terça-feira, 10 de agosto de 2010

Serra só sabe falar o paulistês

Quando o sotaque é o problema


Juliana Cipriani e Daniela Almeida

Correio Braziliense - 10/08/2010

Em três estados, José Serra deixou de responder a perguntas alegando que não entendia o jeito de falar da imprensa local.

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, parece ter dificuldade em entender o que dizem os brasileiros ou inventou uma nova estratégia para evitar responder a perguntas que não o agradam. Em suas viagens pelo Brasil em busca dos votos, o tucano não tem conseguido ouvir ou compreender o que dizem os jornalistas da imprensa local. A alegação? Segundo ele, o problema está no sotaque.

Até agora, Serra teve problemas em Minas Gerais, em Goiás e em Pernambuco. Em meados de julho, quando fez campanha em Goiânia, o candidato tucano se negou a responder a uma repórter local que o questionava sobre suas propostas para o estado. Na ocasião, ele disse não compreender a fala da jornalista. “Temos três problemas: estou longe (da imprensa), não estou te ouvindo direito e não estou entendendo o seu sotaque.”

Antes, em Pernambuco, Serra também já havia tido dificuldades com o sotaque nordestino. Ao ser questionado pelo editor de um jornal regional se o trem-bala, que fará a ligação entre as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, “na verdade foi um tiro de festim”, o tucano respondeu. “Dá para repetir? Não entendi, foi muito sotaque daqui.” Serra é crítico do projeto de trem de alta velocidade, que virou bandeira do governo federal neste fim de mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Até mesmo em sua região, a Sudeste, Serra usou do argumento para deixar de responder a uma pergunta. Em viagem a Belo Horizonte, capital do segundo maior colégio eleitoral do Brasil, com 14,5 milhões de votos potenciais, Serra disse o seguinte: “Essa fala mineira de vocês eu não entendo. Eu tenho que prestar atenção”. Na ocasião, o candidato tinha sido questionado sobre uma declaração do presidente Lula, que, em entrevista a uma revista semanal, havia dito que o tucano teve azar de concorrer com ele pela Presidência e agora também lhe falta sorte na disputa com a presidenciável Dilma Rousseff (PT). Meses antes, enquanto ainda disputava com o ex-governador mineiro Aécio Neves a indicação do PSDB para ser candidato ao Palácio do Planalto, Serra chegou a elogiar o mesmo sotaque mineiro de outra repórter.

As diversidades regionais e até na fala individualizada, segundo especialistas, podem, de fato, confundir o ouvinte. A professora associada de letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Thais Cristófaro Silva, especialista em fonologia, disse que dependeria de uma análise técnica para dar seu parecer, mas confirmou a tese. “A variação é inerente a toda língua. Em lugares diferentes há pessoas diferentes e jeito de falar diferente. O grau de dificuldade para a pessoa entender o que foi dito depende de vários fatores que podem ir desde problemas fisiológicos ou neurológicos até mesmo ao desconhecimento do sotaque”, afirmou.

Protesto
José Serra enfrentou um protesto organizado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Cooperativas do Estado de São Paulo (Sintracesp), ontem, durante sua participação em sabatina organizada pela Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), na capital paulista.

Os manifestantes protestaram na entrada do Memorial da América Latina, onde ocorreu o evento. “Eu até entendo que vocês se reúnam para xingar o governo, mas não é o governo no caso”, disse Serra, que se desincompatibilizou do cargo no início do ano para concorrer nas próximas eleições. “Eu vou dizer a ele (o atual governador, Alberto Goldman, do PSDB) para conversar com vocês, está bem?”, prometeu.

Os sindicalistas reclamam do Decreto nº 55.938, que estaria prejudicando a prestação de serviços de cooperados ao governo do estado. Segundo os integrantes do Sintracesp, o governo quer quebrar contratos de cooperados para favorecer empresas pertencentes a políticos tucanos no estado.

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