quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ministério Público quer interditar criação de gado de Daniel Dantas no Pará


Será que Gilmar Mendes vai deixar?


Por Felipe Milanez, de Marabá (PA)

As polêmicas terras de Daniel Dantas no sul do Pará, objeto de investigação por crimes de lavagem de dinheiro na operação Satiagraha, estão de novo na mira da Justiça. Dessa vez, pela prática do crime mais comum na região: o desmatamento. Por ter descumprido acordo judicial, no qual se comprometia a respeitar a legislação e a não desmatar nenhum hectare até 2011, todas as operações pecuárias do Agropecuária Santa Bárbara poderão ser embargadas pela Justiça Federal. Na fazenda Lagoa do Triunfo, o Ibama autuou 13 desmatamentos, que somaram 2,3 mil hectares de floresta destruídos.

Há mais de um mês o Ibama está em São Felix do Xingu realizando operações de fiscalização O município lidera o desmatamento da Amazônia no Pará. Mas foi uma denuncia do Greenpeace que levou o Ibama à Lagoa do Triunfo. Com base em imagens de satélite, cruzadas com informações sobre os limites da fazenda contidas no Cadastro Ambiental Rural (CAR), que fornece o mapa dos limites das propriedades, foi possível determinar que a área desmatada tinha dono. O CAR é o primeiro passo do processo de regularização das fazendas e da produção pecuária, considerada o grande motor da destruição da floresta. Em acordo firmado entre o Ministério Público Federal com os frigoríficos, somente poderiam ser comprados animais de propriedades que tenham aderido ao Termo de Ajuste de Conduta (TAC), para recompor os passivos ambientais, e entrado no Cadastro Ambiental Rural do estado. “Somente com o cadastramento, as propriedades rurais deixarão de ser invisíveis aos olhos do Estado e do cidadão”, diz Marcio Astrini, da Campanha Amazônia do Greenpeace. “A floresta já perdeu730 mil quilômetros de floresta, e 80% virou pasto.”

Nos autos da ação civil pública proposta pelo Ibama e pelo Ministério Público Federal contra a Agropecuária Santa Barbara Xinguara S/A e outros, que tramita na Justiça Federal em Marabá, assim decidiu o juiz Carlos Henrique Borlindo Haddad, em 19 de outubro de 2010: “não poderão desmatar de forma ilegal qualquer nova área, nem figurar entre aqueles que estejam ou venham a ser processados por trabalho escravo e/ou por desmatamento. O não-cumprimento das obrigações descritas importará no embargo judicial das atividades.”

A firma de Dantas não cumpriu a determinação judicial. “Comprovado o dano e o não-cumprimento, irei informar o juízo para que a decisão judicial seja cumprida, qual seja, de embargar todas as atividades do grupo. Inclusive, com a retirada dos bois da área”, afirma do procurador federal Tiago Rabelo. “A Justiça tem tido reiteradas decisões no sentido de regularizar a atividade pecuária e forçar o cumprimento suas determinações”. Nesse caso, o juiz Carlos Haddad tem decidido, reiteradamente, por obrigar que suas decisões sejam cumpridas nos processos de regularização da pecuária. E no caso do crime ambiental perpetrado pela Santa Barbara, contra acordo judicial firmado entre a empresa e os órgãos federais, isso implica em embargar toda a atividade econômica do grupo. Bem pior do que a multa de 23 milhões de reais aplicadas pelo Ibama.

São Felix do Xingu é um dos maiores municípios do mundo, com área que se estende pela “terra do meio” – o espaço central do Pará, localizado entre os rios Xingu e Iriri. Conhecida área de pistolagem, violência e grilagem de terras públicas, a região é uma das grandes fronteiras econômicas que pressiona a floresta amazônica. Possui, também, o segundo maior rebanho de gado do País. Apos o assassinato da missionária Dorothy Stang, em 2005, o governo federal criou um mosaico de unidades de conservação na região para impedir que a grilagem de terras continuasse a se propagar e a gerar violência. E por pressão do mercado sobre o consumo de carne, as fazendas começaram a ter que se adequar à lei.

“A legislação ambiental empurra as empresas para se regularizar, mas as multas são altas. As saídas são os acordos nos termos de ajustamento de condutas, pelo Ministério Público”, diz Rebelo. “A prática do crime mostra que a empresa realmente não quer se ajustar”.

O objetivo da Santa Barbara é reunir cerca de um milhão de hectares de terras no sul e sudeste do Pará – e já teria em torno de 500 mil. Nada fácil de ser conquistado numa região onde não há títulos de propriedade. Grande parte dos títulos das terras do grupo foram comprados com base em aforamentos de antigos castanhais – um titulo de terra precário, que dava direito apenas ao extrativismo.

Para compor uma grande área, é preciso reunir diversas pequenas propriedades. Esse é um dos fundamentos da violência na região, quando corretores de imóveis achacam os proprietários menores. Essa pressão existe, por exemplo, na chamada “Vila dos Crentes”, no interior da terra do meio. Cercados por um grande fazendeiro, o goiano José Araújo Lima, também autuado pelo Ibama, os pequenos proprietários, que vivem basicamente da colheita de cacau, denunciaram ameaçados. “Mataram o meu filho dois anos atrás. Agora estão me ameaçando, querendo me obrigar a vender a minha terra”, afirma um pequeno produtor. No entorno da sua plantação foram desmatados, em julho, cerca de 60 hectares. Quando foi colocado fogo, a queimada se espalhou para a plantação de tal, que ficou sem outra fonte de renda. “Ele fez isso para me obrigar a vender a terra. É assim que funciona aqui.”

Por conta dessa pulverização das propriedades, geralmente quem desmata costuma acusar supostos “invasores”, dizendo que não tem nada a ver com o assunto. Não é o caso que poderá ser alegado pela Santa Bárbara. “A ação foi montada a partir dos indicativos por satélite, realizada com helicóptero e a identificação em campo” relata o analista ambiental Fernando de Franco, fiscal responsável pelas autuações. “Encontramos uma área que estava em regeneração, com árvores com média de 10 metros de altura, em que dois tratores de esteira estavam puxando o correntão. Estas maquinas pertenciam à Agropecuaria Santa Barbara, os funcionários trabalhavam para a empresa, vestiam uniformes, o carro de apoio, uma picape, que estava fazendo a manutenção dos tratores, tinha a logomarca da empresa” descreve.

O Greenpeace e outras ONGs, além do Ministério Público Federal, que criou o programa Carne Legal, têm pressionado frigoríficos e supermercados a não comprar carne oriunda de áreas de desmatamento. “Se os frigoríficos não controlam de quem compram o boi, os consumidores acabam por financiar involuntariamente a ilegalidade”, diz Astrini. A pecuária é a grande vilã da destruição da floresta, e responsável por emissões de gases e efeito estufa. Essas ações ambientais são, também, a ponta do iceberg de problemas que envolvem as ações do Opportunity na região. CartaCapital

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