas em dias anteriores, logo após tomar posse no cargo, Paes atacou mendigos, elementos sem-teto, camelôs em vários locais da cidade e construções sem autorização da prefeitura.

Em poucas e resumidas palavras, Eduardo Paes, com seu slogan ‘Choque de Ordem’, deixa entender que dentro de pouco tempo irá proibir a presença e a moradia de pobres na Cidade Maravilhosa. Ou seja, o cidadão vai morar na favela porque quer e acha bacana, dorme ao relento porque é mais confortável e pede esmolas nos cruzamentos e sinais porque não quer trabalhar de cadeira de rodas, sem pernas ou um dos braços, ou velhos demais. Tudo isso me remete aos livros que li sobre Adolf Hitler (1899-1945) e Benito Mussolini (1883-1945) nas ditaduras da Alemanha e Itália.

Não faz muito tempo, escrevendo uma matéria sobre a origem dos principais clubes de futebol do Rio, todos eles do início do século passado, descobri algumas coisas curiosas. A abertura da Avenida Central (hoje Rio Branco), com centenas de demolições de casas, provocou o surgimento da primeira favela do Rio, no Morro da Providência, perto da Central do Brasil. As moradias improvisadas cresceram quando a construção que abrigava os aleijados da Guerra do Paraguai (1864-1870) caiu por terra na Rua General Severiano, em Botafogo, e, mais tarde, com a aparição da Avenida Presidente Vargas, que deixou a Candelária de costas para o público.

Mas o prefeito Pereira Passos (1836-1913), com o bota-abaixo para surgir a Avenida Central, não foi o único a estimular o surgimento de mais favelas. Carlos Lacerda (1914-1977) passou o rodo em muitas delas, como Catacumba e Esqueleto, remetendo os pobres para locais na época distantes, como a Cidade de Deus, e forçando, na ordem inversa de seus planos, a criação do Morro do Vidigal, o incremento assustador da Rocinha e a aparição das favelas no Leme, Copacabana e Ipanema, além das que margeiam as linhas Vermelha e Amarela, onde os tiroteios são freqüentes.

Ninguém, rigorosamente ninguém, vai derrubar árvores da Mata Atlântica para erguer um barraco no Morro do Chapéu Mangueira, no Leme, ou no Morro dos Macacos, em Vila Isabel. Todos querem ficar próximos aos locais de trabalho ou onde possam exercer a profissão de camelôs ou de vendedores ambulantes nas praias, do Leme ao Pontal, como na música de Tim Maia (1942-1998). E, tenho certeza, não será Eduardo Paes, com seu ‘Choque de Ordem’ que vai acabar com as favelas do Rio de Janeiro.

(*) E na contramão da pobreza surgiu o dinheiro fácil do tráfico, bancado pelos barões nacionais e internacionais e estimulado pela classe A.
Roberto Porto, Direto da Redação.

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